A inflação dos últimos 12 meses, apurada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e divulgada na quarta-feira pelo IBGE, atingiu o maior patamar desde 2003: 8,47%. Porém, ao ir ao supermercado, o consumidor sente que, na prática, este índice é ainda maior.
Para mostrar que a percepção no bolso supera os números oficiais, o Diário Gaúcho comparou preços de produtos das mesmas marcas de três supermercados de Porto Alegre, levando em conta os valores praticados nos primeiros dez dias de junho de 2014 e de 2015. A base foram os encartes publicados no jornal.
Não deu outra: em cada três itens, dois aumentaram acima da inflação. Foram comparados preços de 20 itens. Destes, 14 tiveram acréscimo, sendo 13 acima dos 8,47%. Três se mantiveram iguais e três baixaram de valor. Para comprar os 20 itens em 2014, era preciso desembolsar R$ 84,92. Um ano depois, o valor subiu para R$ 93,33, um aumento de 10,3%.
Nesta avaliação, a bergamota poncã (51,2%) e a cenoura (36,5%) foram os produtos mais valorizados. Nos itens em alta, somente o café subiu abaixo do índice da inflação. De acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Econômicos (Dieese), neste ano a cesta básica está 10,33% mais cara do que em 2014.
Bergamota foi o produto com maior alta | Foto: Germano Rorato
Como defender-se dos aumentos
Substituir virou palavra de ordem para a auxiliar de cozinha Rosangela Barbosa, 42 anos, na hora de ir ao supermercado. Com o aumento do preço do tomate, por exemplo, ela o deixou de lado para comprar couve, repolho e alface. A carne bovina está perdendo espaço para o frango e a salsicha. A regra é não levar para casa o que subiu demais.
- Eu nem compro quando está muito caro - conta a moradora de Alvorada.
Rosangela admite que não abre mão da marca do sabão em pó, mas investe na troca de outros itens. Para driblar os aumentos, trocou o rancho do mês por pequenas compras. Como vai praticamente todos os dias ao supermercado, monitora os preços:
- Eu cuido o que está mais barato e, se vale a pena, faço estoque.
Para o economista da FEE Rodrigo de Sá, é fundamental que o consumidor esteja aberto a substituir produtos que tiveram um aumento maior:
- O consumidor deve pesquisar. Neste cenário de alta, a diferença entre os preços em locais diferentes tende a ser maior.
Cascata que corrói o bolso
O aumento de preços que chegou aos supermercados com tanta força faz parte de um efeito cascata, que começou com os reajustes da energia elétrica e dos combustíveis no começo do ano, avalia o economista da Fundação de Economia e Estatística (FEE) Rodrigo de Sá. Quanto maior a importância da energia elétrica e do transporte rodoviário na produção de um determinado item, maior é a pressão para que o seu preço aumente.
Rodrigo ainda pontua que, nos setores onde os sindicatos dos trabalhadores têm maior poder, há um aumento maior de salários, o que reflete no preço final do produto.
A professora do curso de Ciências Econômicas da Unisinos Simone Magalhães lembra que a falta de chuvas prejudicou a qualidade das pastagens, fazendo com que o boi engorde menos, um dos motivos para o aumento do preço da carne. Com os preços em elevação, o poder de compra das famílias despenca. Isso reduz vendas e produção e pode acarretar desemprego.
As previsões não são otimistas. Para Rodrigo, o cenário não indica que os aumentos irão desacelerar:
- Para um curto prazo, não há expectativa de que os preços vão parar de subir. A inflação deve encerrar o ano próxima a 8,5%.
*Diário Gaúcho