De acordo com os principais institutos de pesquisa locais, o economista Pedro Pablo Kuczynski ficaria em segundo lugar, e o ex-presidente social-democrata Alan García disputaria com o empresário César Acuña o terceiro. Nas projeções de segundo turno, ela também venceria - essa votação, se nenhum dos candidatos atingir 50% dos votos válidos - o que parece uma tendência -, ocorrerá em 5 de junho. Neste caso, a votação de Keiko subiria para 40% em média, tanto contra Pedro Pablo Kuczynski como contra Alan García ou César Acuña.
- Temos um dos menores níveis de dívida pública no mundo - disse ela em recente reunião com líderes empresariais na cidade de Paracas, no sul do país. - Quando você tem um momento de emergência, deve tomar medidas drásticas e importantes.
A economia do Peru, importante produtor mundial de minérios, cresceu em uma surpreendente média anual de mais de 6% entre 2003 e 2013. Esse crescimento, porém, caiu bastante em 2014, para 2,4%, uma vez que os preços do cobre e do ouro, as principais matérias-primas, recuaram - isso está ocorrendo de forma geral na América Latina. A previsão no Peru é de recuo, mas o crescimento ainda seria de algo como 2,8% em 2016.
Um período controverso da história peruana parece ensaiar o seu retorno na versão feminina, talvez apenas como paródia, mas ainda assim provocando inqiuetação. Mesmo que a repetição venha como farsa, tal qual preconizava (e certamente desejaria) Karl Marx, boa parcela da população peruana teme o revival de uma tragédia institucional de triste memória.
Em 4 de dezembro de 2015, Keiko Fujimori, filha do ex-presidente peruano preso Alberto Fujimori, lançou sua segunda candidatura à presidência do país e já de início mostrou a que viria: apresentou o projeto de utilizar os fundos emergenciais do Estado para reativar a economia do país, que cresce de forma acanhada.
O pai de Keiko foi preso por violações aos direitos humanos e outros escândalos durante seu governo, entre 1990 e 2000. Porém, o foco da candidata formada em administração de empresas na Boston University (com mestrado também em administração na Universidad de Columbia) é a economia. A centralização do poder promovida por Fujimori entra nos discursos dos adversários.
Keiko, 40 anos, cogita lançar mais títulos da dívida pública no mercado internacional e usar o fundo emergencial de US$ 10 bilhões para financiar a infraestrutura. São planos ousados, de quem aparece como favorita, mantendo mais de 30% das intenções de voto num eventual primeiro turno - marcado para 10 de abril.
Candidatura provoca debate de especialistas
Keiko tenta remover a imagem de neoliberal intransigente. Em depoimento depois de ter lançado a candidatura, disse apostar na formalidade do mercado de trabalho e no investimento público. Define o tipo de economia que quer implementar como "moderna, empreendedora e aberta".
Um dos aspectos que mais jogam a favor da candidata é o fato de romper a tradição masculina da política peruana. São raros os casos de mulheres que se aventuram a concorrer a cargos públicos. Em 2011, com um discurso mais claro de defesa do livre mercado para fazer contraponto ao esquerdista Ollanta Humala, ela chegou ao segundo turno, mas perdeu para o rival, o atual e moderado presidente peruano.
Keiko vive o dilema de manter a imagem aliada ao pai, que é a razão de ela estar na política e até tem seus seguidores, e, ao mesmo tempo, evitar uma proximidade ideológica que a prejudique. O país se divide entre essas duas pontas.
Por conta disso, um debate se instaurou: como seria o fujimorismo sob Keiko? O cientista político Antônio Jorge Ramalho, da Universidade de Brasília (UnB), identifica um contexto diferente:
- Quando Fujimori impôs um governo autoritário e excessivamente centralizador, havia a ameaça terrorista do Sendero Luminoso. Hoje, isso praticamente não existe. Não é uma questão do perfil político da candidata e do pai da candidata, mas do país que ele governou e que ela poderá governar se vencer as eleições.
Ramalho acrescenta que Humala faz um governo de programas sociais e responsabilidade fiscal, e que Keiko manterá essa linha, como Mauricio Macri na Argentina. Pesam as circunstâncias.
- Não há como voltar atrás nessas políticas sociais, em toda a América do Sul, não só no Peru.
O que pode se discutir é a saída dos programas assistenciais com a ascensão social dos beneficiados - entende o cientista político.
O analista político peruano César Hildebrandt identifica um afastamento oportunista de Keiko em relação à imagem do pai e diz não acreditar que ela, por exemplo, desse seguimento aos processos abertos contra o arbítrio do governo fujimorista. Define o discurso e os modos mais sofisticados da filha como uma "pantomima" e aposta que seu eventual governo retomará um estilo autoritário e será caracterizado pela corrupção.
- É a herdeira natural e jamais desmentida da década mais infame já vivida pelo Peru - diz ele.
Já o historiador peruano Antonio Zapata vê em Keiko o advento da direita liberal - não autoritária.
- É uma segunda geração, e vejo nela a intenção de implementar uma segunda etapa do fujimorismo, que é a segunda etapa marcada pela atuação de uma direita liberal - analisa ele, ressalvando que no Peru "há diversos tipos de direita" e que Alberto Fujimori tinha as características do autoritarismo político, liberalismo econômico e populismo. Na sua interpretação, Keiko traria consigo apenas o liberalismo econômico.
SOBRE ALBERTO FUJIMORI
Quem é o pai de Keiko?
O engenheiro agrônomo Alberto Kenya Fujimori, 77 anos, presidiu o Peru entre julho de 1990 e novembro de 2000. Seus documentos dizem que ele nasceu em Miraflores, distrito de Lima. Seus detratores, porém, contestam, alegando que seus pais chegaram do Japão com dois filhos - ele o irmão. Ele seria, então, japonês.
Que acusações pesam contra Fujimori?
Em 2000, Fujimori foi acusado de uma série de escândalos. Saiu do Peru como presidente para evento oficial em Brunei, renunciando e se asilando no Japão. Extraditado, em 2009 foi condenado a 25 anos de prisão. Respondeu por corrupção, enriquecimento ilícito, evasão de divisas e genocídio, com a morte de 25 ativistas de esquerda.
Onde ele está?
Em 2007, o presidente Alan Garcia lhe permitiu escolher uma cela de 800 metros quadrados, com sala de estudo, sala de jantar e até uma clínica com três enfermeiros, dois médicos e ambulância. Fruto de negociações políticas, passou a ter sala de visitas com ar condicionado, cadeira de massagens, TV, telefone e computadores. Sua área é exclusiva e tem 10 mil metros quadrados no presídio de Barbadillo, em Lima.
Como foi seu governo?
Ele dissolveu o Congresso, fechou o Poder Judiciário e o Ministério Público em colaboração com as forças armadas. Seus oponentes o acusam de autoritarismo. Além de ter fechado os outros poderes, Fujimori adotou medidas como a de mandar que fossem esterilizadas 200 mil mulheres indígenas peruanas.
Como foi o chamado "fujichoque" econômico?
Fujimori abrandou a legislação destinada ao setor privado. Os subsídios dos empregos públicos foram reduzidos e foram eliminados os controles de capitais e as restrições aos investimentos, às importações e ao fluxo de capitais. O desemprego chegou a 73%, e a inflação disparou a 50% mensais.