SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Os novos critérios estabelecidos pela Capes para a distribuição de bolsas de pós-graduação no Brasil vão cortar benefícios mesmo de universidades e cursos considerados de excelência no país.
É o que dizem os programas que já conseguiram fazer as contas a partir das novas regras divulgadas nesta semana pelo órgão subordinado ao MEC (Ministério da Educação)
Na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), que, segundo o Ranking Universitário Folha (RUF), divide com a USP (Universidade de São Paulo) o topo do ranking das melhores universidades do Brasil, o programa de engenharia elétrica será o mais afetado. O curso, que tem nota 6 em uma escala que vai até 7 no conceito da própria Capes, terá 40 bolsas a menos: 21 no doutorado e 19 no mestrado.
Os dados constam em ofício, ao qual a reportagem teve acesso, encaminhado pela Unicamp ao MEC. Assinado pelo reitor Marcelo Knobel e pela pró-reitora de pós-graduação, Nancy Garcia, ele foi enviado ao ministro da educação, Abraham Weintraub, e ao presidente da Capes, Benedito Guimarães Aguiar Neto. No documento, a universidade pede a revogação das medidas.
A Universidade Federal de Santa Catarina, que segundo o RUF é a sétima melhor do país, deve perder 572 bolsas, segundo cálculos da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação. Desse total, 192 são de cursos de excelência, com notas 6 e 7.
"É uma tristeza. Enquanto o coronavírus está matando pessoas, o governo Bolsonaro está matando a ciência brasileira. Até o Trump pediu que as universidades pesquisem mais, mas no Brasil há essa esquizofrenia de tentar separar política, ciência e economia, o que é a prova da barbárie que vivemos", disse à reportagem a Pró-Reitora de Pesquisa e Pós-Graduação, Cristiane Derani.
A portaria divulgada pela Capes na quarta-feira (18), com data de 9 de março, pegou de surpresa a comunidade acadêmica. Assim que ficou sabendo da novidade, o Fórum Nacional de Pró-Reitores de Pesquisa e Pós-Graduação (FOPROP) divulgou nota se dizendo "surpreendido".
A entidade, que havia participado das discussões que levaram à elaboração de três portarias anteriores, não foi avisada de que o documento seria alterado.
"A revogação unilateral daquelas portarias sem que o FOPROP tenha sido sequer notificado sobre a intenção da presidência da Capes de adotar qualquer medida nesse sentido representa uma grave quebra de confiança entre Capes e toda a comunidade acadêmica", diz a nota do Fórum de Pró-Reitores.
Pelas regras negociadas entre a Capes e entidades acadêmicas, ficava estabelecido que nenhum programa poderia perder mais que 10% do total de bolsas. O novo documento, no entanto, determina que cursos com nota igual a 3 no conceito Capes estarão sujeitos à uma redução de até 50% nos benefícios. Para aqueles mais bem avaliados, os cortes ficarão limitados a 20% -o dobro do acertado anteriormente.
Em nota, a Capes diz que a nova portaria "não implica em nenhum corte ou descontinuidade de pagamento das bolsas", mas que o órgão "acelerou a convergência das diretrizes para privilegiar os cursos mais bem avaliados".
Porém, de acordo com os coordenadores de cursos de pós-graduação ouvidos pela reportagem, os cortes podem estar escondidos na modalidade "cota de empréstimo".
Segundo esse dispositivo, os programas poderiam manter por um ano as bolsas que ultrapassassem a parte à qual teriam direito pelas novas regras. Um exemplo: se um curso que tem dez alunos bolsistas teve a cota reduzida para 8, ele poderia ainda manter esse total de 10 benefícios até o fim do atual ano letivo. Essas duas bolsas a mais seriam consideradas "emprestadas" pela Capes.
Os coordenadores, no entanto, dizem que a Capes considera como "dispensadas" as bolsas que ainda não foram atribuídas aos estudantes e, com isso, elas aparecem como pertencentes à universidades, mas sem que possam ser utilizadas.
Segundo eles, os benefícios só não foram distribuídos ainda porque o sistema online que permite as atribuições estava fechado. A Capes informou que o Sistema de Controle de Bolsas e Auxílias foi reaberto na noite de sexta-feira.
Em nota, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) se disse perplexa com a notícia e pediu a revogação das novas regras estabelecidas pela Capes. A Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG) lançou um abaixo assinado pedindo que a Capes volte atrás na decisão.