Aprovada em Comissão Especial da Câmara dos Deputados na terça-feira e encaminhada para votação no plenário do Congresso, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) sobre as terras indígenas afeta diretamente pelo menos 15 das áreas ainda não oficializadas em Santa Catarina, entre as 28 mapeadas pela Fundação Nacional do Índio (Funai) no Estado.
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Além do temor com a demora nos futuros reconhecimentos, já que a palavra final sobre as demarcações ficaria com deputados e senadores, a principal preocupação com o texto é a criação de um marco temporal para embasar os processos. A PEC estabelece que as áreas indígenas são apenas aquelas que atendiam aos requisitos legais em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da atual Constituição. O alerta é que isso abre precedente para revisões de locais em que a demarcação ainda não foi concluída e registrada, como a do Morro dos Cavalos, em Palhoça. Há também determinações que podem atingir todas as reservas, como a possibilidade de permuta e arrendamento de terras.
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Com parecer favorável dos 21 parlamentares da Comissão Especial, o relatório final passará agora por duas votações na Câmara e duas no Senado - sendo necessários votos de 308 deputados e 49 senadores para ser aprovado. A expectativa é de que a proposta vá ao plenário ainda neste ano, mas a data depende de reuniões e acordos com líderes de bancadas e as presidências das Casas. Opositores ao projeto também já garantiram que vão recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar a constitucionalidade da medida, o que deve atrasar a tramitação.
- Não somos contra os índios e essa PEC é a solução para os problemas deles no Brasil, dando uma condição de cidadania. Com a possibilidade de arrendamento, os indígenas terão renda para sobreviver. E mudamos o rito de demarcação porque hoje a Funai faz sozinha o papel de Executivo, Legislativo e Judiciário - diz o deputado federal catarinense Valdir Colatto (PMDB), membro da comissão especial, que tem também Celso Maldaner (PMDB) como representante do Estado.
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Órgãos como o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) consideraram o texto agressivo aos povos indígenas e a seus direitos originários. O receio é de instabilidade jurídica e política e agravamento da violência em disputas de fazendeiros e índios.
- É uma matéria por meio da qual a bancada ruralista no Congresso tem dois grandes objetivos: impedir e inviabilizar as demarcações no país e invadir e explorar as terras que estão na posse e sendo preservadas pelas aldeias. A consequência evidente disso é mais conflitos e mais violência cometida contra os povos. Pra nós, essa é a PEC da morte, do genocídio contra os índios - afirma o secretário-executivo do Cimi, Cleber Buzatto.
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Ainda antes da aprovação pela comissão, os três etnias indígenas que vivem em Santa Catarina - Xokleng Laklãnõ, Kaingang e Guarani -, divulgaram uma Carta Aberta à População em que repudiam declarações de que os povos indígenas do Estado estariam apoiando a proposta. A publicação cita falas do deputado Valdir Colatto, critica a defesa de interesses do agronegócio e destaca as dificuldades enfrentadas pelas tribos em busca de sobrevivência diante de ações como a construção de barragens, sem política pública que atenda também os indígenas nestes casos.
O posicionamento foi engrossado por outras manifestações ao longo da última semana, feitos pela Comissão Guarani Nhemonguetá, os acadêmicos do Curso de Licenciatura Intercultural Indígena e os estudantes universitários indígenas da Universidade Estadual de Londrina do Norte do Paraná.