A crise financeira que atinge o Estado e ataca a saúde pública chegou ao Hospital Alcides Brum, em Santa Maria. Na manhã desta terça-feira, a provedoria do Complexo Hospitalar Doutor Astrogildo de Azevedo - que gerencia o Alcides Brum - e os médicos decidiram pela suspensão dos atendimentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O motivo: a não renovação do contrato com governo do Estado, que terminou em 13 de maio, e gerava um prejuízo mensal de R$ 500 mil ao hospital. O resultado: os outros dois hospitais da cidade que atendem pelo SUS, a Casa de Saúde e o Husm, ficarão ainda mais abarrotados. Para a solução: não há previsão.
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De acordo com o provedor do Hospital de Caridade, Pio Trevisan, a decisão não é definitiva, e a entidade está disposta ao diálogo. No entanto, por hora, não há possibilidade de oferecer novos atendimentos pelo SUS.
- O nosso contrato com o Estado é anual. Estivemos duas vezes na Secretaria de Saúde do Estado e deixamos uma proposta de renovação pelos mesmos valores do contrato anterior. O Estado contrapropôs com 40% a menos. Já tínhamos um prejuízo considerável e, com 40% a menos, tornou-se inviável. Como o Estado não se manifestou e estamos atendendo sem contrato há mais de 45 dias, chegamos à conclusão que suspenderíamos os atendimentos novos - disse Trevisan.
O problema estaria no valor repassado para cada AIH (Autorização de Internação Hospitalar), que é a ordem de internação do paciente.
- Eles baixaram o valor da AIH. Fizemos 690 consultas a mais e, ontem (segunda-feira), recebemos um e-mail do Estado dizendo que ultrapassamos o limite do valor e que eles não vão pagar - completou Trevisan.
Conforme a responsável pela 4ª Coordenadoria Regional de Saúde (4ª CRS), Lenir Pires da Rosa, a orientação é para que os pacientes do SUS sejam encaminhados para o Husm e para a Casa de Saúde.
- Eles recebiam uma AIH como de alta complexidade, mas eles não têm alta complexidade. Estamos batalhando para tentar habilitar os leitos de alta complexidade para o Alcides Brum. Estamos brigando por isso, mas eles não quiseram esperar. Não é culpa do Estado. Só que eles (hospital) não querem assinar (o contrato) como está. Vamos ter problemas, mas ainda temos o Husm e a Casa de Saúde. É uma situação preocupante, mas não é desesperadora - disse Lenir, que ainda aguarda por um acordo com o Hospital de Caridade.
Há duas semanas, os cardiologistas do Alcides Brum haviam parado o atendimento pelo SUS.
Nem filantropia, nem SUS
Desde o primeiro trimestre de 2014, o Hospital de Caridade deixou de ser uma entidade filantrópica. Na prática, o hospital parou de prestar 20% de seus atendimentos de forma gratuita - a condição para que mantivessem a filantropia.
A novela que envolvia a filantropia - benefício concedido pelo Ministério da Saúde que dá isenção de impostos em troca de atendimentos gratuitos - se arrastava no Hospital de Caridade há anos. Desde 1996, a instituição havia pedido a renovação do certificado de filantropia cinco vezes, a última em 2009. Em 2013, o Ministério da Saúde recusou a prestação de contas do Caridade. Em maio de 2013, a direção do hospital foi comunicada que poderia perder o certificado da filantropia em função da recusa das contas e ameaçou deixar de atender pelo SUS.
Em março de 2014, os conselheiros do Hospital de Caridade decidiram abrir mão da filantropia e dos benefícios a que instituição tinha direitos. Desde então, apenas o Hospital Alcides Brum, inaugurado em 2011, atendia pelo SUS.
Casa de Saúde preocupada. Husm, nem tanto
Quem irá arcar com a demanda de pacientes do Alcides Brum são os outros dois hospitais da cidade: o Hospital Universitário de Santa Maria (Husm) e a Casa de Saúde. Porém, as duas entidades já convivem com problemas como falta de repasses, salários atrasados, redução de horas extras e escassez de funcionários.
Segundo Rogério Carvalho, administrador da Associação Franciscana de Assistência a Saúde (Sefas), a Casa de Saúde não tem como garantir que conseguirá absorver os pacientes do Alcides Brum.
- Dentro da capacidade operacional da Casa de Saúde, vamos manter a mesma situação. Não sabemos se teremos condições. São 500 internações por mês e 100 cirurgias, fora 1,5 mil atendimentos de traumatologia e 500 de obstetrícia, 100% via SUS. Nossas internações clínicas estão com a capacidade máxima absorvida - explica Carvalho.
O Husm também demonstra preocupação com a situação apresentada. Porém, os números não chegam a assustar o diretor clínico do Husm, Larry Argenta:
- O Alcides Brum nunca funcionou a pleno. Se estava ruim, piora um pouco, mas não muito. Assumimos a oncologia integralmente, inclusive a parte do Caridade. Se ele (Alcides Brum) atendesse a média complexidade a pleno, desafogaria bastante. 910 consultas, por exemplo, são o nosso movimento em dois dias - argumentou Argenta.
EM NÚMEROS
Sem os atendimentos pelo SUS, o Hospital Alcides Brum deixará de realizar uma média mensal de 1.365 procedimentos de baixa e média complexidade, entre consultas, internações e cirurgias. O prejuízo do Complexo Hospitalar Doutor Astrogildo de Azevedo, que gerencia o Alcides Brum, chegava a R$ 500 mil por mês com os atendimentos via SUS
- 910 consultas
- 295 internações
- 160 cirurgias
COMO FICAM OS ATENDIMENTOS SUS
- Serão atendidos no Alcides Brum apenas os casos já agendados por usuários do SUS. Por exemplo, são 160 cirurgias que já estão agendadas para o mês de julho
- Orientação é de que os novos pacientes sigam procurando os postos de saúde e unidades básicas mais próximos
- Pacientes SUS que necessitam de novos atendimentos, encaminhados via Secretaria Municipal de Saúde, serão repassados para a Casa de Saúde ou para o Husm