A Polícia Federal (PF) viu indícios de que o gabinete do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, tinha conhecimento de que o ex-procurador Marcello Miller atuava de "forma indireta" nas tratativas que resultaram no acordo de colaboração premiada firmado pelos principais executivos do Grupo J&F. Em nota, a PGR disse que a informação não procede.
As evidências apontadas pela PF são trocas de mensagens encontradas no celular do empresário Wesley Batista, preso na quarta-feira (13). São diálogos entre executivos da J&F, seus advogados e Miller.
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Em uma delas, de 5 de abril, data em que foi publicada no Diário Oficial da União a exoneração de Miller do Ministério Público Federal (MPF), uma das advogadas da J&F fala sobre a viagem que ele faria no dia seguinte para tratar do acordo de leniência do grupo nos Estados Unidos. Em determinado momento, a advogada se diz surpresa ao perceber que, naquele dia, o chefe de gabinete de Janot, Eduardo Pelella, já sabia que Miller atuaria para a JBS no Exterior.
"Tais mensagens revelam que membros da Procuradoria-Geral da República tinham ciência de que Marcello Miller estava atuando de forma indireta nas negociações da delação premiada no dia seguinte à sua saída efetiva do órgão", diz o documento enviado pela PF à Justiça Federal de São Paulo.
A informação foi revelada pela revista Veja.
Segundo a PF, Miller já fazia parte do grupo de WhatsApp em que estavam executivos e advogados da J&F, desde o dia 31 de março. O então procurador, no entanto, só publicou a primeira mensagem em 4 de abril, último dia de trabalho no MPF. Ele faz referência a ligações que fez na véspera para os Estados Unidos para tratar de interesses da J&F.
Segundo os investigadores, as mensagens no celular de Wesley indicam que Miller já atuava pela J&F antes do dia 17 de março. Neste dia, Wesley Batista pergunta ao advogado Francisco de Assis se Miller poderia participar de uma reunião em Brasília.
"Amanhã ele tem expediente no atual emprego dele e ele não pode, não", respondeu Assis.
Naquele dia, Miller trabalhava no MPF no Rio. Ele pediu exoneração no dia 4 de março, que só foi efetivada em 5 de abril.
Em nota, a PGR disse desconhecer o teor do relatório e afirmou se tratar "de conversas de terceiros fazendo suposições".
"Os integrantes da equipe do procurador-geral da República só foram informados da participação do ex-procurador da República Marcello Miller nas negociações sobre o acordo de leniência depois de sua exoneração, quando este participou de reunião com esta finalidade no dia 11 de abril", disse a nota.
Em outro documento, a Polícia Federal viu indícios da prática do crime de corrupção passiva cometido por Miller quando ainda estava na PGR. Segundo a PF, o então procurador, em razão do cargo público que ocupava, orientou os donos da J&F a obter melhores condições nos acordos de colaboração premiada.
Buscas
A informação consta do relatório em que a PF pediu autorização da Justiça para cumprir mandados de busca e apreensão na casa não só de Miller, mas também dos irmãos Wesley e Joesley Batista e dos advogados Fernanda Tórtima e Francisco de Assis. O juiz federal João Batista Gonçalves, no entanto, só autorizou as buscas nas residências dos Batista e determinou a prisão deles.
"Há indicativos do cometimento do crime de corrupção passiva pelo ex-procurador, consistente no recebimento de vantagem ilícita ou promessa de vantagem, para que, em razão do seu cargo, orientar o grupo de delatores da JBS S/A a obter nas melhores condições possíveis a formalização da colaboração premiada, bem como conduzir o procedimento de leniência americano em face dessa empresa", disse o relatório.
Em nota, Miller reiterou que "jamais fez jogo duplo e que não tinha contato com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, nem se aproveitou de informações sigilosas de que teve conhecimento enquanto procurador". Miller afirmou ainda que pediu exoneração em 23 de fevereiro, "tendo essa informação circulado imediatamente no MPF".