Ser respeitado ou odiado. Ouvir a mãe ser xingada por uma multidão, mas não responder. Encontrar a serenidade onde um turbilhão de emoções eclodem a todo momento. Decidir se tornar um árbitro de futebol pode ser considerado uma loucura, mas o fato é que, sem eles, não existiria futebol.
Nesta quarta-feira (11), é comemorado o Dia do Árbitro e, no Rio Grande do Sul, não foram poucos os profissionais que ganharam o reconhecimento não só do Estado e do País, mas do mundo. Ao longo das décadas, diferentes gerações se destacaram, desde o porto-alegrense Agomar Martins, nos anos 1960 e 1970, até o teutoniense Rafael Klein, que ingressou no quadro da Fifa neste ano.
A classe dos árbitros gaúchos tem uma qualidade diferenciada. E não é atoa. Os homens e mulheres do apito, aqui, são forjados na tensão, em um nível de exigência que só um Estado dividido pela dualidade de clássicos como Gre-Nal, Ca-Ju e Bra-Pel pode oferecer.
— O futebol gaúcho contribui muito para que os árbitros daqui tenham um aproveitamento de destaque a nível brasileiro, sul-americano e mundial. O nível de exigência, dos times, das torcidas, da imprensa, é muito grande. O Gre-Nal ajuda muito. E o Interior também tem a sua força, com muitos clássicos. Os nossos árbitros estão inseridos nesse contexto — avalia o atual presidente da Comissão Estadual de Árbitros de Futebol (Ceaf/RS) e ex-árbitro Leandro Vuaden.
Atualmente, a Federação Gaúcha de Futebol (FGF) tem 180 profissionais aptos a atuar, entre árbitros principais e assistentes (bandeirinhas). O número será atualizado até o final do ano que vem, quando deve ocorrer a formatura de novos profissionais credenciados pela entidade.
De acordo com Vuaden, na pré-inscrição para o curso, houve cerca de 500 interessados, quantidade que surpreendeu. As provas de classificação devem ocorrer até dezembro, e as aulas serão ministradas no próximo ano.
Novos talentos
E os árbitros que estão por vir já têm conterrâneos em quem se espelhar. Rafael Klein e Maíra Moreira, com 34 e 31 anos, respectivamente, são o presente e o futuro da arbitragem gaúcha. Eles ingressaram no quadro da Fifa em 2024 e, na terça-feira (10), fizeram os testes físicos para seguir com o escudo em 2025. Ambos foram aprovados, assim como Anderson Daronco e Rafael Alves, que já faziam parte do quadro da Fifa em outros anos.
Rafael Klein, assim como Maíra, é formado em Educação Física pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). O desejo pela arbitragem despertou a partir de um convite para apitar um torneio universitário.
— Me identifiquei com a arbitragem, até pelo senso de justiça e de disciplina que está relacionado com meu jeito de viver. Estar inserido no meio do futebol, que é algo que eu amo, me deixa muito feliz — descreve Klein.
Movida pelo paixão ao futebol e pela busca da representatividade feminina, Maíra conta que "bandeirar" é um sonho realizado.
— Juntou a minha paixão pelo esporte com essa curiosidade de arbitrar. Estou do 10º ano como profissional e quero trilhar uma grande jornada também com o escudo da Fifa — descreve.
A presença feminina pode ganhar uma nova expoente no Estado. Aos 31 anos, Andressa Hartmann, de São Paulo das Missões, tem figurado em campeonatos da FGF e tem potencial para aparecer nas escalas do Gauchão de 2025. Ela integra a Ceaf/RS desde 2018. A outra mulher apta a comandar uma partida pela FGF é Bruna Martins, de Soledade, de 28 anos, que é do curso de 2022 e tem trabalhado no Gauchão Feminino.
Desafios
Os anos passam, nomes diferentes surgem, mas os desafios permanecem. Ingorn Kronbauer, primeiro presidente do Sindicato dos Árbitros de Futebol do Estado do RS (Safergs), voltou a ocupar o cargo em 2023, 35 anos depois de ter sido o pioneiro. Para o futuro da atividade, ele pede que se avance na discussão sobre o regime de trabalho.
— Tu é mais cobrado como árbitro do que como funcionário de uma empresa. Acontece que várias partes envolvidas, como os clubes, não têm interesse em avançar nessa discussão. É uma matéria complexa, mas, se todo mundo quisesse, seria resolvido. Por exemplo, o árbitro deveria ter motorista. Ele vai daqui a Ijuí dirigindo, apita o jogo e volta. Eu trocava de carro de dois em dois anos por conta da quilometragem que fazia. Um árbitro ganha R$ 5 mil, R$ 6 mil para apitar um jogo. O jogador de futebol ganha R$ 1 milhão por mês — comenta o presidente e ex-árbitro.
