"Sempre me interessei mais pelos bastidores do desempenho esportivo do que pelo próprio esporte", admitiu à AFP Hajo Seppelt, jornalista da emissora alemã ARD e figura famosa da luta antidoping, na origem das revelações a respeito do escândalo russo.
Nascido em Berlim em 1963, Hans-Joachim 'Hajo' Seppelt se tornou um especialista na luta antidoping na Alemanha, onde é regularmente consultado, mas também fora do seu país.
O jornalista iniciou a carreira no fim dos anos 1970, primeiro trabalhando no rádio e, em seguida, se tornando comentarista esportivo da natação a partir de 1992 para a emissora pública alemã ARD, particularmente sensível aos escândalos de doping.
A emissora chegou a suspender a retransmissão da Volta da França em 2007, antes de desistir de colocar em sua grade o evento entre 2012 e 2015, sempre em função da multiplicação de exames positivos entre os ciclistas.
Paralelamente, a ARD criou um verdadeiro serviço de investigação de doping, no qual Seppelt conta com muitos recursos.
"Eu comecei a me interessar por casos de doping em 1997. Foi durante os processos em torno do doping de Estado na Alemanha Oriental", explicou Seppelt à AFP. Neste mesmo ano, o jornalista produziu um documentário chamado "Segredos de Estado no doping de crianças", a primeira de uma longa série de investigações sobre trapaças no esporte.
Desde então, Seppelt, de cabelo curto e pequena barba escura, fez do doping o combate de sua vida, atacando, entre outros, diversas federações esportivas alemãs, além do atletismo do Quênia e, mais recentemente, o atletismo russo.
- Rússia na mira -
Em dezembro de 2014, a ARD apresentou o documentário "Doping confidencial: como a Rússia fabrica seus campeões", denunciando, com base em testemunhos, um sistema de doping generalizado no atletismo que acarretou na criação de uma primeira comissão de investigação da Agência Mundial Antidoping (Wada).
O documentário é seguido de diversas outras reportagens, entre agosto de 2015 e junho de 2016, que acusam a Rússia de seguidamente desdenhar das regras esportivas.
Hajo Seppelt, que não hesita em aparecer em suas reportagens e a se apresentar como um moralizador do esporte, acabou recebendo da imprensa alemã o apelido de "caçador de doping da ARD".
"Os jornalistas esportivos tradicionais, e eu mesmo fui um deles, contribuíram no passado para deturpar o olhar e afastar as pessoas da verdade, porque muitos deles se consideram amigos do esporte", julgou Seppelt, que hoje trabalha em tempo integral na investigação de casos de doping.
Junto com diversos colegas, Seppelt acaba de lançar uma plataforma na internet batizada de SportsLeaks, destinada a permitir a delatores abrirem o jogo sobre casos de corrupção ou de trapaça no esporte.
- Pressões e ameaças -
Seu trabalho, porém, não lhe vale apenas elogios e amizades: "É claro que há ataques, estou acostumando após 20 anos. Recentemente, recebi ataques pessoais que não foram muito agradáveis", explicou Hajo Seppelt.
O jornalista alemão acabou se tornando o alvo principal da mídia e dos blogs russos, que o inculpam de manipulação e de praticar acusações sem fundamento.
Recentemente, Seppelt acabou batendo boca com uma equipe de televisão russa que o entrevistava em casa. As imagens divulgadas pela emissora russa Rossiya-24 mostram o alemão perdendo a calma e expulsando a jornalista russa e sua equipe de seu apartamento.
Diversas ações judiciais foram apresentadas contra Seppelt ou a ARD, como em 2008 pela Federação Alemã de Esqui (DSV) ou em 2012 pela patinadora de velocidade alemã Claudia Pechstein, para contestar as acusações ou exigir indenizações.
Mas, "até agora, não perdemos um grande processo judicial", comemora o jornalista, responsável por mergulhar as entidades esportivas internacionais numa crise inédita.
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