Parte dos carros roubados, principalmente na Capital, viravam fumaça há pelo menos oito meses. Com um esquema complexo de roubos e clonagens de veículos, uma quadrilha identificada pela Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos, do Deic, negociava caminhonetes e veículos grandes com contrabandistas de cigarros de Santa Catarina, Paraná e da Fronteira Oeste do Estado.
Eram apenas parte dos mais de 200 veículos roubados neste período pelo grupo atacado em operação policial na manhã de sexta.
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Ao todo, a Operação Cadeira de Ferro prendeu 18 pessoas, apreendeu cinco veículos, três armas e diversas munições entre a Capital e a Região Metropolitana. O casal Alessandro Vilanova e Maristela Melo da Silva que, segundo o delegado Luciano Peringer, comandava os assaltos, foi preso na Capital.
Um cadeirante, no entanto, apontado como o mentor intelectual do grupo e que deu nome à operação, não foi encontrado. Na Região Metropolitana, ainda foram cumpridos mandados em Alvorada, Viamão, Canoas, Sapucaia do Sul, Estância Velha e Novo Hamburgo.
- Ele planejava os roubos e eventualmente acompanhava os assaltantes em alguns deles - explica o delegado.
O Bairro Petrópolis, em Porto Alegre, era o principal foco dos roubos. E o destino, de acordo com a investigação, era Alvorada.
- Depois de roubado, geralmente com grave ameaça às vítimas, os carros ficavam dias "esfriando" estacionados em Alvorada. Só depois disso é que partiam para a segunda fase desse esquema, que era a clonagem - conta Luciano Peringer.
Segundo ele, após a adulteração dos carros, as negociações de carros grandes eram feitas diretamente com contrabandistas. Eles encomendavam veículos avaliados em torno de R$ 80 mil por apenas R$ 2 mil.
Um emissário levava o carro até cidades como Santana do Livramento, na Fronteira, Francisco Beltrão (PR) ou São Lourenço do Oeste (SC), onde também foram cumpridos mandados na manhã de sexta, e voltavam de ônibus.
Os carros com placas trocadas eram usados para atravessar as fronteiras carregados com cigarros. Se porventura a carga fosse interceptada na estrada, abandonavam os veículos com tudo dentro.
- É quase uma brecha legal que esses criminosos encontraram para escoar os carros adulterados. Porque o contrabando, em relação ao tráfico de drogas, que utiliza muito de veículos adulterados, por exemplo, tem uma pena branda. E as perdas para quem compra a caminhonete por R$ 2 mil acabam sendo mínimas - diz o chefe de polícia, delegado Emerson Wendt.
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Carros eram vendidos por dez vezes menos
A maior parcela dos carros roubados pela quadrilha, porém, virava mercadoria sob suspeita em ofertas de veículos principalmente nas redes sociais. Sob o pretexto de que se tratavam de carros com dívidas de financiamentos, eram oferecidos por até dez vezes menos que o valor real.
- Um carro de R$ 50 mil chegava a ser vendido por R$ 5 mil, e o comprador, de maneira geral, sabe que não está fazendo um negócio legal. Ele compra por esse valor sabendo que em algum momento o veículo pode ser recolhido pela financiadora - afirma o delegado Luciano Peringer.
Os carros eram entregues inclusive com documentações de transferência e licenciamentos adulterados. Era o subterfúgio para, em caso de apreensão, alegar que havia comprado o veículo, feito a transferência, mas ainda não havia recebido os carnês para honrar os pagamentos do financiamento.
Neste mercado, os principais alvos do bando eram modelos como HB-20, Ônix, Sandero, Duster e City.
- São todos carros com muita saída no mercado. Vendiam rapidamente em grupos do Facebook, principalmente - aponta o delegado.
"Vai ser um ano bom", diz secretário
- Este vai ser um ano muito bom para a área da Segurança Pública.
Foi com essa frase que o secretário Wantuir Jacini, que acompanhou o encerramento da operação policial no Deic, definiu o que, segundo ele, foi o início de uma série de ações para sufocar a criminalidade no Estado. Segundo ele, o combate ao roubo de veículos é considerado a principal prioridade do ano na pasta.
- Passamos todo o 2015 criando o projeto contra os desmanches, e já demos uma demonstração da eficiência desse modelo de combate à receptação que alimenta o crime - disse.
Os demais passos para concretizar a sonhada redução nos números de roubos de veículos, segundo Jacini, estarão focados na investigação das quadrilhas - com resultados como os de sexta - e na investigação sobre o capital dos criminosos.
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Como atuava a quadrilha
- Usando um carro, atacavam entre três e quatro criminosos, sempre em roubos violentos. Para evitar um flagrante dos roubos, a arma do crime era sempre levada, depois de tomado o carro da vítima, no veículo que servia como batedor. Se o bandido fosse preso, seria indiciado somente por receptação, com pena menor.
- Os carros eram deixados em Alvorada estacionados na rua por alguns dias para "esfriar", aguardando se não tinham nenhum sistema de localização. Depois, tinham as placas trocadas e eram deixados mais um tempo na rua para eliminar todos os riscos de serem flagrados.
- Em uma oficina, os veículos eram transformados, com adulteração de todos os sinais de identificação e recebiam também documentação toda falsificada.
- Parte dos carros era negociada nas redes sociais a preços até dez vezes inferiores ao mercado, sob alegação de que eram veículos com dívidas de financiamento.
- Outra parte - em geral caminhonetes e carros grandes - eram negociados por valores ainda menores com contrabandistas da Fronteira Oeste, Santa Catarina e Paraná. Os carros serviam para trazer cigarros contrabandeados para o país.
* Diário Gaúcho