Tudo começou com ele. O presidente do Vila Nova, Hugo Jorge Bravo, foi o primeiro a denunciar as suspeitas de manipulação de resultados. Depois de ouvir que um jogador foi aliciado e estava sendo ameaçado por apostadores, reuniu o máximo de provas possíveis e apresentou ao Ministério Público de Goiás (e é por isso que a Operação Penalidade Máxima é coordenada pelo órgão). Por telefone, o dirigente atendeu a reportagem de GZH e concedeu entrevista aos jornalistas Diori Vasconcelos, Luciano Perico e Rafael Diverio.
Como foram as primeiras denúncias?
Dois dias após o término da Série B, recebemos informações de que um atleta estava recebendo ameaças por ter se comprometido com apostadores. Procurei saber de onde vinham essas ameaças e identificamos a pessoa. Fizemos contato para produzir provas para levar ao MP investigar o grupo criminoso. Não vou admitir esse tipo de situação na nossa diretoria, que passa tanto sacrifício. Vimos que era uma aposta combinada com atletas de outras equipes, fizemos um relatório e apresentamos às autoridades.
O quanto ajudou o fato de ser policial militar para fazer a denúncia?
Tenho obrigação moral de agir, ainda mais no meu clube. Estamos acostumados com esse tipo de situação. Nossa política de Estado aqui é: bandido não tem vez. Em Goiás, bandido é reprimido, polícia não fica acuada. É uma cultura nossa. Trabalho combatendo organizações criminosas, já fui subchefe de inteligência da polícia. Enfrentamos os problemas de forma dura.
Essa não foi a primeira vez que o senhor fez denúncias desse tipo?
Já havia informado duas situações para autoridades. Mas como não consegui elementos concretos, sabia que se chegasse sem algo robusto, ficaria o dito pelo não dito.
Foi o mesmo grupo?
Não. São circunstâncias diferentes.
Quais foram?
Primeira vez que ouvi foi em 2020, com uma equipe goiana. A conversa, dentro de campo, era de que o jogo estava vendido. E, em 2021, em um jogo pela Copa Verde, disseram que um jogador deles tinha participado de aposta e que não deu certo, e eles estavam sendo ameaçados. Mas não consegui dar um passo a mais. Quando surgiu agora, achei uma veia melhor, reuni provas para fazer brilhar os olhos das pessoas.
Há outros casos que ainda não apareceram?
Com certeza. Acho que o Náutico foi vítima no ano passado e até agora não vi nada. E outras.
Quais?
No returno da Série B teve coisas que ocorreram de forma esquisita.
Imagino que tenha mais quadrilhas operando no Brasil?
Certamente tem. Com a repercussão que essa operação tem dado, com a chegada da Polícia Federal, talvez tenha deixado esse pessoal mais esperto e saiam do futebol. Depois, quando começarem as punições, vai aumentar.
Em que sua experiência policial ajudou na investigação?
Quando reuni as provas, conseguimos expor de forma estratégica para ver se conseguíamos mais situações. Tínhamos convicção que nossos atletas não tinham anuído e as apostas não ocorreram no Vila Nova. Dali por diante, apareceram os ruídos.
Como foi a conversa com os jogadores?
Minha conversa com eles foi no sentido de informar que descobri os fatos, e 99% do grupo nem sabia disso. Era um atleta que não vinha sendo relacionado, que tentou cooptar alguém e não conseguiu. Avisei que buscaríamos a punição dos envolvidos.
O jogador citado mostrou o diálogo que teve com o senhor.
Pois é, vi. Minha resposta vocês viram o jeito que foi: "Se vira, meu jovem. Por mim, você estava preso". É isso mesmo.
Como os clubes podem ajudar no combate à manipulação?
Trazer para o clube poder de polícia está errado. As autoridades precisam ter iniciativa, proatividade e investigar. Assim como tem as delegacias de violência doméstica, idoso, precisamos de outras iniciativas. A CBF, com o monitoramento, também. Todos têm de trabalhar.
Como tem visto as ações das autoridades?
Acho que o processo está caminhando bem. A suspensão preventiva deveria ocorrer. O STJD é rápido para punir dirigentes, clubes, pode agir nisso também com celeridade.
Alguns jogadores relataram que não sabiam que era ilegal tomar cartão, colocar para escanteio. O que pensa disso?
Não acredito em Papai Noel. É desmerecer nossa capacidade cognitiva alguém falar isso. Ninguém vai oferecer R$ 30 mil para receber o cartão e alguém achar que é certo. É claro que repercute na partida. Mesmo quando o time ganhar, poderia ter sido em uma vantagem maior. É claro que tem prejuízo desportivo.
O senhor foi ameaçado?
Primeiro, acredito na proteção divina. Segundo, estou acostumado a lidar com esse tipo de gente, há mais de 10 anos. As ameaças que recebi não foram do futebol e minha vida seguiu normal, de combate ao crime. Aqui no Estado, a polícia impera. Claro que podem atentar contra mim, é do meu ofício. O que falo é: tenho bons amigos. Se esse povo é ruim, meus amigos são 100 vezes pior. Se fizerem alguma coisa comigo, eles vão bater na porta deles. E não vão entregar ninguém vivo. Papai do Céu nos protege, abençoa, porque conhece nosso coração, sabe que é bom.
Essas denúncias mudaram seu jeito de ver e gostar de futebol?
Não muda porque são exceções. O que ficamos aflito para que não crie proporções maiores. Tem de fiscalizar, regulamentar as casas esportivas, que também são vítimas. E me refiro também a fins fiscalizatórios, não só a tributação. De minha parte, mesmo essas situações não me tiraram o prazer de ver um jogo de futebol.