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Decreto que define desastre em Minas como natural provoca polêmica

Governo diz que medida não alivia a Samarco, mas subprocuradora da República avalia que mudança pode beneficiar mineradora

Guilherme Mazui / RBS Brasília

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Bruno Alencastro / Agencia RBS
Rompimento de barragem causou destruição no povoado de Paracatu de Baixo, no município de Mariana

Um decreto da presidente Dilma Rousseff suscitou polêmica sobre uma eventual brecha para que a mineradora Samarco tente se eximir da responsabilidade pela tragédia em Mariana (MG). Datada de 13 de novembro, a medida incluiu o rompimento de barragem, com danos a residências, na relação de desastres naturais para fins do saque do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) pelos atingidos.

O Ministério da Integração Nacional e a Casa Civil asseguram que o decreto não alivia a mineradora, parceria entre a brasileira Vale e a anglo-australiana BHP. No entanto, em audiência na Câmara, ontem, a subprocuradora da República Sandra Cureau apontou que a mudança pode beneficiar a Samarco. Se o rompimento da barragem do Fundão for considerado "desastre natural", a empresa tentaria se eximir da culpa pela tragédia.

- Vi com preocupação o decreto da presidente, porque isso pode ser usado pelos advogados da Samarco para que a responsabilidade da empresa seja mitigada - disse.

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O governo considera a catástrofe tecnológica e afirma que o decreto mudou apenas as regras para o uso do FGTS, no caso de pessoas que residam em cidades atingidas por desastres naturais que tiveram a situação de emergência ou estado de calamidade reconhecidos. O saque é opcional, no valor máximo de R$ R$ 6,2 mil.

Professores de Direito Ambiental ouvidos por ZH entendem que a Samarco dificilmente conseguiria fugir das punições com base apenas no decreto.

- O rompimento é oriundo da atividade econômica, então quem utiliza responde pela barragem. A empresa pode usar o argumento, mas seria uma vergonha ter êxito com base no decreto - diz Fernanda Medeiros, da PUCRS.

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Pós-doutor em Direito Ambiental e dos Desastres pela Universidade da Califórnia, Délton Winter de Carvalho estranha o fato de o governo equiparar o rompimento de uma barragem com enxurradas, vendavais e enchentes. Deve haver uma longa discussão nos tribunais sobre as causas do ocorrido.

- Se a empresa conseguir provar que houve um abalo sísmico antes do rompimento, como chegou a ser noticiado, há chance de diminuir a responsabilidade. A jurisprudência majoritária no Brasil não exclui a responsabilidade em casos de acidentes de atividade econômica - afirma Carvalho, que também é professor da Unisinos.

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Rômulo Sampaio, da FGV Direito Rio, considera que a Samarco teria "poucas chances" de sucesso ao usar o decreto para questionar punições administrativas, como as multas de R$ 250 milhões aplicadas pelo Ibama.

- Em desastre natural não há nexo de causa e efeito, a empresa poderia alegar que não teve culpa. Considero apenas o decreto um argumento frágil. A empresa teria de trazer outras provas para dizer que foi algo natural.

O decreto fez o deputado Jerônimo Goergen (PP-RS) formalizar questionamento à Casa Civil. Para o parlamentar, o governo se exime da responsabilidade e erra ao liberar o FGTS:

- Os trabalhadores que utilizarem o FGTS devem buscar o ressarcimento corrigido das despesas, pois é um fato causado pela atividade humana. As pessoas são punidas duas vezes.

No Planalto, o saque na conta do FGTS foi considerado uma maneira emergencial para socorrer as vítimas. A Advocacia-Geral da União (AGU) reúne dados para ajuizar ações contra os responsáveis pela tragédia a fim de exigir reparações pelo dano ambiental e pelas perdas das pessoas afetadas.

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