Quando a água do Arroio Cadena começou a invadir a casa de Bruna Medianeira Braga Silveira, 19 anos, ela não sabia o que salvar primeiro. Assim como ela, dezenas de moradores de uma área ocupada no bairro Urlândia estão entre os atingidos pelos temporais do início de outubro em Santa Maria.
Eles perderam roupas, alimentos e calçados. Muitos dos nomes constam em um cadastro feito pela prefeitura, que serve como guia para a distribuição das doações arrecadadas com a população.
Mas, na casa de Bruna, os donativos não chegaram. Pelo menos outros 16 moradores das ruas Nova e Travessa Alfredo Viana, no bairro Urlândia, dizem que receberam pouco ou nada dos donativos.
- A água foi subindo rápido e começou a molhar as coisas dentro de casa. Tentei salvar o básico, que foi erguer geladeira e algumas roupas. Meu colchão molhou. Estendi cobertores no lastro da cama até poder secar. Perdi bastante coisa. Vieram três vezes dar coisas aí, e eu não estava em casa. Depois, vieram, me cadastraram, só que, até hoje, não recebi nada. Sorte que a vizinhança ajuda bastante - conta a jovem.
Os moradores confirmam que a prefeitura esteve no local para fazer entregas, mas dizem que os dois caminhões foram saqueados por outros habitantes e que eles acabaram ficando sem os kits.
Dona Suzete Melo, 72, mora há 18 anos no local e é uma espécie de porta-voz da comunidade. Ela conta o que aconteceu:
- O que todo mundo perdeu aqui foi alimentação. Colchão, molhou tudo. A Defesa Civil esteve três vezes aqui. Eles (prefeitura) trouxeram as coisas, mas as pessoas invadiram o caminhão. Na segunda vez, vieram até com a polícia, mas não adiantou. Entraram no caminhão e tiraram para os parentes deles as coisas. Do primeiro caminhão, não recebemos nada. Do segundo, me deu acolchoadinho, um colchãozinho velho e uma sacola de comida, com arroz, feijão, açúcar e uma polentina. Quando ela (a pessoa do caminhão) estava dando produtos de limpeza, eles se avançaram e pegaram as caixas. Daí, eles foram embora.
O "Diário" foi a cinco vilas onde houve atingidos pelos temporais nas regiões sul e nordeste da cidade e falou com dezenas de moradores. Todos disseram que receberam donativos, mas a maioria não sabe dizer de quem. Alguns relataram que as entregas foram feitas por pessoas ligadas a igrejas, e outros, que foram integrantes da Base Aérea ou da Defesa Civil.
O cadastro das famílias atingidas foi feito por assistentes sociais da prefeitura que foram até as residências nas áreas atingidas. Elas contabilizaram e nominaram os moradores, descreveram as perdas e as necessidades.
A equipe que distribui os donativos, da qual fazem parte as assistentes, garantiu que esteve, por duas vezes, no bairro Urlândia e que entregou, de casa em casa, kits com roupas, calçados e material de higiene às famílias cadastradas. A equipe não confirmou os saques aos caminhões.
Seguem a arrecadação e as doações
A secretária de Habitação e Regularização Fundiária, Magali Marques da Rocha, informou que a equipe que trabalha no Centro Desportivo Municipal (CDM) ainda está recebendo e distribuindo donativos.
A prefeitura avalia um prédio que servirá como central de doações, no bairro Itararé. Depois de definido o local e transportados os donativos, as roupas e calçados devem ser higienizados. Parte ainda será doada e outra parte ficará como reserva para futuros casos de necessidade.
Conforme o último balanço, divulgado na semana passada, foram 10,5 toneladas de agasalhos e cobertores, 7 toneladas de alimentos, 450 kits de limpeza, 2,6 mil pares de calçados e 400 colchões. Num total de 520 famílias beneficiadas. Um novo levantamento deve ser feito nos próximos dias. Mas, de forma geral, as pessoas têm doado materiais de limpeza e roupas. A necessidade maior continua sendo de alimentos.