O Ministério Público do Trabalho (MPT-RS) informou, nesta segunda-feira (20), que irá atuar para responsabilizar toda a cadeia produtiva das duas lavouras de arroz de Uruguaiana em que foram resgatados 85 trabalhadores em situação análoga à escravidão.
A intenção é negociar o pagamento de danos morais coletivos e individuais pelos aliciadores de mão de obra, proprietários e arrendatários das fazendas Santa Adelaide e São Joaquim e pela empresa de sementes Basf. Inicialmente, o MPT-RS buscará fechar um acordo com as partes, o que costuma ser viabilizado com a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) em que a cadeia produtiva se compromete a corrigir suas práticas e quitar valores a título dos danos morais e coletivos. Caso não haja acordo, o MPT-RS diz que buscará ação judicial.
Essas obrigações que o MPT-RS buscará impor se somam ao pagamento das verbas rescisórias de R$ 365,5 mil pela Basf aos trabalhadores, conforme decisão do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) anunciada no sábado (18). Nesta semana, o MPT-RS pretende auxiliar nas negociações para que o pagamento das verbas rescisórias seja feito pela Basf de forma emergencial, o que “abrirá a oportunidade para que o restante da cadeia produtiva também o faça”.
— Depois disso, (o MPT-RS) passará a negociar as demais obrigações e reparações. O órgão buscará a reparação de danos morais coletivos e individuais por toda a cadeia produtiva - aliciadores, proprietários e arrendatários e Basf -, pela via dos TACs e, se necessário, pela via judicial — afirma o procurador do Trabalho Hermano Martins Domingues, coordenador da Procuradoria do Trabalho em Uruguaiana.
A atuação do MPT-RS e do MTE acontece nas esferas administrativa e trabalhista. Em outra frente, o caso é investigado pela Polícia Federal em inquérito criminal.
A base para a apuração é o artigo 149 do Código Penal, que versa sobre “reduzir alguém à condição análoga à de escravo” por meios degradantes de trabalho. A pena para eventuais culpados é de dois a oito anos de reclusão, o que pode ser aumentado, conforme diz o Código Penal, pela descoberta de que 11 menores de 18 anos estavam em condições análogas à escravidão nas duas propriedades.
O caso
No dia 10 de março, uma operação conjunta entre Polícia Federal, Ministério Público do Trabalho (MPT-RS) e Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) resgatou 85 trabalhadores que atuavam no corte do arroz vermelho, espécie de inço que cresce mais do que o grão germinado, em lavouras das fazendas Santa Adelaide e São Joaquim, em Uruguaiana.
As autoridades classificaram a situação como análoga à escravidão devido às condições degradantes de trabalho, o que é previsto em lei. Os trabalhadores não dispunham de banheiro nem de equipamentos de proteção. Para cortar o arroz vermelho, usavam facas de cozinha. Também não havia local para acondicionar a refeição, que ficava debaixo de árvores e, por vezes, azedava com o calor. Havia registro de restrição de acesso à água.
Um trabalhador resgatado relatou que, por duas vezes, aeronaves agrícolas dispensaram agrotóxico na plantação enquanto eles laboravam no solo. Em consequência, houve quem apresentasse dor de cabeça e de garganta, além de feridas nos braços. Os resgatados não tinham registro formal de emprego.