Lucas Rabelo abriu a temporada de 2022 como uma das maiores afirmações do skate brasileiro, mas uma lesão no ligamento cruzado anterior (LCA) do joelho esquerdo o impediu de ter um ano do jeito que ele queria. Antes de se machucar, o cearense radicado em Porto Alegre foi vice-campeão do Super Crown da Street League Skateboarding (SLS) — evento que é reconhecido no meio como um campeonato mundial —, campeão pan-americano júnior na Colômbia, em 2021, e campeão do STU National, também em 2021.
Agora, no próximo final de semana, andará pela primeira vez em um campeonato na pista da orla do Guaíba, a maior da América Latina. Depois de disputar o Mundial, nos Emirados Árabes, e ser quinto colocado na primeira etapa do STU National, em Criciúma, tentará voltar ao alto do pódio em Porto Alegre, terra que o acolheu aos 13 anos. Nascido no bairro do Pirambú, em Fortaleza, uma região pobre e que segundo o IBGE é a terceira maior favela do Nordeste e a sétima do país, veio à Capital a convite do seu atual empresário.
Mas para um adolescente deixar sua cidade natal, atravessar o Brasil e ainda encarar o frio, a tarefa não foi nada fácil. Apegado à família e acostumado com o calor, enfrentou dificuldades para se adaptar à cidade gaúcha. Aos 24 anos, ele lembra que o plano inicial era que ele morasse no Sul por um período de seis meses e depois fosse visitar seus familiares no Ceará.
Em preparação ao campeonato do próximo final de semana, Lucas Rabelo conversou com os veículos do Grupo RBS sobre a competição, as expectativas para o ano de 2023 e o sonho de disputar as Olimpíadas de Paris, em 2024.
Como tem sido esse teu começo de temporada?
Estou me sentindo bem demais, confiante, meu joelho 100%, não deixei a vibe cair em nenhum momento, espero andar muito de skate neste ano, sentir o vento na cara, aprender muitas manobras, me destacar e aproveitar.
Você falou em "vento na cara", como está essa sensação?
É indescritível poder subir no skate, acertar manobras, só de embalar o skate e sentir o vento já é maravilhoso. Eu estava sentindo muita falta disso.
Em 2021, você teve uma grande temporada, foi vice-campeão mundial, vivia teu melhor na carreira, o que dá para projetar para 2023? Até porque no ano que vem já tem Olimpíada.
Olha, 2021 foi muito bom, foi muito marcante. É não deixar aquele feeling, que eu ainda tenho, que eu sinto, aquela energia e a vontade de querer. É não deixar isso morrer dentro de mim para esse ano e pro ano que vem. É ter a mesma determinação para alcançar os meus objetivos.
Como foi lidar com a lesão no ligamento em meio ao momento que tu estava no teu melhor momento na carreira?
É muito difícil, ter que se manter muito centrado, né? Eu fiz isso a minha vida toda, andando de manhã, de tarde, de noite e do nada fui do skate para a fisioterapia. Ainda tenho, inclusive. Faço o dia todo. Parece que tive que largar o skate da minha mente. Mas foi complicado. Jogava videogame, tentava me distrair com a família. Eu ficava meio perdido, sentia muita falta. É ruim me machucar, mas tu também consegue abrir a mente, pensar em manobras diferentes.
Tu és um cearense radicado em Porto Alegre, e será a primeira vez que tu compete aqui. Como é pra ti disputar um campeonato na Capital?
É incrível demais, me sinto muito em casa. Nasci em Fortaleza, mas sou 50% de cada lugar, me sinto um pouco gaúcho. Todo mundo me acolheu bem, construí uma família maravilhosa, muitos amigos. Poder estar aqui, competir nessa pista incrível, é muito importante para mim.
Sair de casa com 13 anos e atravessar o país deve ter sido complicado para ti. Qual foi tua maior dificuldade?
No começo, foi complicado. Sempre fui muito apegado à minha avó, ela meio que não gostou da situação no começo, mas via que eu era apaixonado pelo skate. Então, ela foi cedendo aos poucos. Meu empresário, Rafael, foi conversar com ela e minha família, e ela foi aceitando. Teve a questão de adaptação, isso foi melhorando, família diferente, pista diferente, clima diferente, comida foi complicado. Fui gostando muito da cidade, até pela forma como fui tratado, fui sendo cada vez mais feliz.
Em uma entrevista, você disse que teu pai andou de skate contigo quando tu era bebê. Tu perdeu ele muito cedo, quão importante pra ti é andar de skate como forma de homenagear ele?
Eu não conheci muito bem meu pai. Escutei essa história da minha mãe. Isso foi uma das primeiras coisas que ele fez comigo, subiu no skate e começou a embalar. É gratificante poder carregar o que ele amava fazer, porque eu também amo fazer.
Você falou de poder andar com torcida aqui em Porto Alegre. Comenta um pouco sobre a pista aqui da cidade? O quão importante é isso para o crescimento da cena de skate por aqui?
Porto Alegre sempre foi muito visada pelo skate, até pelo IAPI. Agora, com essa pista, os olhares foram maiores. Com essa pista, pelo nível que é, tu consegue demonstrar o teu skate. As pessoas conseguem enxergar isso, abre mais portas. Poder andar de skate aqui é muito bom.
O que dá para esperar do Lucas aqui no STU?
Eu estou me sentindo super bem, dá para brigar por um pódio. Podem esperar muito skate. O que me deixa confortável é que me sinto muito bem, é só fazer o que eu fiz durante toda a minha vida.
O sonho de todo atleta é disputar uma Olimpíada. Como está isso para ti?
Enorme. Depois que o skate entrou nos Jogos, isso virou meu sonho. Quero muito, vou batalhar muito para isso. Vou focar muito para isso acontecer. Acho que não tem sensação melhor para qualquer atleta do que representar meu país e o skate. Quero mostrar que independente da cidade, do bairro, tem muita qualidade no skate brasileiro.
Como tu vê essa nova geração do skate brasileiro? Exemplos não faltam, tem a Rayssa Leal, a Raicca Ventura, o Japinha (Augusto Akio)...
Acredito que está sendo muito legal, um acaba puxando o outro. Você vê a Rayssa no street, o nível que ela está puxando, as manobras diferentes, eu mesmo olho e vejo a qualidade. Poder estar junto com ela, aprender com ela. No park, tem a Raicca, o Augusto que você falou, estão sempre puxando para cima e não deixando a essência cair.