As 650 mil toneladas de maçã produzidas anualmente no Estado - um mercado que movimenta mais de R$ 1 bilhão por ano em Santa Catarina, com a geração de 40 mil empregos durante a colheita - estão ameaçadas por um perigo que vem do Oriente. A sinalização do governo federal de que o mercado brasileiro pode ser aberto para a fruta da China pode, segundo especialistas, provocar a quebra de produtores catarinenses devido aos baixos preços praticados pelos possíveis concorrentes.
São 17 mil quilômetros de distância entre os dois países, mas o subsídio do governo chinês permite que a maçã daquele país chegue a um preço abaixo do aplicado por produtores catarinenses. Uma caixa de 20 quilos de maçã chinesa pode chegar a
R$ 34 no Brasil, principalmente no segundo semestre, quando a caixa do fruto pode alcançar R$ 60 e, segundo produtores locais, fazer "valer a safra".
Uma visita da ministra da Agricultura, Kátia Abreu, à China, em novembro, resultou em alguns pedidos daquele país. Entre eles, estava a exportação de maçã chinesa para o mercado brasileiro. Dias depois, foi a vez dos produtores catarinenses se encontrarem com a ministra em Brasília para protestar contra a possibilidade de abertura. No entanto, a resposta da ministra não foi positiva para os catarinenses.
- O setor esperava um apoio da ministra, mas teve o oposto. Ela disse que todos querem vender para a China, que tem um grande mercado consumidor, então o Brasil teria que comprar algo deles também - afirma o secretário adjunto de Estado de Agricultura e da Pesca, Airton Spies, que acompanhou os produtores na visita.
A China representa quase 60% de toda maçã produzida no mundo. A reportagem entrou em contato com o Ministério da Agricultura e o Departamento Econômico e Comercial da Embaixada da China no Brasil, mas não obteve resposta sobre a possibilidade de abertura do mercado brasileiro de maçã até o fechamento desta edição.
Liberação depende de análise técnica
Em nota, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) informou que a abertura do mercado brasileiro de maçã para a China só deve ocorrer após uma análise técnica. O órgão não revelou se uma possível liberação da importação da fruta seria de forma gradual.
"Se após a realização da Análise de Risco de Pragas (ARP) que o Mapa regularmente realiza para estes tipos de produtos, for constatado que a importação de maçãs da China não oferece risco significante a produção agrícola nacional, o Brasil, como país membro do Organização Mundial do Comércio deve permitir a importação de maçãs daquele país", explica a nota.
Qualidade da produção local em risco
Especialistas apontam os subsídios do governo chinês como aliado da guerra desleal de preços. Em caso de entrada da fruta estrangeira, o produtor brasileiro deve perder espaço e até falir, segundo Gabriel Leite, engenheiro agrônomo da Epagri:
- Pode ocorrer com a maçã o que aconteceu com a produção de alho brasileira na década de 1990. Quando houve a abertura para o mercado chinês, muitos agricultores tiveram que mudar de cultivo. Se a China puder vender para o Brasil, não tem discussão, os produtores daqui não terão chance de competir.
Mesmo sem a definição do governo federal sobre o começo da importação, as entidades que representam os produtores brasileiros já se adiantam sobre a possibilidade de controlar a forma de abertura.
- O Brasil é o único país livre da praga conhecida como traça-da-maçã. Com a introdução da maçã chinesa, essa praga pode ser reintroduzida nos nossos pomares. Queremos acompanhar os estudos que serão feitos para a abertura ao mercado da China - explica Pierre Nicolas Pérès, diretor-presidente da Associação Brasileira de Produtores de Maçã, que tem sede em Fraiburgo, na Serra.
OS NÚMEROS DA MAÇÃ
Produção em 2015 (em mil toneladas)
Brasil: 1.300
SC: 650
China: 40.000
Preço:
Caixa de 20kg de maçã chinesa - R$ 34 em média
Caixa com 18kg da maçã brasileira - entre R$20 e R$ 60, dependendo da época da colheita
Mais informações:
- Mais de 40 mil vagas de trabalho na colheita
- 50% da maçã brasileira sai de SC
- 75% dos produtores de maçã são de SC
- Em 2014, faturamento do setor chegou a R$ 2,1 bilhão com a comercialização da fruta in natura no mercado interno, mais US$ 32 milhões em exportações de maçãs frescas e US$ 22 milhões em exportações de suco de maçã
Cerca de 15% da produção catarinense é exportada para América do Sul, África e Europa