As cúpulas do Ministério Público Federal (MPF) e da Polícia Federal (PF) estão convencidas de que detalhes da última fase da Operação Lava-Jato, que atingiu o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, vazaram antes da ação. A desconfiança é tamanha que um inquérito foi aberto para investigar como isso teria ocorrido. A principal suspeita recai sobre servidores federais simpáticos ao ex-presidente, que era alvo da Operação Aletheia, como foi denominada a 24ª fase da Lava-Jato.
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O vazamento teria propiciado que gavetas e armários do Instituto Lula, em São Paulo, fossem esvaziados antes da busca e apreensão de documentos feita pela PF na última sexta-feira. A obtenção do material é vital para esclarecer se o instituto e a empresa criada por Lula para dar palestras, a LILS, tinham documentação e movimentavam dinheiro de comum acordo (seriam R$ 30 milhões desde 2011). Essa é uma das suspeitas da investigação: a de que o ex-presidente pode ter canalizado para a empresa e o instituto os donativos de empreiteiras investigadas por corrupção.
Ao cumprirem mandados judiciais no Instituto Lula, criado para divulgar o trabalho e o pensamento do ex-presidente, os policiais se depararam com salas vazias. Também estranharam o sumiço de agendas, documentos impressos e anotações que deveriam ter sido encontrados em uma entidade que coordena as múltiplas atividades de um político do porte de Lula.
Os agentes recolheram computadores, e as memórias serão examinadas por peritos da PF, atrás de documentos que possam esclarecer as atividades de Lula, especialmente após seus oito anos de mandato na Presidência da República (2003 a 2011). Há expectativa de que parte dos documentos retirados do instituto possa ter sido levada para a casa de suspeitos investigados pela Aletheia. Os federais vasculharam 37 endereços na sexta-feira para recolher documentos e computadores em todos. A busca incluiu a residência de Lula e de seus três filhos homens.
O inquérito aberto pelo MPF para checar a fonte do vazamento da operação deve investigar policiais federais, procuradores e servidores do Judiciário. Há suspeita de que sindicalistas ligados a essas corporações possam ter alertado integrantes do governo - e simpatizantes de Lula - sobre as buscas que ocorreriam na semana passada.
- Avaliamos que funcionários públicos tiveram acesso às ordens de busca e apreensão e alertaram os alvos - confirma a Zero Hora um dos investigadores da Lava-Jato.
Serão checados telefonemas e dados compartilhados por esses servidores nas últimas semanas.
Não é a primeira suspeita de vazamento na Lava-Jato. Em abril de 2014, um aparelho de escuta clandestino (microfone) foi encontrado na cela do doleiro Alberto Youssef, na sede da PF, em Curitiba. A suspeita é que tenha sido introduzido ali por agentes federais, de forma ilegal, para checar até onde iria o conhecimento do doleiro-delator sobre os atos de corrupção envolvendo políticos. Posteriormente, a PF concluiu que o aparelho já estava no cárcere antes de Youssef ocupá-lo.
A PF também investigou possível tentativa de cooptação de agentes federais por parte de executivos da Odebrecht. No celular do presidente da empresa, Marcelo Odebrecht (preso desde meados de 2015), foram encontradas anotações no sentido de "parar/anular (dissidentes da PF)". O fato foi considerado pelo juiz Sérgio Moro, que julga os casos da Lava-Jato, "uma aparente cooptação ilícita de policiais federais para atrapalhar as investigações". Odebrecht não esclareceu o episódio.
A quebra de silêncio em relação à investigação pode ter se refletido em outros locais que não apenas no Instituto Lula. Em São Bernardo do Campo (SP), há suspeita de que os seguranças do ex-presidente o teriam alertado antes da chegada dos agentes da Polícia Federal.