O município de Caraá, no Litoral Norte, trata de recomeçar a vida depois da devastadora passagem do ciclone extratropical pela cidade de pouco mais de 8 mil habitantes. Nesta segunda-feira (19), famílias colocavam colchões, móveis e roupas para secar na frente das casas. Por volta das 15h30min, fazia sol e a temperatura era de 18 graus.
— Aqui era o meu quarto — mostrava a dona de casa Girlei Oliveira Silva, 53 anos.
A história dela e de como escapou da fúria das águas possui ares dramáticos. Estava com o marido, que é deficiente, e o filho de 18 anos em casa, quando os dois rios e os quatro arroios da região começaram a transbordar. Tentaram se refugiar no Cemitério das Terezas, que fica em Rio do Meio. Mas as águas vinham aos borbotões e por cima das sepulturas. Tiveram de ficar em um casebre abandonado. Escaparam para contar o que testemunharam.
— Faz 20 anos que moro aqui. Nunca vi nada igual — resignava-se, lamentando a morte de um de seus cachorros de estimação, arrastado pela correnteza assim como tantos outros animais em Caraá.
O serralheiro Marcos Lucana, 42 anos, tirava de dentro da casa de seu primo, em Alto Rio do Meio, o que a água e a lama estragaram. Era praticamente tudo. O quintal estava abarrotado de móveis e aparelhos domésticos.
— Aqui foi perda total — atestava, com os olhos fixos para a pilha de objetos perdidos.
Até nas localidades mais escondidas na região da mata o ciclone deixou prejuízos. Um dos acessos por onde passa o Rio do Meio estava danificado. A ponte ruiu.
— Sorte que moramos bem acima do rio — explica Sandro Alhiana, 50 anos, com chapéu na cabeça.
Segundo Sandro, o rio transbordou e ficou cerca de dois metros mais alto em meio à vegetação. Enquanto tentava atravessar o curso d’água, nesta segunda-feira, escorregou e por pouco não caiu.
Nas margens dos rios é possível perceber muitas árvores derrubadas. A violência das águas foi a principal característica dessa catástrofe natural.
Em frente aos prédios da Secretaria Municipal de Educação e do Serviço de Emergência de Caraá, que são colados um no outro, os funcionários limpavam as coisas e tratavam de deixar ao sol o que ainda poderia ser reutilizado.
— Saímos daqui de dentro com água no pé — recorda o motorista da ambulância João Coelho, 58 anos.
Buscas
Nesta segunda-feira, as buscas se concentravam em três pontos: Linha Padre Vieira, Passo da Forquilha, no limite com Santo Antônio da Patrulha, e na localidade do Rio dos Sinos.
— Agora (parte da tarde), vamos ficar na Linha Padre Vieira — detalhava o comandante Cardoso, do Corpo de Bombeiros de Santo Antônio da Patrulha.
Representante da Casa Civil do governo do RS, Bolívar Gomes estava no CTG Sentinela dos Sinos.
— É o momento mais difícil do município de Caraá. Cerca de 50 famílias estão sem residências — compartilha, acrescentando:
— O esforço é para salvar vidas.
Doze equipes da CEEE Equatorial trabalhavam para restabelecer a energia elétrica. As transmissões estavam melhores nesta segunda-feira na comparação com sábado (17).
Diversos caminhões estão no trecho da RS-030, principal acesso a Caraá, para construírem uma travessia provisória nas próximas 48 horas.
Óbitos
Quatro pessoas morreram em Caraá até agora. Um homem de 76 anos e um adolescente de 14 foram arrastados pelas águas. Um deslizamento matou uma mulher de 73 anos. Nesta segunda, o corpo de um homem de 57 anos foi encontrado.
Ao meio-dia, com auxílio de helicóptero, foi localizado Sérgio Freitas Vale Souza Gomes, que era dado como desaparecido desde sexta-feira (16), no Alto Caraá, mas estava apenas incomunicável.
Neste momento, apenas uma pessoa é considerada desaparecida no município que fica a cerca de 90 quilômetros de Porto Alegre.