Gaúchos no quadro da Fifa
Árbitros principais
Agomar Martins
Começou com partidas amadoras na década de 1950 e ficou conhecido pela estatura — ele tem 1m60cm — e pelo estilo enérgico de apitar. Chegou ao quadro da Fifa em 1968 e apitou 980 jogos na carreira, como a final do Brasileirão de 1972, entre Palmeiras e Botafogo, e 23 Gre-Nais.
Carlos Sérgio Rosa Martins
Foi o árbitro que mais apitou Gre-Nais, 27, no total. Integrou o quadro da Fifa na década de 1980. Nascido em Porto Alegre, começou no Gauchão de 1965 e, cinco anos depois, já era nome de partidas nacionais. Integrava os quadros da antiga Confederação Brasileira de Desportos.
Renato Marsiglia
Cria de Rio Grande, na Zona Sul, teve o auge da carreira nos anos 1990, com atuações que o levaram para a Copa do Mundo de 1994. Nos Estados Unidos, apitou duas partidas: Bélgica 1x0 Holanda, na fase de grupos, e Suécia 3x1 Arábia Saudita, nas oitavas de final. Depois de se aposentar dos gramados, integrou o quadro de debatedores do programa Sala de Redação.
Ivani de Gregori
Primeira mulher gaúcha a apitar com a insígnia da Fifa. Tornou-se árbitra em 1985 e entrou para o quadro da CBF em 1992. Três anos depois, estava respaldada pelo símbolo da entidade máxima do futebol. Nasceu em São João do Polêsine, na Região Central.
Carlos Eugênio Simon
Apitou três Copas do Mundo — feito repetido apenas pela assistente catarinense Neuza Inês Back —, representando o Brasil em 2002, 2006 e 2010. No currículo, tem seis finais de Brasileirão e seis de Copa do Brasil. Nasceu em Braga, no noroeste do Rio Grande do Sul.
Leandro Vuaden
Atualmente no comando da arbitragem gaúcha, Leandro Vuaden estreou em 1997 e se consagrou nos campos do RS. Somente na Série A do Gauchão apitou 14 finais. Foi eleito melhor árbitro do Brasileirão em 2011 e 2020 e carregou o escudo da Fifa por oito anos. É de Roca Sales, no Vale do Taquari.
Leonardo Gaciba
O pelotense começou na arbitragem profissional em 1993. Foi eleito o melhor árbitro do Brasileirão em 2005, 2006, 2007 e 2008. Ficou no quadro da Fifa de 2005 e 2009. Tornou-se chefe da arbitragem da CBF entre 2019 e 2021.
Anderson Daronco
O santa-mariense de 43 anos é um dos atuais representantes gaúchos no quadro da Fifa. Carrega o tão almejado escudo pelo 10º ano consecutivo. Reconhecido de longe pelo porte físico, Daronco já trabalhou nas principais competições do continente, inclusive, nas Eliminatórias da Copa do Mundo.
Rafael Klein
Natural de Teutônia, no Vale do Taquari, é um dos talentos reconhecidos de forma mais recente pela Fifa. Ingressou no quadro em 2024. Neste ano, também apitou o segundo jogo da final do Gauchão, entre Grêmio e Juventude. Aos 34 anos, deu início aos testes para se manter no quadro da Fifa em 2025.
Árbitros assistentes
José Carlos de Oliveira
Foi o primeiro bandeirinha gaúcho a ingressar no quadro da Fifa. Serviu de referência para quem veio anos depois, a exemplo de Altemir Hausmann.
Altemir Hausmann
Nascido em Estrela, no Vale do Taquari, tem a Copa do Mundo de 2010, na África do Sul, no currículo. Começou a apitar jogos internacionais, com o escudo da Fifa, em 2004. Foi eleito o melhor assistente do Brasileirão de 2012.
Rafael da Silva Alves
Representou o Brasil nas Olimpíadas de Paris. O bandeirinha é natural de Porto Alegre e deu início à carreira na arbitragem em 2006. É do quadro da Fifa desde 2020, no qual permanece até o momento, aos 41 anos.
Tatiana Jacques de Freitas
De Torres, no Litoral Norte, começou a apitar em 2007, nos campeonatos da Federação Gaúcha de Futebol. Com ascensão rápida, passou a integrar o quadro da Fifa em 2012.
Maíra Moreira
Natural de Cruz Alta, passou a apitar pela FGF em 2014. A insígnia da Fifa chegou em 2024. Aos 31 anos, está consolidada no futebol estadual e, aos poucos, alça voos cada vez maiores. Já iniciou os testes para se manter no quadro da Fifa em 2025.
Árbitro VAR
Daniel Nobre Bins
Aos 46 anos, é o único árbitro gaúcho credenciado para o VAR com o escudo da Fifa. Natural de Porto Alegre e atualmente em Passo Fundo, ingressou no quadro da FGF como árbitro de campo e, nos anos seguintes, elevou a atuação a nível nacional e internacional. Neste ano, fez parte da equipe de arbitragem da final da Copa América.
*Os nomes da lista acima foram repassados pela Safergs.