O Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre reprovou o pagamento de um termo aditivo a um convênio entre a Secretaria Municipal de Saúde e a Associação Hospitalar Vila Nova (AHVN). A análise do documento, feita na semana passada, concluiu que a relação da prefeitura com a entidade afronta os princípios da administração pública.
O contrato, que envolve 29 leitos de internação pediátrica e seis de emergência em pediatria a serem implementados no Hospital da Restinga e Extremo-Sul (HRES), gerenciado pela AHVN, foi considerado "temerário" pelos conselheiros. Os leitos estão em funcionamento.
Conforme a averiguação, feita pela secretaria técnica do Conselho Municipal de Saúde, a aquisição desses leitos ultrapassa o limite de 30% do valor global do termo de colaboração, que é o permitido pelo decreto municipal nº 19.775 de 2017 para aditivos em contratos. Isso porque o teto já foi extrapolado em aditivos anteriores. Os técnicos do conselho concluíram que o contrato não comporta o incremento de 6,2% solicitado pela Associação Vila Nova — e que corresponde a R$ 1.467.558,50).
O Conselho Municipal de Saúde afirma que deixaram de ser cumpridos alguns requisitos do contrato, entre eles a apresentação de nota fiscal e atestado da efetiva prestação dos serviços, conferência de valores, nota de empenho prévia à geração da despesa, justificativa pela ausência de contratação regular. Esse balanço das contas, segundo os técnicos, não aconteceu.
O aditivo foi estabelecido com uma previsão de prestação do serviço de maio a setembro de 2022, com repasse mensal no valor de R$ 293.511,70, totalizando R$ 1,4 milhão.
"Agravando a situação, ao analisar o processo, o parecer revelou que a SMS realizou o pagamento dos meses de maio e junho sem ter sido apresentada nenhuma nota fiscal e uma efetiva comprovação de prestação de serviço", salienta a análise da secretaria técnica.
O conselho considera que a Secretaria de Saúde deveria ter feito processo de chamamento público para estes leitos, oportunizando a livre concorrência, conforme previsão legal dos trâmites da administração pública. Isso, "para evitar possíveis beneficiamentos no repasse de recursos por privados", ressalta o documento.
O parecer destaca que a abertura dos leitos aconteceu mesmo após vários apontamentos de irregularidades feitos, anteriormente, pelo Fundo Municipal de Saúde (FMS) e relativos à Associação Vila Nova, que administra o hospital da Restinga desde 2018. É apontada a falta de prestação de contas adequada, o grande fluxo de movimentação bancária entre diversas contas que não a da parceria (Hospital Vila Nova e Secretaria Municipal de Saúde), a falta de extratos e conciliação bancária.
A análise cita também contratação de terceiros pela AHVN, "sem apresentar orçamentos, em desacordo com as regras da colaboração pactuada, agravado por serem terceirizações que não constam no plano de trabalho e em desconformidade com o objeto do termo de colaboração". A referência é quanto ao estacionamento no hospital, administrado por uma empresa.
O parecer conclui ainda que a prefeitura não aplicou as sanções previstas em contrato para situações irregulares relativas à prestação de contas, como suspensão temporária de participação em chamamento público e declaração de inidoneidade para participar de chamamento público ou celebrar parceria ou contrato com órgãos e entidades de todas as esferas de governo.
As análises apresentadas fizeram os conselheiros de saúde reprovarem a contratação dos leitos de internação e emergência pediátrica com a AHVN. Com isso, o parecer será encaminhado para análise e providências do Ministério Público de Contas do Estado e, ainda, para a Secretaria Municipal de Transparência e Controladoria.
A coordenadora da secretaria técnica do conselho, Maria Letícia de Oliveira Garcia, considera que houve omissão da Secretaria Municipal de Saúde, "que autorizou o pagamento mesmo diante da não prestação de contas atestadas pelos servidores que são responsáveis por isso".
Ela admite que a prefeitura acaba de decretar que o teto de 30% para aditivos acima do valor global de convênios pode ser ultrapassado, "em situações excepcionais", mas ressalta que a decisão é recente e não abrange o contrato dos leitos no Hospital da Restinga. Maria Letícia diz que os conselheiros têm expectativa de que os órgãos de controle externos fiscalizem o que aconteceu.
Contrapontos
O que diz a Secretaria Municipal de Saúde (SMS)
Em nota, a SMS informa que a Lei das Parcerias não tem limitador legal instituído. O decreto municipal nº 19.775 limita em 30% o valor global para aditivos em contratos.
"No entanto, no dia de 15 de julho, a prefeitura lançou um decreto de excepcionalidade para as secretarias de Saúde e Educação. O documento autoriza, mediante justificativa apresentada pela autoridade competente, termos aditivos em percentual superior ao estabelecido nos incisos 1° e 2° do artigo 55 do decreto 19.775", explica a pasta.
O que diz a Associação Hospitalar Vila Nova (AHVN)
A Associação Hospitalar Vila Nova informa que não tem conhecimento das reprovações apontadas pelo Conselho Municipal de Saúde dos referidos aditivos, tampouco, qualquer irregularidade na prestação de contas, como sugerido nos textos e questionamentos. E considera que a prestação de contas ainda está com prazo vigente.