Concebido sob a égide de ser uma "ponte para o futuro", o governo Michel Temer entra em nova fase da crise com a divulgação dos 74 inquéritos da Lava-Jato autorizados pelo ministro Edson Fachin. Com quase um terço dos ministros e seus principais aliados no Congresso sob investigação no Supremo, o presidente vê sua gestão fragilizada por nova etapa no maior escândalo político em 128 anos de República.
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Para o Planalto, a lista de Fachin não poderia ter vazado em momento mais inoportuno. A despeito de uma reprovação popular de 55%, segundo a mais recente pesquisa Ibope, o governo colhia os primeiros sinais de recuperação econômica, com redução do juro e queda da inflação. No Congresso, as resistências iniciais às reformas da Previdência e trabalhista estavam sendo vencidas e a expectativa era de aprovação nas próximas semanas. Agora, o futuro é incerto.
– Estamos diante de um problema de enorme repercussão nacional, que joga todo o sistema político na rede. Ninguém sabe o que vai acontecer. Tanto pode melhorar, quanto piorar. Para tirar a corrupção das manchetes, o Congresso deveria aprovar as reformas. Mas ele também pode reagir e aprovar leis que enfraquecem a Lava-Jato, o que seria um grave retrocesso institucional – avalia o filósofo José Arthur Giannotti, professor emérito da Universidade de São Paulo (USP).
No núcleo do governo, são alvos da Lava-Jato os dois mais poderosos ministros de Temer, Eliseu Padilha, da Casa Civil, e Moreira Franco, da Secretaria-Geral da Presidência. Com gabinete no Palácio do Planalto, ambos respondem juntos a um mesmo inquérito, acusados de receber propina da Odebrecht em troca de facilidades à empresa nas licitações de aeroportos. Articulador nato, Padilha – que ainda tem outra investigação contra si - era quem vinha negociando com os partidos da base governista a aprovação da reforma da Previdência. Moreira cuidava de áreas não menos estratégicas, como as concessões à iniciativa privada, a comunicação do governo e o sistema de gastos e pagamentos.
Além da dupla, estão na lista outros seis ministros, grande parte com forte ascendência sobre as bancadas no Congresso, como Gilberto Kassab (PSD), da Ciência e Tecnologia, Aloysio Nunes (PSDB), das Relações Exteriores, Blairo Maggi (PP), da Agricultura, e Marcos Pereira (PRB), da Indústria e Comércio. Kassab, que controla sozinho os 37 deputados do PSD, é acusado de receber R$ 20 milhões da Odebrecht quando era prefeito de São Paulo e ministro das Comunicações no governo Dilma. Marcos Pereira, presidente do PRB e que teria recebido R$ 7 milhões, domina outros 24 parlamentares. Já Blairo Maggi, suspeito de gerenciar um caixa 2 de R$ 12 milhões, é expoente da bancada ruralista, uma das mais numerosas do Congresso.
– A situação do governo fica muito difícil. Temer terá de decidir se pretende ficar com um ministério manco. É complicado porque um terço dos senadores e boa parte dos deputados também estão na lista, o que reduz as opções. O quem vem por aí depende do presidente. Ele tem que dar um sinal. Os investidores estrangeiros, por exemplo, irão se afastar. A esta hora, eles estão dizendo: "sabia que o Brasil era ruim, mas não tanto assim – resume o cientista político David Fleischer, americano naturalizado brasileiro.