Os resultados da segunda edição da Operação Resgate — força-tarefa contra trabalhos forçados, realizada em 22 Estados e Distrito Federal — foram apresentados na sede da Procuradoria-Geral da República (PGR), em Brasília, nesta quinta-feira (28), e apontam que, desde 4 de julho, foram resgatados 337 trabalhadores que vinham sendo submetidos a condições de trabalho análogas à escravidão em todo o Brasil. No Rio Grande do Sul, foram 26 pessoas retiradas de situações como essas, todas em uma mesma empresa de Serafina Corrêa, na Serra.
Com os casos registrados nesta operação, em solo gaúcho, o total de resgatados chega a 140 em 2022, o que resulta em uma média de 20 pessoas retiradas por mês de condições extenuantes e degradantes de trabalho — especialmente no meio rural. De acordo com dados da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, do Ministério do Trabalho e Previdência (SIT), em 2021, foram resgatados 76 trabalhadores no Estado.
Os 26 trabalhadores — todos homens e a maioria de fora do Rio Grande do Sul — submetidos a condições degradantes de ofício e ludibriados quanto à remuneração e benefícios em Serafina Correa foram atraídos por recrutamento para atuar na apanha de frangos, serviço de recolhimento de aves vivas nas granjas e fazendas fornecedoras de uma empresa da região. O anúncio publicado por uma agência prometia aos recrutados moradia e alimentação sem custo, além do salário. Ao chegarem ao local, contudo, os trabalhadores passaram a ter todas as despesas descontadas dos vencimentos.
Além de péssimas condições de alojamento, a jornada de trabalho era superior ao que foi combinado previamente com os selecionados. De acordo com o Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPT-RS), os trabalhadores disseram que não sobrava nada do salário, o que dificultava a saída e a busca por outro emprego.
Após o resgate, foi firmado um termo de ajustamento de conduta (TAC) com o proprietário do estabelecimento, dono de mais três empresas do tipo, para pagamento de salários e verbas indenizatórios aos trabalhadores. Os nomes da empresa e do responsável não foram divulgados pelo MPT-RS.
De acordo com o vice-coordenador da Coordenadoria Nacional de Erradicação do trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Ministério Público do Trabalho (MPT), Italvar Filipe de Paiva Medina, pessoas que procuram vagas de emprego precisam estar atentas a quem são os empregadores e conhecer os termos previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
— É importante, ao receber proposta de emprego, buscar informações a respeito do empregador quanto às atividades e pessoas que já trabalharam no estabelecimento. Também é fundamental, quando há mudança de cidade ou Estado, já ir com a carteira de trabalho assinada, e que se mantenha contato permanente com os familiares. Muitas vezes, os trabalhadores não se reconhecem como escravizados porque não têm conhecimento de seus direitos, por isso, é fundamental a divulgação desses canais de denúncia — alerta Medina.
Muitas vezes, os trabalhadores não se reconhecem como escravizados porque não têm conhecimento de seus direitos, por isso, é fundamental a divulgação desses canais de denúncia.
ITALVAR FILIPE DE PAIVA MEDINA
Vice-coordenador da Coordenadoria Nacional de Erradicação do trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do MPT
A elevação dos resgates de pessoas, não somente no Rio Grande do Sul, mas em todo o país, tem relação direta com a deterioração das condições econômicas e com o desemprego. Conforme o procurador Renan Paes Félix, coordenador do grupo de apoio da PGR, a pobreza e a vulnerabilidade influencia diretamente o trabalho em condições de escravidão também entre estrangeiros no Brasil:
— Já existem casos de haitianos, bolivianos e paraguaios resgatados em condições análogas. Em caso recente, no final de junho, um trabalhador foi resgatado em fábrica clandestina no Rio de Janeiro. A condição é a mesma dos brasileiros: são aliciados e submetidos em condições análogas à escravidão, o que configura tráfico de pessoas, além do próprio trabalho escravo.
Mais dados da operação
- Na operação realizada neste mês, Goiás e Minas Gerais foram os Estados com mais pessoas resgatadas.
- As atividades econômicas com maior quantidade de pessoas resgatadas no meio rural foram serviços de colheita em geral, cultivo de café e criação de bovinos para corte.
- No meio urbano, chamaram a atenção os resgates ocorridos em uma clínica de reabilitação de dependentes químicos e os casos de trabalho doméstico.
- Seis trabalhadoras domésticas foram resgatadas em cinco estados.
- A Operação Resgateé resultado de uma parceria entre seis órgãos públicos: Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério Público Federal (MPF), Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, do Ministério do Trabalho e Previdência (SIT); Polícia Federal (PF), Defensoria Pública da União (DPU) e Polícia Rodoviária Federal (PRF). A primeira etapa ocorreu no ano passado, com 128 fiscalizações e resgate de 136 trabalhadores.
Para denunciar
- O canal para denúncias sobre trabalhadores em condições análogas à escravidão é o “Sistema Ipê”, disponível em Sistema de Denúncias DETRAE/SIT neste site.
- Nesse canal, não há a necessidade de identificação
- O interessado em denunciar deverá acessar o sistema e inserir o maior número de informações possível para que a fiscalização do trabalho possa analisar os indicadores de trabalho análogo ao escravo e promover as verificações no local indicado