Como toda cidade, Ibirubá tem seu personagem de estimação. É o Macaco, locutor de partidas imaginárias dos clássicos locais, como revela a edição deste sábado da série Beleza Interior, que apresenta figuras inusitadas e curiosidades de municípios gaúchos.
Todo baralho de tarô e toda cidadezinha do interior tem seu louco.
Alguém que fala alto nas esquinas, conversa com os postes, recolhe objetos perdidos, guarda os segredos mais tórridos. Aquele que tudo enxerga e nada fala.
Louco é um tipo alegre, irreverente, não necessariamente doente.
Ibirubá, município de 19 mil habitantes, distante 300 quilômetros da capital gaúcha, já escolheu seu personagem de estimação, seu porta-voz mambembe e folclórico, o Macaco.
- Viu o Macaco por aí?
- O Macaquinho?
- Sim, viu?
- Ele passou há pouco.
Macaquinho sempre passa. É o relógio dos lojistas, a referência da manhã e da tarde. Seu itinerário regula o expediente do comércio.
- Sei da hora do lanche quando ele atravessa a frente da loja - comenta Júlia Amaro, que trabalha na autoescola Jeremias.
Com um boné preto e sua calça furada, é um rapaz que não descansa um minuto, vive caminhando, assentado em bares, entretendo pombas, rindo à toa, assobiando árias esportivas.
- Mostra o que é a felicidade, o que é amar a vida sem preocupação. Tem toda a minha inveja - pontua Gabriela Castelli, 25 anos.
A irmã Viviane Castelli concorda:
- Não é o louco que nos incomoda, é o louco que nos devolve a saúde.
Macaquinho é o apelido de Luís Alfredo Pereira Lopes, 30 anos, locutor oficial das ruas do centro. Ele narra partidas imaginárias do clássico trepidante da liga municipal de futebol, Florestal versus Revelação. É um duelo infinito, borgeano. São horas ininterruptas de gols, pontapés, cartões amarelos e vermelhos, chutes na trave e descrições detalhadas das batalhas da várzea.
Tudo é gritado com um palito Gina na boca.
- É meu sistema de limpeza do som - explica.
Luís nunca olha para cima, ou enverga o pescoço ao céu. Não significa timidez; é parte de sua conduta profissional. Uma distração pode custar a fome do pai Pedro Campos. Varre as bocas-de-lobo com suas havaianas surradas à procura de latas. Recolhe 40 latinhas por dia, o que rende R$ 2,50, dinheiro suado do pão que leva para residência à noite.
- Como o corneteiro do sorvete, primeiro vem sua voz para depois chegar seu rosto - afirma o produtor Mauro Constantino.
Macaquinho é precavido. Não acredita em Deus, mas comparece na missa.
- Vá que Ele exista... Pelo menos o Tio me conhece. Mais fácil de me perdoar.
Decidido, ainda espera realizar sua maior aspiração: arrumar uma namorada e beijar na boca. E talvez seu sonho: andar de mãos dadas na praça.
- Não espero uma mulher bonita, e sim honesta, que não me dê guampa - confidencia.
- Macaco não tem a chave da cidade, mas a porta inteira. No final de semana, é meu marido localizá-lo que ele já se torna o nosso convidado para o churrasco. Isso é muito comum, ele é da família de todas as famílias - afirma Aline Fernandes, 34 anos.
Sobre sua loucura, Macaquinho não nega fogo:
- Normal é aquilo que nos acostumamos. E sou um costume do sol.
Não é que ele tem razão?