A foto de um menino afogado em uma praia da Turquia após o naufrágio de duas embarcações com refugiados sírios gerou comoção na Europa, confrontada a uma pressão crescente para gerenciar a chegada de milhares de refugiados ao continente. As duas embarcações que naufragaram tinham saído da cidade turca de Bodrum com destino à ilha grega de Kos, porta de entrada da União Europeia. A guarda costeira turca foi alertada por gritos de passageiros dos barcos e conseguiram resgatar os corpos de 12 pessoas, entre eles o de um menino pequeno que jazia de bruços na praia.
Luiz Antônio Araujo: Ver, registrar e lembrar
A fotografia de um agente turco carregando o menino foi difundida por meios de comunicação e pelas redes sociais com a hashtag #KiyiyaVuranInsanlik (A humanidade é um fracasso, em turco). Jornais de toda a Europa repercutiram a comoção provocada pela imagem.
Na Espanha, o jornal El Mundo destacou que a foto "já faz parte do álbum migratório da infâmia", enquanto o El Periódico escreveu que a imagem ilustrava "o naufrágio da Europa". Para o britânico The Guardian, a foto resume "todo o horror e o drama humano vividos na costa europeia".
"Se imagens tão fortes quanto a de um menino sírio morto, arrastado pelas ondas, não mudarem a atitude da Europa frente aos refugiados, o que poderá fazê-lo?", questionou o The Independent.
Na Itália, o jornal La Repubblica reproduziu a imagem no Twitter, intitulando-a "Uma foto para calar o mundo".
Êxodo contínuo
Enquanto isso, milhares de refugiados conseguiam chegar à costa da Europa. Cerca de 4.500 pessoas chegaram nesta quarta-feira ao porto de Pireu, em Atenas, com o objetivo de continuar seu périplo rumo ao norte da Europa, em um novo episódio da grave crise migratória que divide os países europeus. Outros 3.000 puderam ser salvos pela guarda costeira italiana no Mediterrâneo nas últimas 24 horas.
Lesbos, assim como Kos, também no Egeu, se tornaram o porto de entrada na Europa de refugiados que fogem através da Turquia dos conflitos armados no Oriente Médio e na África. A maioria quer continuar viagem para o norte da Europa através dos Bálcãs, na crise migratória mais grave no continente desde a Segunda Guerra Mundial.
Desde o começo do ano, chegaram à Grécia 160.000 pessoas do total de cerca de 350.000 que, segundo se estima, teriam cruzado o Mediterrâneo, uma rota na qual morreram dois mil migrantes. Enquanto isso, na Hungria, um dos países de entrada para os migrantes que querem chegar à Alemanha, a tensão continua crescendo e duas mil pessoas permaneciam acampadas em frente à estação de Keleti depois que a polícia os impediu de entrar nos trens.
A tentativa dos migrantes de chegar à Alemanha se explica pela decisão do governo de Berlim de não devolver aos sírios o país por onde entraram na União Europeia, neste caso a Hungria, e examinar seus pedidos de asilo. Segundo as autoridades alemãs, na terça-feira, 3.709 pessoas sem visto chegaram ao país vindas de Áustria e Hungria, uma cifra recorde.
Viena elevou o tom nesta quarta-feira contra a decisão alemã, que vai contra os acordos de Dublin, segundo o qual o candidato a asilo deve apresentar seu pedido ao Estado-membro onde entrou pela primeira vez à União Europeia.
- Sempre adverti contra uma suspensão dos acordos de Dublin (...) Estamos vendo os efeitos agora - lamentou o ministro do Interior, Johanna Mikl-Leitner, em entrevista ao jornal Die Presse.
Para fazer frente à chegada de milhares de pessoas que fogem da guerra, da perseguição e da pobreza no Oriente Médio e na África, "o mais importante é levar paz e estabilidade", disse o primeiro-ministro, David Cameron.
- Não penso que a resposta seja receber mais e mais refugiados - afirmou, em declarações à BBC.
O risco de que esta crise ameace a liberdade de trânsito na UE, um dos maiores feitos da construção europeia, começa a surgir. A atual crise migratória está "destroçando" o espaço Schengen de livre circulação, afirmou o chefe da diplomacia eslovaca, Miroslav Lajcak. A implantação de uma resposta conjunta de todos os países europeia será o tema central de uma reunião, em 14 de setembro, entre os 28 países da União Europeia.
* AFP