As belezas naturais dos dois parques nacionais que guardam os maiores cânions do Brasil – o Aparados da Serra e o da Serra Geral, em Cambará do Sul – conseguem se sobrepor à precariedade da infraestrutura ofertada aos turistas. Há quase 20 anos, esses espaços não recebem nenhum investimento do governo federal, responsável pelas duas estruturas por meio do Instituto Chico Mendes. Parte dos 186 mil visitantes anuais encerra a caminhada defronte aos cânions Itaimbezinho e Fortaleza certo de que os paredões, formados há mais de 130 milhões de anos, valem qualquer esforço físico.
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No entanto, quem aposta no turismo como negócio se sente incomodado com a falta de coisas básicas como banheiros, água, lancheria, abrigo para turistas, placas informativas ou até mesmo boas condições no acesso aos parques.
Diante da precariedade dos parques, empresários se aliaram a prefeituras de quatro municípios ( Cambará e Mampituba, no Rio Grande do Sul, e Jacinto Machado e Praia Grande, em Santa Catarina) para tentar amenizar os problemas e desenvolver algumas melhorias. José Antônio Brugnera, proprietário do Cambará Ecohotel, sabe bem as consequências que a estrada ruim traz ao seu empreendimento, no acesso ao Aparados da Serra. Por isso, ele e um grupo de empresários criaram duas entidades representativas, a Câmara Técnica de Fomento ao Turismo e a Associação para o Turismo Sustentável dos Aparados da Serra, que tratarão de medidas emergenciais para a infraestrutura.
O parque Serra Geral, onde estão os cânions Fortaleza e Malacara, será o primeiro a receber melhorias. Uma guarita com dois banheiros, bebedouro e estacionamento adequado estão previstos para sair do papel ainda neste ano. O investimento deve chegar a R$ 20 mil, valor que será rateado entre os empreendedores.
– O visitante pode até pagar para entrar no parque, mas precisa ter estrutura – defende Brugnera.
As prefeituras de Cambará, Mampituba, Jacinto Machado e Praia Grande vão disponibilizar maquinário para as obras e se comprometem a pleitear recursos estaduais e federais para futuras intervenções nas rodovias de acesso, por exemplo. A solução para as estradas, porém, não será tão rápida. O acesso ao Itaimbezinho é via RS-427, estrada estadual que ficou quatro meses sem intervenções por parte do Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem ( Daer).
A situação é pior em 13 quilômetros de acesso ao cânion Fortaleza. Neste caso, a prefeitura de Cambará do Sul estuda se a pavimentação ideal é asfalto biodegradável, ecologicamente correta, ou paralelepípedos, para respeitar a área de preservação ambiental.
– Mas não temos nenhuma previsão de verba para esta obra – adianta a secretária de Turismo de Cambará em exercício, Rosivani Monteiro de Souza.
Travessia envolve disputa judicial
Os quase 50 quilômetros que dividem o parques da Serra Geral do Aparados da Serra – incluindo um retorno ao centro de Cambará – poderiam se transformar em 15 quilômetros. Além disso, o caminho poderia virar uma trilha que movimentaria ainda mais o eixo turístico entre os parques. O que impede a consolidação dessa travessia é que as terras que ligam os dois cânions estão em propriedades particulares, pertencentes à empresa Agrolatina, e passam um processo de desapropriação pela União. A burocracia judicial completa 20 anos sem perspectiva de resolução, já que detalhes barram o avanço da questão.
O processo até já teve uma sentença que estipulava o valor da indenização, mas que foi anulada na sequência.
– O que está em jogo hoje não é mais o que deve ser desapropriado, e, sim, os valores de indenização e as divisas do que é da União e o que é da empresa – explica o diretor da 3 ª Vara da Justiça Federal, Regis Candeia.
A regularização fundiária é um dos desafios dos parques, afirma o chefe da unidade avançada Deonir Zimmermann. A consolidação desta trilha de travessia poderia ajudar na movimentação do parque, acrescenta ele. Segundo Zimmermann, ainda que de 2014 para 2015 o público visitante tenha aumentado em 40%, os números de movimentação do cânion Itaimbezinho mostram que maio deste ano, por exemplo, registrou queda de quase 50% em relação ao mesmo período do ano passado: no lugar dos 11,6 mil de 2015, somente 6,6 mil pessoas passaram por lá em maio de 2016.
– É um dos reflexos da crise, algo bastante pontual – acredita.
AS CONDIÇÕES
Estradas: o acesso ao Parque Nacional Aparados da Serra, onde está o cânion Itaimbezinho, tem 18 quilômetros, sendo apenas um quilômetro asfaltado. É preciso atenção, já que há trechos com acúmulo de pedras grandes na pista. Os 22 quilômetros de acesso ao Parque Serra Geral, no cânion Fortaleza estão entre as maiores críticas dos visitantes. Ainda que seis quilômetros sejam asfaltados, o trecho de estrada de chão fica quase intrafegável em dias de chuva. A prefeitura de Cambará estuda a pavimentação.
Segurança: uma intervenção urgente é a instalação de cordões de isolamento no cânion Fortaleza. No Itaimbezinho, ainda que os cordões deixem claro que o visitante não deve ultrapassar, a reportagem do Pioneiro flagrou, no último dia 28 de junho, dois casais acessando a beira do precipício. Placas informativas são reivindicadas pelos visitantes, que também reclamam da ausência de guardas na trilha do Itaimbezinho. – Não vimos um segurança – reclamou a turista carioca Luzia Cavalheiro Pereira.
Estrutura: O Itaimbezinho é mais equipado do que o Fortaleza mas, mesmo assim, carece de investimentos. As pontes dispostas ao longo das caminhadas precisam de reformas, há um banheiro ao longo da Trilha do Cotovelo, mas que parece abandonado. Uma lancheria chegou a ser aberta, mas fechou por falta de estrutura. Há ainda um bebedor e um banheiro no Centro de Visitações. O estacionamento e as estradas internas estão em boas condições. No Fortaleza, sequer existe banheiro ou água potável na trilha.