Crises de choro incontido interromperam dezenas de vezes o depoimento de Venâncio Anschau, ex-operador de áudio da banda Gurizada Fandangueira, nesta terça-feira (7). Ele foi a primeira testemunha ouvida no sétimo dia de júri dos acusados pelas 242 mortes no incêndio da boate Kiss, ocorrido em Santa Maria, em 2013. É também um sobrevivente, que foi hospitalizado por intoxicação.
Venâncio calcula que fez sonorização de mais de 50 shows e rememorou em detalhes o que se passou em 27 de janeiro daquele ano, quando a danceteria pegou fogo. Ele programava o software para uma música, quando a banda parou de tocar.
— Até chequei a mesa de som, para ver se algo tinha falhado, mas aí vi o pessoal da banda com garrafas de água, tentando apagar um princípio de fogo no teto, pequeno. Depois tentaram com extintor, mas o equipamento falhou, nada saía.
Venâncio disse que a banda Gurizada Fandangueira usava frequentemente esses artefatos pirotécnicos, e que os donos das casas noturnas sabiam disso, inclusive na Kiss. Ele acreditava que eram todos "de fogo frio" (que emite calor suficiente para incêndio). Declarou também que nunca ouviu de funcionários da boate algum pedido para interromper o uso de fogos luminosos.
A testemunha teve a primeira crise de choro ao recordar que desligou a mesa de som, temendo que as chamas alcançassem os equipamentos eletrônicos. Com isso, o público da boate não entendeu que a interrupção da música era por um incêndio, acredita ele.
— Desabilitei o áudio dos microfones. Eu errei, eu errei — exclamou, num choro convulsivo, que fez o juiz lhe oferecer água para se acalmar.
O Ministério Público perguntou por que Venâncio desligou só os microfones, e não os instrumentos. O operador deu uma explicação técnica e disse que já aconteceu de pessoas invadirem o palco anteriormente para usar o microfone.
O depoente relatou momentos de pânico e que nenhuma janela foi aberta para sair a fumaça da boate, mas que ouviu barulhos de coisas sendo quebradas.
— Saí para voltar depois, mas não voltamos. Nunca voltamos. Não tinha a dimensão do que ocorreu.
Venâncio teve uma segunda grande crise de choro ao recordar que foi hospitalizado na mesma semana em que a mulher foi internada para o parto, com 40 semanas de gestação. Ele disse que ficou internado por cinco dias, após ingestão de fumaça após o incêndio, porém não sofreu queimaduras. Chegou a usar medicação por seis meses.
— Eu estava num hospital, e ela noutro. Fui conhecer a Antônia (filha) depois de deixar a hospitalização.
O júri terá continuidade nesta terça-feira com os depoimentos da arquiteta Nivia Braido, que foi sondada por Elissandro Spohr (sócio da Kiss) para mudanças estéticas na casa noturna; e de Gerson da Rosa Pereira, ex-chefe do Estado maior do 4º Comando Regional dos Bombeiros de Santa Maria