Quase nove anos depois de descoberto um esquema de fraude na Companhia de Geração Térmica de Energia Elétrica (CGTEE) do Rio Grande do Sul, seis réus foram condenados em segunda instância. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) julgou os recursos do Ministério Público Federal (MPF) e de seis réus condenados por fraudar documentos e utilizar a empresa como avalista de um empréstimo de 159 milhões de euros (em valores atuais, mais de R$ 680 milhões) entre três empresas brasileiras e um banco alemão, em 2004.
A sentença, que condenou seis réus e absolveu três, foi proferida pela 1ª Vara Federal de Porto Alegre em maio de 2013. Em primeira instância, a Justiça concluiu que seis dos réus são culpados no esquema, que incluiu documentos forjados e assinaturas falsificadas para oferecer garantias ao empréstimo – expondo a CGTEE a riscos financeiros de forma ilegal. Três réus foram absolvidos.
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Na última semana, em segunda instância, o tribunal concluiu o julgamento dos recursos e aceitou parte dos pedidos do MPF, aumentando as penas dos réus condenados. Os magistrados também concordaram com o recurso de Erwin Alejandro Jaeger Karl, que era representante de uma das empresas envolvidas, absolvendo-o de um dos crimes, o de corrupção ativa. As apelações criminais dos demais réus foram negadas. As absolvições ocorridas em primeira instância foram mantidas pelo tribunal.
Os réus que tiveram a condenação confirmada em segunda instância, com início da pena em regime fechado, devem começar seu cumprimento, mesmo com determinação de expedição de prisão pelo juiz federal Nivaldo Brunoni, somente após prazo para advogados apresentarem embargos de declaração ou infringentes – o que eles já adiantaram que devem fazer. Por isso, as prisões só devem ocorrer "após serem esgotados todos os recursos cabíveis no TRF4", informou o tribunal.
De acordo com o TRF4, os advogados têm o prazo de dois dias para apresentar embargos de declaração – quando a parte busca esclarecimento ao tribunal de determinado aspecto da decisão –, e de 10 dias para os infringentes – quando se busca a rediscussão da determinação judicial quando a decisão não é unânime entre os desembargadores, o que ocorreu no caso em questão.
"Se houver interposição de embargos infringentes, verificam-se os requisitos para o recebimento do recurso e, se aceito, o processo é redistribuído para análise da 4ª Seção do TRF4, que reúne a 7ª e 8ª Turmas, especializadas em matéria criminal. Os desembargadores federais analisam o pedido, formulam seus votos e o processo é pautado pelo magistrado relator para ir à julgamento", esclarece o tribunal em nota.
Relembre o caso
O caso, que veio à tona em 2007, foi alvo de uma série de reportagens de Zero Hora. Em irregularidades cometidas entre 2004 e 2007, os réus atuaram para possibilitar à empresa alemã CCC Machinery obter o empréstimo de 159 milhões de euros.
O objetivo era construir sete usinas de biomassa no Rio Grande do Sul. Para repassar o dinheiro, o banco alemão KfW exigiu um fiador. O grupo, então, tentou obter o aval junto à própria CGTEE, mas o conselho da estatal vetou o pedido: a Lei de Responsabilidade Fiscal proíbe estatais de conceder avais a empresas independentes. Rejeitado o pedido, os réus seguiram em frente e forjaram os papéis para tocar adiante o financiamento, favorecendo as empresas UTE Winimport, Hamburgo Energia e Elétrica Jacuí.
A cúpula da CGTEE só se deu conta do esquema quando foi notificada pelo KfW de que constava como fiadora do empréstimo, em abril de 2007. Em 1º de junho de 2007, a estatal exonerou o então diretor técnico e de meio ambiente, Carlos Marcelo Cecin, abriu sindicância e, dias depois, comunicou o caso à Polícia Federal.
