A mãe das três crianças catarinenses mortas pelo pai na última quarta-feira na cidade portorriquenha de Ponce, Marlene Martins da Rocha, reconheceu os corpos na tarde de sábado. Segundo a tia da mulher, Albertina, ela ainda não definiu se os filhos serão enterrados em Criciúma, onde nasceram, em Forquilhinha, onde mora parte da família, ou em Porto Rico mesmo. Até a manhã deste domingo, o consulado brasileiro em Miami, que está acompanhando o caso pelo fato de a nação caribenha ser um Estado independente associado aos Estados Unidos, não tinha recebido nenhuma solicitação para o traslado dos corpos para o Brasil.
Seja onde for, o funeral de Erick, 10 anos; Eileen, oito; e Emmanelis, seis, será o desfecho de um crime que chocou o pequeno país e Santa Catarina. Distante 120 quilômetros ao Sul da capital San Juan, Ponce é a terceira maior cidade de Porto Rico em tamanho e população, com 170 mil habitantes. Fundada em 1877, atrai turistas tanto pela rica herança colonial, expressa no centro histórico com seus casarões preservados, quanto pelas praias banhadas pelo Atlântico. Esse cenário de paraíso tropical ganhou contornos trágicos com a notícia de que um homem havia estrangulado os três filhos e depois se enforcado nos fundos da casa em que viviam, na urbanización Jacaranda.
É uma espécie de loteamento na encosta de um morro a pouco mais de 10 minutos do centro do município. As casas grandes, sem muros, e os modelos dos carros nas garagens passam a imagem de um reduto de classe média alta, pelo menos para os padrões brasileiros. Para entrar e sair, só com a permissão de moradores. A calmaria do lugar foi interrompida às 8h do dia 2 com o barulho das sirenes e a movimentação de policiais e socorristas em frente ao sobrado A25 da rua Amarillis. Feita a retirada dos quatro corpos, o silêncio voltou, mas por outro motivo.
– Foi a vizinha da frente que avisou. A gente ainda não acredita no que aconteceu. Erick e meu filho de sete anos costumavam brincar de bicicleta. Nem sei como vou contar para ele. Mandei-o para a casa dos avós e disse que seu amigo estava viajando – conta o mecânico de aviões Francisco Silva, 42 anos, da casa no início na rua.
Ele é um dos poucos que concorda em falar sobre o que o portorriquenho Erik Seguinot Ramirez, 50 anos, fez com os filhos. E aconselha: como a comunidade é formada por muitas pessoas de terceira idade, será muito difícil arrancar qualquer palavra delas a respeito. De fato, quase ninguém atende à campainha das casas, mesmo que ruídos vindos do interior revelem a presença de gente. O único que topou conversar foi o advogado William Feliciano Ruiz, 92 anos, morador da rua paralela, que estava passando por ali para ver o local do crime.
– Aqui moram muitos médicos, engenheiros, advogados, nunca aconteceu nada parecido antes. Jamais imaginei que ele seria capaz disso. De vez em quando, eu o via dando umas caminhadas, parecia um sujeito de paz – diz o senhor.
Autor usava tornozeleira eletrônica por violência
Ao que tudo indica, a tranquilidade de Erik, que trabalhava com vendas pela internet, era apenas aparente. Conforme a polícia local, Marlene já o havia denunciado duas vezes por violência doméstica – a última em 10 de outubro, quando a agrediu diante das crianças.
O casal estava separado. No dia do crime, ela fazia um treinamento nos Estados Unidos para aperfeiçoar os serviços oferecidos pela Estética Brasileira, da qual é proprietária. Ele usava uma tornozeleira eletrônica e aguardava pela definição de sua situação, marcada pela Justiça para 17 de novembro.
Não deu tempo. As crianças foram encontradas mortas cada uma em suas camas, ainda de pijama, e o pai pendurado pelo pescoço nos fundos da casa. O detalhe de serem três é o que mais deixa os vizinhos estarrecidos. Ninguém entende como, ao matar a primeira, ele não tenha caído em si e desistido do plano macabro.
– Acho que queria punir Marlene por causa da separação tirando o que ela tinha de mais precioso, os filhos – opina Francisco.
Com o reconhecimento dos corpos, a polícia deve dar o caso por encerrado hoje. O clima da urbanización Jaracaranda, no entanto, nunca mais voltará a ser o mesmo. Enquanto o mecânico de aviões lança sua teoria, a rua é tomada por missionários das Testemunhas de Jeová batendo de porta em porta para distribuir mensagens da igreja. Maria (ela não quis dizer o sobrenome) conta que esteve ali quatro meses antes e chegou a conhecer Marlene. Desta vez, o panfleto que a religiosa insistia para que os moradores se dignassem a receber trazia uma inscrição que talvez seja o que a mãe esteja se perguntando: "Deixaremos de sofrer algum dia?".
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