A Colômbia vive uma caça a gangues criminosas que tentam desestabilizar o processo de paz ou ser reconhecidas como entes políticos. São dois objetivos aparentemente contraditórios, mas ambos têm a finalidade de evitar perdas com a pacificação do país, processo tido como irreversível. Na terça-feira, o governo de Juan Manuel Santos prometeu fortalecer o combate contra o chamado Clã Úsuga, principal grupo criminoso do país. É oferecida recompensa de US$ 1 milhão pelo líder, Dairo Antonio Úsuga. A pressão para isso ocorrer vem até da guerrilha, em meio às negociações pela paz.
O governo prometeu realizar, até o fim do ano, 1,7 mil operações contra as gangues. Em jogo, está a principal bandeira de Santos – a pacificação. O sinal de alerta foi dado pelas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), que pediram ação contra os "narcoparamilitares" e disseram não ser possível chegar a um acordo enquanto o grupo estiver em ação. O Clã Úsuga age no departamento de Antioquía, cuja capital é Medellín, modelo da pacificação nacional. Intensificou os ataques nas últimas semanas, amedrontando a população. Assassinatos e incêndios de ônibus acuaram a população.
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Por que Medellín é o símbolo? Porque, nos anos 1990, o índice de homicídios na capital de Antioquía era de 360 casos para cem mil habitantes. Em 2006, baixou para 39 casos a cada cem mil. A "revolução" se deu a partir de projetos culturais. Medellín se converteu em referência de transformações socioculturais. O Clã Úsuga faz uma afronta a isso.
Não bastassem escolas, comércios, transportes e serviços públicos terem fechado as portas por temor ao clã, a ex-senadora esquerdista Piedad Córdoba, espécie de interlocutora política entre o governo e a guerrilha, foi vítima de uma tentativa de atentado. Os episódios ocorreram paralela e, para muitos, orquestradamente.
Em nota, as Farc alertaram: "Com grupos paramilitares, crimes e atentados, ameaças e terror, não se pode materializar a paz". No mesmo texto, a guerrilha pediu a Santos que termine com os grupos ilegais que, segundo elas, no passado combateram os rebeldes e cometeram violações dos direitos humanos.
– A criminalidade não vai desaparecer de vez com o processo de paz. Até guerrilheiros se desmobilizam e voltam em outros grupos. E há a criminalidade pura. Não haverá paz perfeita. Grupos se reciclam – diz Marcos Peckel, professor universitário e da Academia Diplomática colombiana.
Santos assegura que os grupos aos quais a guerrilha se refere são, na realidade, bandos criminosos dedicados ao narcotráfico e que surgiram da grande desmobilização dos paramilitares da ultradireita durante o mandato do seu antes aliado e hoje desafeto ex-presidente Álvaro Uribe (2002-2010). De acordo com o atual presidente, os grupos armados agem para serem aceitos em um processo de paz como se fossem entidades políticas.
O processo de paz com as Farc, cuja conclusão era prevista para 23 de março, está em suspenso. Santos quer que a guerrilha, antes, deponha as armas. Enquanto isso não ocorre, o desgaste do governo é evidente. No início do mês, milhares de pessoas protestaram em 20 cidades contra Santos e as negociações, convocadas por Uribe, linha-dura de direita e acusado de apoiar os paramilitares. Os manifestantes saíram vestidos com as cores da bandeira colombiana – amarela, azul e vermelha – e levaram cartazes com mensagens como "Santos, traidor, renuncie já", "Chega de impunidade", "Chega de corrupção" e "Santos presidente das Farc".
– O protesto é pelo inconformismo contra o governo. Não queremos impunidade nos processos de paz – disse Francisco Santos, dirigente do partido uribista Centro Democrático, mostrando que o Clã Úsuga alimenta o discurso do medo e reforça os protestos contra o governo.
Uribe, filho de pai morto pela guerrilha, é crítico ferrenho do processo de paz desenvolvido desde novembro de 2012. Diz considerar que as negociações com a guerrilha deixam a porta aberta para a impunidade. Sustenta que o mesmo ocorreria nas negociações de paz com o Exército de Libertação Nacional (ELN), a segunda maior guerrilha do país, depois das Farc. As negociações com o ELN já se iniciaram.