A primeira consequência administrativa no caso da pediatra que se recusou a continuar atendendo o filho de uma petista foi a abertura de sindicância pelo Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers). A tarefa do colegiado é analisar se há indícios de que a conduta da profissional foi equivocada, o que poderá determinar a inauguração de outro processo em que há previsão de punições.
A suplente de vereadora Ariane Leitão (PT) protocolou formalmente uma denúncia no Cremers contra a pediatra Maria Dolores Bressan. A petista afirma que no último dia 17, na data seguinte à divulgação de escuta de uma conversa entre o ex-presidente Lula e a presidente Dilma Rousseff, a profissional enviou mensagem de WhatsApp informando que não iria mais voltar a atender o filho de Ariane, de um ano e um mês, por causa da filiação partidária dela. Em meio ao processo de radicalização política no Brasil, a pediatra alegou estar "profundamente abalada" e "decepcionada", "sem a mínima condição de ser pediatra do teu filho".
A discussão gira acerca da conduta. Há opiniões, como a de Ariane, de que a médica lesou um direito da criança por questões partidárias. O que a sindicância discutirá é se houve quebra da ética profissional.
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- A denúncia foi protocolada oficialmente na segunda-feira por parte da pessoa que se sentiu ofendida. O conselho já abriu a sindicância, orientada pela nossa corregedoria - explicou Rogério Aguiar, presidente do Cremers.
Ainda não foi designado o conselheiro-relator. Será dele a tarefa de fazer a investigação, com interrogatórios das partes, recebimento da peça de defesa, coleta de documentos e busca de testemunhas. Como se trata de uma fase de admissibilidade de processo, o relator apresentará um parecer, ao final, para uma câmara composta por sete conselheiros. Se o entendimento for de que existem indícios de má conduta, é instalado um processo ético-profissional, fase de julgamento de mérito. É reaberto o prazo para produção de provas e defesa, com aprofundamento de detalhes. No desfecho, se a decisão apontar culpa, as penas podem variar entre advertência, censura, suspensão ou cassação do direito ao exercício profissional. Em caso de absolvição, resta o arquivamento.
- A sindicância foi aberta ontem (terça-feira). Isso demora meses, não tem prazo para terminar. Mas esse caso não deve ocupar muito tempo para evoluir. A nossa experiência mostra que os casos que envolvem hospitais, prontuários, exames e prescrições, podem ser mais demorados. Envolve muito documento e testemunha. Mas não é o caso de agora. Imagino que, em algumas semanas, deve estar concluída a sindicância - explicou Aguiar.
O presidente do Cremers evitou emitir opinião sobre a conduta da médica.
- Não posso fazer essa avaliação. Qualquer pronunciamento que eu fizer pode ser um prejulgamento. Só o que posso dizer é que o assunto não vai passar em branco, já abrimos a sindicância - afirmou.
Em entrevista ao Diário Gaúcho, o presidente do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers), Paulo de Argollo Mendes, ampliou a polêmica ao dizer que a profissional "tem a nossa admiração". Depois da repercussão, ele deixou de comentar o assunto publicamente. O Simers publicou uma nota em seu site para referendar o apoio à médica.
"A declaração confirma o posicionamento do Simers a respeito do cumprimento do Código de Ética Médica, o qual garante que o médico exercerá sua profissão com autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de sua consciência ou a quem não deseje, excetuadas as situações de ausência de outro médico, em caso de urgência ou emergência, ou quando sua recusa possa trazer danos à saúde do paciente", diz a nota.