O drama da falta dágua que atinge pelo menos 10 mil famílias de 135 municípios do Oeste, Sul e Serra de Santa Catarina, especialmente em períodos de estiagem e seca, poderia ter chegado ao fim no ano passado se equipamentos para perfuração de 530 poços artesianos, que custaram R$ 16 milhões e foram adquiridos com verba do PAC, não estivessem parados. Isso por causa da falta de planejamento e da burocracia que impede a contratação de operadores para as máquinas. Convênios com os municípios são anunciados como solução para o problema.
Após a estiagem de 2011, uma das medidas apontadas para reduzir o impacto da falta dágua seria a criação de poços em áreas rurais de Santa Catarina. Em 2013, o governo federal lançou a licitação e adquiriu três conjuntos de máquinas de perfuração, compostos por quatro caminhões equipados com rotopneumática, compressor, motobomba, alojamento, munck, pipa e grupo gerador e ferramental. Os equipamentos foram entregues para o governo do Estado em maio de 2014. E aí o impasse começou: não havia na Secretaria de Agricultura do Estado quem os operasse. Hoje, mais de um ano depois, nenhum poço foi feito e a contratação de pessoal continua sem ser viabilizada.
Para o secretário de Agricultura de Santa Catarina, Moacir Sopelsa, uma série de entraves burocráticos contribuiu para o atraso no início da operação. Após o governo federal comprar as máquinas em 2013, o material foi repassado para o Estado no ano passado. Como era período pré-eleitoral, não teria sido possível fazer a contratação de operadores, vetada pela legislação. Já neste ano, quando assumiu a pasta, em fevereiro, o secretário afirma que pensou em contratar funcionários temporários para começar as operações, mas uma ação judicial que restringe a contratação dos chamados ACTs impediu a medida.
Convênios entre municípios ajuda
A alternativa então foi envolver os municípios que seriam beneficiados com os poços artesianos, a partir de convênios. O primeiro já foi feito. Por meio do Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento Econômico, Social e Meio Ambiente (Cidema), que reúne 21 prefeituras da Associação dos Municípios do Oeste de Santa Catarina, um dos três kits de operação entrará em operação em breve.
A iniciativa chamou a atenção dos municípios da região de Videira e Joaçaba, que demonstraram interesse. O problema, segundo Sopelsa, é que áreas rurais incialmente mapeadas poderiam ficar desassistidas caso a solução fosse restrita às parcerias com consórcios intermunicipais. Por esta razão, estaria em análise na assessoria jurídica da Secretaria de Agricultura a possibilidade de contratação de uma empresa para fazer a operação e a manutenção das máquinas que compõem um dos dois
kits restantes.
O convênio da Secretaria da Agricultura com o Cidema é válido por dois anos, prorrogável por mais dois. De acordo com o diretor-executivo do consórcio, Paulo Utzig, está sendo levantada a melhor forma de contratar os cinco funcionários necessários para operar os equipamentos, num prazo de 30 a 40 dias.
- Após a contratação, uma assembleia dos prefeitos vai definir o cronograma de trabalho - afirma Utzig.
Inicialmente, cada município será atendido em forma de rodízio. Cada um terá direito a dois poços.
O presidente do Cidema e prefeito de São Carlos, Cleomar Kuhn, disse que o convênio é uma boa forma de colocar as máquinas em operação e vai solucionar o problema de muitas famílias no interior dos municípios, barateando em 70% o custo de perfuração. Somente em São Carlos, cerca de 200 famílias serão beneficiadas.
Para o coordenador estadual da Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul (Fetraf-Sul), Alexandre Bergamin, a parceria é uma boa medida, mas chegou atrasada.
- Infelizmente a burocracia faz com que os benefícios não cheguem facilmente ao agricultor - lamenta, ao lembrar que a demanda dos poços é ainda uma reivindicação da estiagem de 2011.
Um drama que se repete no meio rural
Enquanto a solução da perfuração dos 530 poços não chega, as famílias que vivem sem acesso à água encanada no interior do Estado fazem verdadeiros malabarismos para garantir que esse item essencial chegue às casas em que vivem. A família Batista exemplifica bem esse contexto. Há um ano eles trocaram Chapecó pela comunidade de Tope da Serra, no interior de Planalto Alegre. Lá, Eloir Batista, 50 anos, a mulher, Verônica, 47, e a filha, Jociane Cristiana, 15, precisam buscar água de balde em um poço na vizinhança, localizado a 40 metros da casa de madeira onde vivem.
- São de 30 a 40 viagens por dia - afirma Jociane Batista, que está aposentado por problemas de saúde, carrega o recipiente de 15 litros, o que piora as dores nas costas. Mas é somente assim que a família consegue garantir a água para beber, tomar banho, lavar a louça, limpar a casa e matar a sede dos porcos e galinhas que criam.
- Ainda não me acostumei - diz Verônica, sobre a falta de um chuveiro para o banho.
Na tentativa de reverter o cenário, Batista tentou abrir poços com uma retroescavadeira, mas não teve êxito. Por isso a animação não foi contida quando soube que a comunidade em que mora está entre as selecionadas para receber um dos poços mapeados para Planalto Alegre. Além da localidade de Tope da Serra, a segunda perfuração deve ser feita na comunidade de Flor da Serra, beneficiando cerca de 50 famílias.