O confronto entre manifestantes e Polícia Rodoviária Federal (PRF) em Camaquã, na segunda-feira, é o segundo registrado no Estado em um período de três dias. Embora ambos tenham origem na causa nacional dos caminhoneiros, a principal diferença entre a manifestação de Três Cachoeiras - na sexta-feira - e a de Camaquã é que o protagonismo do último embate não cabe aos motoristas de caminhões.
Diferentemente do protesto que reuniu mais de 4 mil caminhoneiros no Litoral Norte, Camaquã juntou alguns caminhões, mas também carros, motos, bicicletas e tratores, muitos tratores, por sinal. O motivo é que, enquanto Três Cachoeiras é conhecida como a cidade dos caminhoneiros, por ter cerca de 700 moradores que estão no ramo, o polo de Camaquã é reconhecido por produzir cerca de 10% do arroz produzido no país.
- Apoiamos os caminhoneiros, porque também é a nossa causa. A alta do diesel elevou em 20% o custo da lavoura - explicou o vice-presidente da Associação dos Arrozeiros local, José Carlos Gross.
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A entidade foi uma das que ajudaram a orquestrar os mais de cem moradores que apoiaram a causa. Sindilojas, Acic e Sindicato Rural também incentivaram os associados a participar com tratores e carros ou a fechar as portas dos comércios durante a carreata que tomou as ruas da cidade durante a tarde de segunda.
- Os agricultores estão com o arroz pronto para ser colhido, mas não há caminhão para levar a produção da lavoura. Pediram nosso apoio, e resolvemos atender - esclareceu o presidente da Acic, José Leonardo.
Ele também admite que um dos objetivos era encerrar a mobilização na cidade.
- Tínhamos que fazer algo o mais rápido para acabar (com o protesto), que tem reivindicações justas, claro, mas que precisa ter um fim, e esse objetivo foi alcançado - acrescentou Leonardo.
O que ninguém assume e que todos, inclusive, criticam é o vandalismo que se seguiu após o término do chamado "movimento pacífico". Por volta das 16h30min, quando a passeata havia encerrado próximo ao pórtico de Camaquã, começou uma troca de agressões. De um lado, a PRF, com apoio do seu Batalhão de Choque e da Força Nacional, disparou bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha em direção à cidade. De outro, manifestantes revidaram com pedras e queima de pneus, arremessados contra a tropa, que estava na BR-116.
Para o comandante do 30º Batalhão da Brigada Militar, tenente-coronel Jorge Ferreira, cuja guarnição foi chamada para apoiar a PRF, faltou conversa por parte da PRF:
- Se tivesse havido mais conversação, com certeza poderíamos ter evitado essa guerra que acabou acontecendo.
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Moradores contam que a PRF avançou "sem necessidade", pois a rodovia não estava bloqueada no momento em que foram utilizadas as armas de efeito moral.
- Eles pediram que a rodovia fosse desbloqueada, e ela estava assim desde as 11h. Por que avançaram sobre a população, machucando até crianças e acertando casas? - questionou Thiago Pereira Rodrigues, que mostrou um dos cartuchos de gás lacrimogêneo que entrou pelo telhado do vizinho.
Caminhoneiro e morador de Camaquã, Guilherme Souza acredita que a mobilização tenha tomado grande proporção na cidade porque a PRF já havia investido contra a população na sexta-feira, inclusive com uso de spray de pimenta até em quem não era manifestante.
- O povo ficou indignado e reagiu, mas de forma pacífica. Os baderneiros não fazem parte do movimento - acrescentou Souza.
Ao lado de pelo menos mais 15 caminhoneiros, Souza seguiu paralisado em um posto de combustíveis, às margens da BR-116, em Camaquã, na tarde desta terça-feira. Mas sem bloqueios.
- Só vamos voltar a trabalhar quando o governo der respostas convincentes e não essa lei dos caminhoneiros, que beneficia apenas 10% dos caminhoneiros, só os maiores - defendeu.
Há quem admita que houve "patrocínio" de carne, cerveja e cachaça para os manifestantes, com dinheiro de empresas da região. Dois piquetes montados para refeições de caminhoneiros estrangeiros, inclusive, foram desmontados pela PRF. No entanto, a maioria nega e diz apenas que "um ajuda o outro". Em Três Cachoeiras, durante os protestos da semana passada, a prefeitura já havia oferecido almoço aos caminhoneiros.