Mais do que experiências profissionais, os funcionários de uma gráfica de Porto Alegre têm, infelizmente, muito a conversar sobre as vezes em que foram alvos de crime. Dos 20 trabalhadores que aceitaram conceder entrevista, sete foram assaltados à mão armada, dois perderam o pai e, um, o filho. Na segunda matéria da série "Uma história de muitas", a reportagem visitou, aleatoriamente, uma empresa para fazer a pergunta:
– Quem aqui já foi ou tem algum familiar vítima da violência?
Doze pessoas levantaram as mãos. A campanha do Grupo RBS, que dá rosto aos alvos da criminalidade, teve início na segunda-feira, quando uma turma de cursinho pré-vestibular contou suas histórias de violência.
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– Na empresa, tivemos no mínimo cinco invasões. Assalto à mão armada foram duas vezes – contou o dono da gráfica Comunicação Impressa, José Mazzarollo.
Para evitar que funcionários cujo expediente se encerra na madrugada, às 2h, sejam assaltados no trajeto para casa, Mazzarollo montou alojamento na empresa:
– Ficam aqui pousando, para sair pela manhã.
JORGE NILO PINHEIRO DE LIMA
52 anos, viu ladrão por arma na cabeça do filho de quatro anos
"Estava no Jardim Planalto (em Porto Alegre), 16h, em uma praça, jogando bola com o meu filho, que tinha quatro anos. Chegaram dois gurizões de 12 ou 13 anos. Até falei brincando: 'Ó, vem dois meninos jogar bola contigo'. Minha mulher estava sentada em um banco. Eles vieram. Quando passei a bola para um, ele pegou e veio, me calçou um revólver e o outro botou o revólver na cabeça do meu guri. Tu perde o chão, sabe? Disseram: 'Me dá a chave do carro vermelho'. Recém tinha comprado, fazia uns três dias. Entreguei a chave. Um disse: 'A senhora não faz nada, senão a gente explode a cabeça do seu filho'. Entraram no carro e saíram, faz uns quatro anos."
LEANDRO RONDON ANTUNES
47 anos, teve filho morto a tiros na esquina de casa, em Alvorada
"Meu filho foi assaltado na esquina de casa, em Alvorada, e levou quatro tiros: dois no estômago e dois na cabeça. Morreu na hora. Estava em um barzinho, tomando cerveja e jogando snooker. Os caras assaltaram o bar, reagiu e mataram ele. Era 21h, ele tinha 24 anos. Em 31 de março, fez três anos, e até agora não prenderam ninguém pelo homicídio. Reagiu porque queriam levar o tênis dele e o relógio, mas não aceitou, e os caras acabaram atirando. Todos amigos dele. Se criaram tudo junto. É triste. Até agora, não caiu a ficha."
JOSÉ LUCAS MAZZAROLO
25 anos, feito refém com a família por cinco horas em Viamão
"Estávamos em casa, à noite. Havíamos jantado. O pai chegou com a caminhonete, jantou. Quando terminou, os ladrões entraram gritando. Só lembro de ter pulado, no susto, e me escondido no sofá. Depois, quando levantei, estava o pai com as mãos para o alto, e eles com a arma na cabeça dele. Começaram a pedir bens, derrubaram tudo à procura de dinheiro. Levaram a caminhonete, tudo o que tínhamos. Faz uns nove anos. Na época, estávamos fazendo reforma. Um dos pedreiros levou uma coronhada. Ficou uma turma dentro de casa, todos presos. Ficamos bastante tempo nas mãos deles."
LUIS FERNANDO DA SILVA
47 anos, responsável pelo setor de impressão da gráfica
O pai de Luis Fernando da Silva, 47 anos, morreu na porta de casa com um tiro no coração, ao reagir a uma abordagem de criminosos.
O responsável pelo setor de impressão da gráfica Comunicação Impressa, em Porto Alegre, foi um dos dois funcionários da empresa que tiveram o pai assassinado por crimes em ações de roubo.
Conforme Luis, dois jovens estavam à espreita de Jerônimo da Silva, embaixo de uma árvore, já dentro do quintal da residência onde morava, em Gravataí. Quando o pai de Luis Fernando se aproximou da porta para tomar café olhando para a rua, hábito que repetia diariamente, viu a dupla armada se aproximando.
– Ele era do tipo que não se intimidava e reagiu, provavelmente, porque os ladrões eram dois jovens. Na reação, tomou um tiro no coração e morreu no local – relatou Luis Fernando.
Ele contou que o pai jogou o café em um dos criminosos e tentou entrar em luta corporal com o outro, momento em que foi baleado. Após invadir o pátio da casa de Jerônimo, a dupla atirou e fugiu a pé, sem levar nada.
– A sensação é de insegurança total, porque era dia claro, 6h da manhã. Estava dentro da própria casa. Ou seja, nem em casa teve sossego. Não tem hora, não tem lugar para as coisas acontecerem – lamentou o filho de Jerônimo.
OS NÚMEROS
20 funcionários
7 foram assaltados à mão armada
2 tiveram o pai assassinado (latrocínio)
1 teve o filho morto (latrocínio)
1 teve a casa arrombada
1 teve o irmão assaltado
8 não sofreram violência