Depois de dois anos sem se apresentar, um grupo da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) voltou a brilhar na noite deste sábado (17) em Igrejinha, no Vale do Paranhana. Pilchados como prendas e peões, eles dançaram valsa, vaneira, pezinho e outras danças do folclore gaúcho no CTG Sentinela da Tradição.
Foi em 2018 que o grupo começou a receber aulas de dança com integrantes do CTG. Batizado de Sentinelas do Coração, fizeram sua primeira apresentação em 2019. Mas a pandemia paralisou tudo: os alunos deixaram de ir presencialmente à escola e também pararam de aprender as coreografias. Em março deste ano, voltaram a ter lições duas vezes por semana.
Para alguns, o tempo dentro de casa, sem dançar com os colegas, foi de ansiedade. Com síndrome de Down, Fabiano Rafael da Veiga, 22 anos, ficou agitado, eventualmente brabo, segundo conta a mãe, Sereni Maria da Veiga, 62 anos.
Na noite deste sábado, no entanto, Fabiano pode se esbaldar — abriu o espetáculo e mexeu o corpo em diferentes ritmos.
— A dança faz muito bem para ele, deixa ele pra cima — conta Sereni. — Às vezes, de manhã cedo, eu já tenho que dançar com ele. O rádio, lá em casa, fica ligado direto.
Para outros, o tempo sem dançar foi de sobrevivência. Par de Fabiano nas apresentações, Hosana Pacheco, 22 anos, também com síndrome de Down, pegou covid-19 em 2021 e ficou hospitalizada por 24 dias, 12 deles entubada na UTI. A família ficou sem chão.
— Perdemos a linha e o carretel junto. Mas confiamos em Deus e pedimos orações. Graças a Deus, ela saiu sem nenhuma sequela — conta o pai, Paulo Pacheco, 56 anos.
Ao ver Hosana pilchada, arrastando a bainha do vestido de um lado a outro do CTG, a mãe, Deisi Pacheco, 65 anos, é tomada não só por alívio, mas também por orgulho.
— Tem pais que acham que, com síndrome de Down, têm que esconder o filho. Eu sinto orgulho. Nós, pais, temos que estar do lado deles. Meu coração transborda. Eles são perfeitos — desmancha-se Deisi.
Uma das professoras de dança dos alunos da Apae de Igrejinha, a patroa do CTG Sentinela da Tradição, Márcia Goretti da Silva, fica fascinada ao ver como pessoas estigmatizadas conseguem provar que são capazes.
— Temos dois jovens com problemas motores que insistem em dançar sem muletas, porque gostam de se desafiar — diz. — As pessoas não sabem o quanto eles têm condições de fazer as coisas. Nosso objetivo é poder levar a cultura gaúcha para todos, independentemente de classe social. É o nosso legado — diz.
Nos próximos dias, o talento dos integrantes do Sentinelas do Coração poderá ser visto em outros eventos. Eles se apresentam, no dia 21, na escola Morada da Colina, em Igrejinha, e na escola Dom Pedro, de Três Coroas, além da própria sede da Apae. No dia 24, voltam ao CTG Sentinela da Tradição para o baile de aniversário.