O religioso suíço Teodor Amstad chegou ao Rio Grande do Sul em 1885 para fazer história. De formação jesuíta, além de orientar as comunidades na qual atuou como pároco, ele foi responsável por liderar um movimento que mudou a vida dos pequenos agricultores da comunidade de Linha Imperial, localizada entre os municípios de Nova Petrópolis e Gramado, na região da serra gaúcha, com a criação da primeira cooperativa de crédito do país e da América Latina. Paulo Cesar Soares, diretor executivo da Casa Cooperativa Nova Petrópolis, organização não-governamental responsável por gerir o espaço que abrigou a primeira instituição financeira cooperativa do Brasil, relembra que os agricultores e suas produções não eram valorizados nos primórdios do século 19.
— As entidades financeiras públicas daquele tempo não tratavam o agricultor como alguém relevante. Não havia aportes para eles construírem suas propriedades. A criação da Caixa Rural foi fundamentada para ajudar os produtores desta região — explica Soares.
A comunidade germânica, de etnia boêmia, diferente de outros imigrantes que ajudaram a colonizar a região, eram advindos de áreas industriais. A falta de experiência com a agricultura veio acompanhada de outros problemas, já que a região de Nova Petrópolis, à época, era considerada uma das mais pobres no estado, muito devido a sua condição geográfica, de difícil acesso. A chegada do padre Amstad trouxe esperança para as famílias da Linha Imperial.
— Ele era uma pessoa fantástica, muito mais do que um padre. Foi ele que ensinou tudo para a nossa comunidade. Ele chega para ajudar esse grupo de colonos diante de suas dificuldades. A primeira cooperativa é completamente disruptiva, transformando o setor agro e garantindo crédito para os primeiros produtores — destaca Soares.
Em dezembro de 1902, nasce a primeira cooperativa de crédito do Brasil, a Sicredi Pioneira, que continua em atividade até hoje. Atualmente, com as cooperativas de crédito consideradas verdadeiras potências do setor financeiro e colaborando com o crescimento de diferentes modelos de negócios, pensar que tudo começou com o apoio para a agricultura deixa claro a importância do agronegócio na economia gaúcha e nacional. Prova disso é que, após a abertura da Caixa Rural, dezenas de outras cooperativas surgiram.
— Foi algo tão inovador que começaram a surgir cooperativas uma atrás da outra. Havia a necessidade em todo o país de ajuda para o setor agro. Elas chegaram e preencheram esse nicho. Foi algo que mudou a cara do país economicamente — argumenta o diretor.
Museu
Tombado como patrimônio do município em 2013, o prédio da Caixa Rural, assim como o sítio histórico do entorno, foi revitalizado e hoje abriga o Memorial Amstad, espaço dedicado à memória do patrono do cooperativismo brasileiro e herói da comunidade de Linha Imperial. Unindo tecnologia e um acervo que conta com fotos, objetos e documentos históricos, o local encanta os visitantes.
Desde sua reabertura para visitação, em maio deste ano, tem recebido um público recorde. A visitação dura mais de uma hora e conta com projeções mapeadas, em que personagens importantes da localidade ajudam a contar a história do cooperativismo gaúcho e a retratar o pioneirismo do padre Teodor Amstad.
Soares lembra que a construção da Casa Rural foi uma quebra de paradigmas e conseguiu unir diferentes visões religiosas em nome de um bem comum.
— Católicos e protestantes não costumavam trabalhar juntos. O padre Amstad uniu essas pessoas ao ponto de colocar, diante de uma maioria de católicos cooperados, um protestante como presidente. Ele não era apenas visionário, mas uma pessoa altruísta e de um coração fantástico, que brigou com o sistema da época, inclusive junto à igreja. Hoje, na nossa comunidade, nós vivenciamos o cooperativismo de uma forma natural graças ao trabalho do padre Amstad — relembra o diretor da Casa Cooperativa.