No vestiário do Estádio Colosso da Lagoa, em Erechim, Francisco Lodi conta a história de Davi e Golias. Aos 33 anos, ele é o presidente do clube Soledade. Depois de trabalhar como empresário de futebol, decidiu ir para o outro lado do balcão em sua cidade natal. Por ter atuado muitas vezes no mercado sul-americano, levou à região central do Rio Grande do Sul nada menos do que sete colombianos. Alguns deles ouvem Lodi narrar a fábula bíblica.
— Eles são os gigantes, mas, se estivermos juntos, concentrados e unidos, podemos derrotá-los — fala, quase aos gritos.
Eles, a quem se refere Lodi, é o Ypiranga. Integrante da Série C nacional, o clube de Erechim é o grande da Copa Wianey Carlet. Está recebendo o Soledade em um jogo disputado no início da competição. Soledade que recém começou a fazer futebol profissional — é um dos menores clubes da competição no quesito tradição. Por isso, o discurso funciona. Corresponde à realidade.
Depois da oração, dos gritos de guerra e da palavra final, os jogadores sobem o túnel. O barulho das travas das chuteiras chocando-se com os degraus forma uma sinfonia. Quando entram em campo, as arquibancadas à frente e atrás dos gols estão absolutamente vazias. Só há torcedores no pavilhão, atrás das casamatas. Tem mais gente do lado de dentro do que de fora do alambrado. O borderô informa: 10 ingressos foram vendidos.
A esperança, o discurso, a expectativa — nada foi suficiente. Em Erechim, Golias venceu Davi. Por 5 a 0.
O resultado abate. Lodi está triste, revoltado. Conversa com os colegas e com o técnico Luiz Eduardo. A experiência do treinador lhe tranquiliza. O foco não pode ser perdido. O clube-empresa, que não revela quanto investe em futebol mensalmente, ainda tem um longo caminho a percorrer.
O primeiro é a reconstrução, principalmente do fator psicológico dos jogadores. Funcionou. Ao longo da competição, o time se ajeitou e conseguiu classificação para a segunda fase.
— Somos um clube formador, queremos revelar jogadores, dar um futuro para eles. Mas também temos objetivos esportivos. Queremos subir, jogar Primeira Divisão, ir para campeonatos nacionais. Sonhamos alto — diz Lodi.
No Real, o cenário é parecido. Das categorias de base, o time de cores amarela a azul (por causa do sol e, vá lá, da água do litoral gaúcho) resolveu apostar no profissional. E criou uma estrutura superior à da maioria das equipes do Interior. Durante o ano, uma pousada em Capão da Canoa converte-se em sede administrativa e concentração dos jogadores. No verão, recebe centenas de turistas.
Além de treinos em diferentes campos do balneário, há parceria com uma academia para os trabalhos específicos. Os jogadores também têm aulas de inglês e podem frequentar cultos da Igreja Evangélica. Enquanto um estádio da cidade não recebe as licenças finais para obras, mandam suas partidas em Tramandaí, no Módulo Esportivo.
— A comunidade comprou nossa ideia. Quando tivermos a nossa casa, certamente receberemos grandes públicos e atrairemos ainda mais jogadores e investimentos — avisa o presidente Eduardo Sena.
Ele tem esperanças. Como Lodi, como o Soledade, como todos aqueles que, disputando a Copa Wianey Carlet, são os sobreviventes do futebol gaúcho.