De acordo com a denúncia, os réus atuaram na prática de vários crimes, entre eles, corrupção passiva, corrupção ativa, estelionato e contra o sistema financeiro nacional.
Veja abaixo o nome dos réus, suas respectivas condenações e contrapontos:
Carlos Marcelo Cecin: era diretor técnico e de meio ambiente da CGTEE e foi denunciado por assinar as garantias para o empréstimo. Ele foi condenado por falsidade ideológica e corrupção passiva à pena de 12 anos, seis meses e 10 dias, em regime inicial fechado.
O que diz a defesa: o advogado Lucio Santoro de Constantino alega que houve um equívoco na aplicação da pena, pois a decisão do TRF4 não teria ampliado a pena de acordo com o que foi requerido pelo MPF. Por isso, vai recorrer ao TRF4 para readaptar a pena. O defensor diz que, em outra linha, vai recorrer da decisão também no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Alan de Oliveira Barbosa: era presidente da empresa Hamburgo Energia, tendo participado das negociações. Ele foi condenado por falsidade ideológica, uso de documento falso, falsificação de documento público e corrupção ativa à pena de 12 anos de reclusão, em regime inicial fechado.
O que diz a defesa: o advogado Cyro da Silva Schmitz diz que respeita a decisão, mas que vai usar todos recursos previsto em lei, questionando aspectos da decisão no sentido de majorar a pena.
Joceles da Silva Moreira: era assessor jurídico da CGTEE e elaborou pareceres favoráveis ao empréstimo sem autorização do Conselho de Administração. Ele foi condenado por falsidade ideológica e corrupção passiva à pena 12 anos, seis meses e 10 dias, em regime inicial fechado.
O que diz a defesa: o advogado Cyro da Silva Schmitz diz que respeita a decisão, mas que vai usar todos recursos previsto em lei, questionando aspectos da decisão no sentido de majorar a pena.
Luciano Prozillo Júnior: era diretor financeiro da UTE Winimport e participou do esquema. Ele foi condenado por uso de documento falso e falsidade ideológica à pena de três anos e quatro meses, em regime inicial aberto.
O que diz a defesa: o advogado Roberto Brzezinski Neto diz que ainda não analisou a decisão, mas que deve interpor recurso aos tribunais superiores, STJ e STF.
Erwin Alejandro Jaeger Karl: era representante da CCC Machinery no Brasil. Ele decidiu abrir a empresa aqui para que fosse proprietária das usinas. Para concretizar o negócio, ele teria ajudado a falsificar a documentação que forjava o aval da CGTEE. Karl foi condenado por falsificação de documento público, uso de documento falso, falsidade ideológica e corrupção ativa. Ele foi o único réu que teve o recurso parcialmente atendido pelo tribunal, sendo absolvido do crime de corrupção ativa. A pena será de 11 anos de reclusão, em regime inicial fechado.
O que diz a defesa: o advogado Aury Celso Lima Lopes Junior, que consta no processo como defensor do réu, diz que não defende mais Karl. ZH não conseguiu localizar o próprio réu.
Júlio César Azevedo Magalhães: era um dos donos da Enerpal, empresa sócia majoritária da Hamburgo. Ele estava com os documentos falsificados na sede da Elétrica Jacuí (Eleja) quando houve a apreensão pela Polícia Federal. Magalhães foi condenado por falsificação de documento público à pena de três anos, sete meses e seis dias, em regime inicial aberto.
O que diz a defesa: o advogado Paulo Roberto Cardoso Moreira de Oliveira diz que vai recorrer ao STJ, porque entende que a condenação é injusta, pois não tem "configuração probatória necessária pra condenação criminal", e que outros aspectos relevantes não foram levados em conta.
A absolvição de Filipe Parisotto, Iorque Barbosa Cardoso e Celso Antônio Barreto do Nascimento foi mantida. Todos os condenados criminalmente também deverão pagar multas, que variam entre R$ 3 mil a R$ 45 mil.