Contrariando as expectativas em um período de crise econômica, Caxias do Sulvem diminuindo o número de pessoas que vivem na miséria. Em 2014, eram 13,2 mil na linha da pobreza e da extrema pobreza; em 2015, 10,3 mil; em 2016, 9,2 mil. O fortalecimento da rede de assistência social é uma das explicações. Mas fatores como a revisão nos cadastros do Bolsa Família, a partir de apontamentos do Ministério Público, e até mesmo a saída de moradores de Caxias, que resolveram voltar para suas cidades, podem ter impactado nos índices.
– A crise tem atingido mais a classe média. É um público que não se enquadra nos critérios para receber o benefício – diz Heloísa Teles, diretora de Proteção Social Básica da Fundação de Assistência Social (FAS).
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A perspectiva, porém, não é boa para 2017. A tendência é de aumento de pessoas em situação de pobreza e extrema pobreza. Não há como estimar quanto irá crescer, mas o cenário aponta para isso, segundo Heloísa. Conforme estimativa divulgada neste mês pelo Banco Mundial, até o final do ano, o Brasil deverá passar dos atuais 2,5 milhões para 3,6 milhões de pobres.
– O crescimento da pobreza está basicamente associado à perda de emprego. O desemprego começou a crescer por volta da metade de 2015 e observamos um pequeno crescimento na pobreza, como se refletiu na PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) 2015. Mas o desemprego cresceu muito mais rápido em 2016 e espera-se que continue relativamente alto em 2017 – explica o diretor do Banco Mundial para o Brasil, Martin Raiser.
O Banco Mundial recomenda a expansão do Bolsa Família, que deverá ter seu orçamento ampliado para R$ 30,7 bilhões em 2017, caso o governo queira cobrir os "novos pobres" com a proteção social. Isso evitaria que a miséria atingisse valores acima do patamar de 2015, quando a tendência decrescente da pobreza foi revertida após uma década de queda ininterrupta. Em 2014, a pobreza e a pobreza extrema no Brasil eram estimadas em 7,4% e 2,8%, respectivamente. No ano seguinte, saltaram para 8,7% e 3,4%.
O incremento sugerido pelo Banco Mundial representa um acréscimo de cerca de R$ 900 milhões na verba prevista para o programa pela lei orçamentária de 2017. O aumento na pobreza para este ano foi calculado com base em variações distintas de índices macroeconômicos. No cenário mais otimista, o Banco Mundial estima uma retomada do crescimento, com saldo positivo de 0,5% para o PIB. O desemprego continuaria em ascensão, chegando aos 11,8%, valor 0,6% mais alto do que a taxa de desocupação no ano passado.
R$ 12 milhões em 2016
Das 9.293 famílias cadastradas em Caxias até dezembro de 2016, 4.322 se enquadravam na situação de extrema pobreza e 4.971 na de pobreza. Dessas, 6.812 recebiam o Bolsa Família mensalmente. As outras 2.481 famílias aguardavam a inclusão no programa para receber o benefício. O teto para concessão dos valores em Caxias é de 8,5 mil famílias. Em todo o ano passado, foram destinados ao Bolsa Família em Caxias R$ 12.273.739,00. O mês com maior número de beneficiário foi outubro, com 8.379.
Desempregada há um ano, a cozinheira Jaqueline de Souza, 35 anos, é uma das beneficiárias em Caxias. Ela recebe Bolsa Família para dois dos três filhos e para dois sobrinhos, que estão sob a guarda dela. Com o marido desempregado, a renda para os sete membros da família se restringe aos R$ 156 do benefício e a um salário mínimo pago como auxílio para os sobrinhos.
– É sufocante. Estou passando por dificuldades. Tem água, luz, gás, material escolar, uniforme. Está faltando tudo, não consigo mais fazer rancho. Tento não passar para as crianças, mas não sei até quando vou aguentar – desabafa Jaqueline.
Dinheiro é fundamental para comprar comida
Beneficiária do Bolsa Família há cerca de quatro anos, Sara Feijó, 28 anos, está com o benefício bloqueado porque não atualizou o cadastro no prazo estipulado.
Na última quinta-feira, ela era uma das dezenas de pessoas que aguardava atendimento no Cadastro Único, na Rua Os Dezoito do Forte, para regularizar a situação. O benefício, embora pequeno (R$ 39), é fundamental para Sara, que está desempregada e sobrevive informalmente de faxinas que lhe garantem cerca de R$ 300 por mês. A prioridade da mãe do pequeno Ezequiel Feijó Alberto, cinco, é comprar comida para o menino. Roupas e calçados adquire apenas "quando dá".
– Os padrinhos dão para ele de presente – conta.
Sara, que é separada e diz não contar com a ajuda do ex-marido, mora com o filho e a mãe, Delair Maria Pacheco, no loteamento Mariani, o que representa um alívio, já que não precisa pagar aluguel.