Diante do anúncio de greve geral dos servidores, o governador José Ivo Sartori reagiu com uma ameaça: prometeu descontar os dias não trabalhados de quem cruzasse os braços.
A declaração do peemedebista foi criticada por lideranças sindicais e levantou dúvidas sobre a legalidade de um eventual corte do ponto, uma vez que o direito à greve é garantido pela Constituição Brasileira. Ainda que questionável, no entanto, a medida tem respaldo legal, segundo especialistas:
- Tecnicamente, é possível. Mas não acho que é recomendável, porque isso pode dificultar as negociações - analisa o professor de Direito Administrativo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) Juarez Freitas.
O precedente para o corte do ponto dos servidores nasceu da falta de uma legislação específica para a greve de servidores públicos. Desde 2010, o Supremo Tribunal Federal (STF) sugere que se aplique a Lei Geral da Greve, voltada à iniciativa privada, até que normas para o serviço público sejam regulamentadas.
- O artigo 7º da lei 7783/89 diz que, durante a greve, o contrato de trabalho dos empregados fica suspenso. E a suspensão, em direito do trabalho, significa que não há trabalho, não há salário e não há contagem do tempo de serviço - explica o advogado trabalhista e professor da UFRGS e da Unisinos Rodrigo Coimbra dos Santos.
Se a lei parece estar a favor de Sartori na punição dos servidores que paralisaram as atividades em protesto contra o parcelamento de salários e as medidas de ajuste fiscal do governo, por outro lado, ela pode ganhar outras interpretações caso o corte do ponto vá parar na Justiça. O professor de Direito Constitucional da UFRGS e da Fundação do Ministério Público (FMP) Eduardo Carrion destaca que há decisões judiciais divergentes para esse tipo de imbróglio.
- Já houve decisões que autorizam (o corte), mas outros entendem que, como há previsão constitucional, não seria permitido - reflete.
Um dos articuladores da paralisação, o Centro dos Professores do RS (CPERS) já conseguiu impedir o corte do ponto na Justiça em outra ocasião. Durante uma greve da categoria, em 2013, o desembargador Rui Portanova emitiu uma liminar proibindo o governo do Estado de realizar descontos no contracheque dos professores que aderiram à paralisação. O argumento do CPERS, aceito pelo magistrado, foi justamente a previsão constitucional do direito à greve.
Conforme os especialistas, no entanto, o mais comum é que o corte do ponto seja negociado antes de chegar à mesa do juiz. Em boa parte dos casos, a suspensão dos descontos no contracheque vira moeda de barganha dos trabalhadores para o fim da greve.