Usuários de 14 unidades de saúde de Porto Alegre estão sentindo o reflexo da saída de 16 profissionais de diferentes nacionalidades, incluindo brasileiros, do Mais Médicos que não foram repostos pelo Ministério da Saúde. É a primeira vez nos três anos do programa que esta reposição não ocorre em até 40 dias na Capital. Atualmente, são quase três meses de espera.
Dos 16 profissionais que se afastaram desde maio, seis foram reprovados nos cursos obrigatórios para seguir no programa e os demais saíram por vontade própria. Entre estes, estrangeiros que conseguiram a revalidação do diploma médico no Brasil e optaram por sair porque tinham habilitação para abrir o próprio consultório ou atuar em demais áreas para além da atenção básica, por exemplo.
– Depois que trocou o governo (federal), não temos informações mais precisas (sobre o Mais Médicos) – destaca a assistente administrativa Fernanda Picetti, do Instituto Municipal de Estratégia de Saúde da Família.
Um só
A Unidade de Saúde (US) Cohab Cavalhada, na Zona Sul da Capital, perdeu um médico em maio e outro em junho e, no final deste mês, ficará sem o único que sobrou. Por dia, 120 usuários em média procuram atendimento no local, em uma área onde vivem 12 mil pessoas. A demanda do único médico, o cubano Orestes Oliveira Nuñez – que deve sair no final do mês devido ao término do contrato de três anos –, triplicou e cabe à equipe de enfermeiros e técnicos gerenciar a sobrecarga.
– Não são todos (os pacientes) que precisam que passam pelo atendimento médico _ admite a coordenadora do posto, a enfermeira Eunice Hilleshein.
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Difícil acesso
Na US Viçosa, na Lomba do Pinheiro, o único médico deixou o posto há um mês. Os pacientes passam por triagem e, se necessário, são encaminhados para outra unidade. Apenas na Restinga, três unidades perderam cada uma um profissional do Mais Médicos: Castelo (ainda tem dois), Quinta Unidade (tem um) e Macedônia (tem quatro). Coordenadora do Conselho Distrital de Saúde da Restinga, Djanira Corrêa da Conceição explica que há dificuldade em realocar profissionais para lá:
– Os médicos brasileiros não querem trabalhar nas periferias por causa da violência, alegam que as unidades são precárias. Com isso, é menos atendimento para o usuário.
Mais 19 saem até setembro
Outros 19 profissionais devem deixar mais 17 unidades até setembro. A Capital tem 123 vagas no Mais Médicos. Segundo a coordenadora-geral da Atenção Básica de Porto Alegre, Vânia Maria Frantz, a falta e a dificuldade de remanejar profissionais para áreas distantes faz com que aumente o número de pessoas nas emergências.
– A instabilidade do Mais Médicos é a maior preocupação da atenção básica de Porto Alegre nesse momento – admite.
Necessidade
A educadora Zumira Lopes, 33 anos, sente a falta de médicos na US da Cavalhada. Ela foi uma das atendidas por Orestes na sexta passada após esperar quatro horas e meia. Perdeu a manhã de trabalho:
– O acolhimento continua rápido, mas a gente espera muito mais tempo.Grávida de 16 semanas, Jamila Oliveira, 29 anos, hipertensa e diabética, continuará o pré-natal na unidade, mas sem o olhar de um médico.
Embora seja possível executar os procedimentos com enfermeiros, Eunice lembra que é em situações como essas que os médicos são ainda mais necessários:
– Em qualquer urgência, não teremos opinião especializada.
Ministério da Saúde não informa prazo
O Ministério da Saúde garante que as reposições do Mais Médicos não foram interrompidas, no entanto, não dá previsão para a chegada de novos profissionais para Porto Alegre. As vagas desocupadas por médicos brasileiros e de outras nacionalidades são repostas por meio de editais trimestrais. O último ocorreu em abril e o próximo será neste mês, possivelmente nesta semana.
No caso dos médicos cubanos, que retornam à Cuba quando o contrato completa três anos, a substituição é feita diretamente pela Organização Pan-Americana da Saúde. Nesta semana, o ministério definiu que os profissionais com previsão de sair entre julho, agosto e setembro ficarão em suas unidades até novembro, para que a saída e a reposição não atrapalhe as eleições municipais. Em nota enviada ao DG, a pasta destaca que a reposição "é um compromisso do ministro da saúde, Ricardo Barros, para não deixar desassistida a população dos locais onde esses médicos atuavam".