Principal convidado do evento que vai discutir em Santa Maria o futuro da prevenção contra incêndios, entre terça (17) e quarta-feira (18), o professor João Paulo Correia Rodrigues, da Universidade de Coimbra, em Portugal, antecipou a GaúchaZH o que pensa sobre a situação brasileira, principalmente após a tragédia da boate Kiss, desde as questões legais até culturais.
Especialista internacional em engenharia de segurança ao incêndio e presidente da Associação Luso-Brasileira para Segurança contra Incêndio, Rodrigues afirmou que o Brasil não está "pior" que outros países, pois está desenvolvendo a legislação. No entanto, criticou o fato de os Estados terem leis individualizadas.
— A legislação deveria ser federal. O fato de ser estadual cria complicação de efetivação das regras e é ruim para empresas que atuam na área — apontou o professor.
A Lei Kiss gaúcha está em vigor desde dezembro de 2013. Já a versão federal, que é soberana, foi sancionada somente em março de 2017 e com determinações diferentes – o que já vinha sendo apontado como complicador, por especialistas, para a sua efetividade.
Rodrigues, entretanto, enfatizou que apenas a existência de regras não é suficiente para evitar novas tragédias como a de Santa Maria. Além da dificuldade de colocar em prática e do agravante da falta de fiscalização, ele ressalta um aspecto cultural inexistente por aqui:
— Um edifício pode estar muito bem projetado contra incêndios e com o sistema mais evoluído do mundo, mas se os próprios usuários não souberem o que fazer, como abandonar o local e utilizar um extintor, não importa o local, vai ocorrer uma tragédia.
— Na Europa e nos Estado Unidos existe essa cultura da prevenção, de ensinar o comportamento adequado para situações extremas. E acredito que aqui ainda falta criar essa cultura, educar as pessoas — complementou.
Ao abordar outras diferenças, Rodrigues apontou como positivo o fato de no Brasil o Corpo de Bombeiros ser profissional e, por isso, mais treinado do que em Portugal, por exemplo, onde os agentes são voluntários. Por outro lado, criticou a baixa fiscalização brasileira que, por exemplo, permitiu superlotação, empecilhos físicos na entrada e a falta de saídas de emergência na Kiss.
— Em Portugal, os fiscais vão à noite nas festas e interditam imediatamente o local se houver alguma falha, além de aplicar uma multa grande. Os donos não querem correr esse risco e respeitam as normas — pontua o professor português.
"Segurança Contra Incêndio — Aprender com o passado para prevenir o futuro" será o tema que ele abordará na abertura da 11ª edição do Painéis da Engenharia, no Centro de Tecnologia (CT) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), marcada para as 14h30min de terça. Além do caso da Boate Kiss, o especialista trará outros casos de incêndios com repercussão internacional, apontando falhas e soluções.
Realizado pelo Sindicato dos Engenheiros (Senge-RS), o evento terá o valor das inscrições destinado à Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM). Veja a programação completa.