O basquete é um dos esportes que mais mobilizam comunidades do Brasil. Basta uma parede, um arco e uma bola para pessoas de qualquer idade se divertirem. Aos que se apaixonam por arremessos e dribles, jogar com frequência em uma quadra de verdade, com tabela e cesta com rede, é algo raro.
Crianças, adolescentes e jovens sem condições de atuar em algum clube ou que não têm na escola regular a chance de praticar a modalidade, costumam se reunir em praças para jogar basquete. A maioria alimenta a ideia de um dia ser profissional e, quem sabe, jogar na NBA.
Lucas Viana, 15 anos, é um exemplo disso. Morador de Alvorada, ele começou a praticar basquete há menos de um ano em uma praça da cidade e revela que o esporte transformou sua vida.
— O basquete envolve o trabalho em equipe e é um esporte que completa a pessoa. Ela pode estar se sentindo vazia, sem muita gente para conversar, mas, quando entra em quadra, isso acaba. Tudo de ruim na mente e os problemas são substituídos — comenta o jovem que almeja ser jogador profissional.
Lucas já é considerado um talento do basquete. Participou de peneiras em clubes em Porto Alegre e conseguiu passar em uma, mas não teve condições de arcar com os custos.
Foi então que ele foi apresentado ao Dunk Park, espaço dedicado a esse esporte, localizado no bairro Navegantes, em Porto Alegre. Lucas realizou um teste, chamou a atenção dos treinadores e ganhou uma bolsa que arca com a mensalidade dos treinos e o transporte.
— Isso faz diferença para a minha vida. Mudei minha alimentação, comecei a cuidar mais do meu corpo e me dedico 100% — complementa Lucas.
Também de Alvorada, Ruan Luka, 11 anos, foi outro jovem a conseguir uma bolsa no Dunk Park por mérito técnico, pouco tempo depois de começar a jogar. O pequeno atleta se destaca pelo drible e se inspira no armador Kyrie Irving, do Dallas Mavericks, como referência técnica no esporte. Inclusive, ele sonha em jogar na NBA.
Antes, eu tinha só um amigo que morava perto da minha casa. Comecei no basquete e agora tenho vários.
RUAN LUKA
jogador de 11 anos do Dunk Park
— Eu jogava futebol desde os seis anos. Um dia vi o Lucas treinando basquete e perguntei várias coisas para ele sobre o esporte. Antes, eu tinha só um amigo que morava perto da minha casa. Comecei no basquete e agora tenho vários que jogam comigo — conta Ruan, que atua na categoria Sub-12.
Tanto ele quanto Lucas jogam, atualmente, em campeonatos da Federação Gaúcha de Basquete (FGB) representando o Dunk Park, e treinam ao lado de mais de 75 crianças na escolinha. A maioria paga mensalidade, enquanto 15 delas — sem condições financeiras — recebem bolsa por destaque técnico.
Local onde tudo é sobre basquete
A estrutura do Dunk Park fica toda dentro de um galpão todo preto, localizado da rua Frederico Mentz, 1185, no Navegantes. Além das quadras e arquibancadas, o espaço traz variadas referências ao basquete — em especial à NBA —, um bar com telão e camisas penduradas.
De acordo com Anderson Wintter, 29 anos, idealizador do Dunk Park, o projeto oportuniza a prática do esporte a pessoas de todas as idades. Fundado em janeiro de 2021, o lugar já vem sendo considerado a "casa do basquete" na Capital. A proposta, explica Wintter, surgiu justamente da falta de um local que conseguisse unir a comunidade.
— A ideia é democratizar o esporte. Seja para a gurizada sem condições financeiras ou técnicas de jogar em um clube grande, seja para adultos com vontade de começar a praticar — conta o idealizador.
Wintter vive o basquete desde a infância. Cresceu praticando, mas parou para se dedicar à faculdade de Engenharia. No entanto, o amor pela modalidade o fez deixar a profissão de lado e buscar sonho por meio do projeto.
— Sempre me incomodou que Porto Alegre não tem uma equipe profissional. Um dos meus sonhos é conseguir entregar um time de basquete competitivo para a cidade — destaca.
Para isso, o foco inicial foi o investimento nas categorias de base.
Um espaço como esse daqui a gente só vê na América do Norte
MARCELO GOMES
treinador no Dunk Park
Para iniciar e manter o Dunk Park, ele contou com a ajuda de um amigo de longa data. Marcelo Gomes, 54 anos, foi jogador de basquete, árbitro internacional, primeiro instrutor da Federação Internacional de Basquete (Fiba) no Brasil e diretor da Confederação Brasileira de Basquete (CBB). Ele foi o primeiro técnico de Anderson no Lindóia Tênis Clube, de Porto Alegre.
— Meu contrato com a antiga empresa onde eu trabalhava acabou e eu acompanhava a caminhada do Anderson. Quando o vi iniciando o Dunk Park, me disponibilizei a ajudá-lo no que fosse necessário. Um espaço como esse daqui a gente só vê na América do Norte — diz Gomes.
Com 10 treinadores, sendo quatro dedicados exclusivamente às categorias de base, o espaço oferece aulas para os jovens e adultos. Além disso, aluga as quadras para jogos, tem espaço para confraternização e recebe fãs de basquete para acompanhar os jogos da NBA.
Instrumento de transformação social
Apesar do sonho de ter uma equipe profissional em Porto Alegre, o foco atual de Anderson e Marcelo é formar bons cidadãos por meio do basquete. Todos os alunos da escolinha — com crianças de 4 até 18 anos — são cobrados em apenas uma única coisa: ter bom desempenho nos estudos.
— O basquete profissional é a consequência. Acredito que o esporte é instrumento de transformação social. Não importa se o garoto vai ou não fazer carreira como atleta, mas quero que ele vire uma grande pessoa — afirma Wintter.
O Dunk Park quer entregar o esporte para as crianças que não têm condições de praticar com boa estrutura. O espaço tem parceria com o Instituto Geração Tricolor (IGT) há dois meses, e uma vez por mês 70 crianças do projeto social do Grêmio, vão até o Dunk Park para ter aulas de basquete.
A ideia é oportunizar o basquete para mais crianças. Desta forma, o projeto ajudará quem precisa e também consegue encontrar jovens talentos que possam ajudar futuramente no sonho de formar uma equipe profissional, ou até mesmo chegar a grandes clubes nas principais competições do Brasil.
— Meu desejo é ver estes jovens competindo no NBB ou na Liga das Américas. É um sonho que em uma década ou meia década pode acontecer — afirma Gomes.