Você consegue imaginar uma escola sem sala para leitura? Ou colégios sem banheiros suficientes para todos os alunos? Santa Maria dezenas de estabelecimentos de ensino nessa situação. Os dados integram um levantamento que está sendo feito pelo projeto Ministério Público pela Educação (MPEduc), parceria entre os Ministérios Públicos (MP) Federal e Estadual.
O MPEduc tem abrangência nacional. No Estado, sete cidades participam. Em Santa Maria, ele foi implantado em junho deste ano e apresentado em audiência pública à comunidade. A fase atual é de coleta de dados. As informações servirão para fazer um diagnóstico da situação de cada escola e definir as ações a serem desenvolvidas para sanar os problemas.
O levantamento é feito por meio de um questionário online, com 151 questões sobre infraestrutura, aspecto pedagógico, transporte escolar, merenda, entre outros. As 118 escolas públicas de Santa Maria têm até o final do ano para responder. Até ontem, cem haviam participado _ 39 estaduais, 58 municipais e 3 federais.
Faltam servidores para cuidar das escolas em Santa Maria
Equipes do "Diário", da RBS TV e da Rádio Gaúcha analisaram as respostas em um trabalho conjunto e encontraram realidades diversas. Desde problemas estruturais bem visíveis até aspectos que influenciam diretamente no aprendizado dos alunos. Mas é ausência de itens básicos o que mais impressiona e surpreende nas respostas das direções, como o número insuficiente de sanitários para os alunos, por exemplo, relatado por 40 das cem escolas que responderam até o momento. No aspecto pedagógico, um terço das cem escolas contaram não ter uma sala destinada para leitura, e 16% do total informou não ter um livro por aluno na biblioteca.
_ A ideia é que possamos solucionar as questões por meio de recomendações, esperando que elas sejam cumpridas. Mas pode acontecer de não ser atendida. Aí, podemos partir para um Termo de Ajustamento de Conduta. Se tudo falhar, há a possibilidade de judicializar a questão, naqueles casos mais graves, em que percebermos que o diálogo não avança _ explica a procuradora da República Bruna Pfanffezeller.
Entre tantos problemas, a procuradora espera encontrar boas iniciativas.
_ O objetivo do projeto é, sim, constatar problemas, mas, também, dar voz à comunidade escolar para que iniciativas que deram certo possam ser replicadas para outras escolas _ afirma.
O resultado esperado é mais qualidade no ensino público e mais aprendizado. Uma boa notícia, levando-se em conta que 56,6% das escolas estaduais e municipais da cidade estão em situação de alerta em relação ao desempenho dos estudantes nos anos finais (do 5º ao 9º), conforme o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2013 (os dados deste ano ainda não estão disponíveis). Nos anos iniciais (1º ao 5º ano) o percentual é de 20,7% das instituições. O Ideb é o principal indicador da qualidade da educação básica no Brasil. O alerta significa que as escolas não atingiram as metas planejadas e precisam crescer.
Problemas estruturais são os mais recorrentes
A Escola Municipal de Ensino Fundamental Zenir Aita, no bairro Dom Antônio Reis, está entre as instituições que apresentam várias necessidades. A escola existe há 52 anos e nunca teve uma sala específica para os alunos lerem. Como alternativa, adotou o cantinho da leitura, onde ficam dispostos os livros nas salas de aula.
Escola e Secretaria Municipal de Educação, porém, têm visões diferentes sobre o método.
_ Não temos mais bibliotecas. Temos salas para leitura ou, dentro da proposta do ciclo de alfabetização, cantinhos de leitura. Não podemos determinar que haja um espaço específico, porque depende da realidade de cada escola e do projeto pedagógico que ela adota _ explica Vanessa Flores, supervisora da secretaria.
Para a coordenadora pedagógica da Zenir Aita, Margareti Possebon, o cantinho é uma forma criativa de driblar uma carência:
_ O nosso sonho seria uma biblioteca ampla, com livros maravilhosos, ar-condicionado, para que os alunos pudessem sair da rotina da sala de aula, fazer trabalhos de pesquisa e curtirem, cada vez mais, o momento de leitura.
No entanto, falta espaço físico para este e outros ambientes. Não há sala para professores, por exemplo. O encontro dos docentes ocorre na cozinha, e os escaninhos ficam na apertada sala de informática. Os cerca de 200 alunos também se revezam para utilizar os dois banheiros disponíveis. Média bem diferente da sugerida pelo MPEduc, de um banheiro para cada 30 alunos.
A prefeitura diz que conhece a realidade das escolas municipais e admite a precariedade da estrutura da Zenir Aita. Disse que já comprou a área vizinha para ampliar a instituição e busca na justiça a desocupação do terreno.
Enquanto isso, desde agosto, o vice-diretor, João Oliveira, usa as horas vagas para transformar a antiga casa do zelador em sala de leitura para as crianças. O espaço deve estar pronto no início do próximo ano letivo.