Quanto tempo leva para cicatrizar uma ferida na alma? Qual é a distância que separa o fracasso da glória? Para Alex Pires, foram necessários 217 dias e 42,195 quilômetros para a sua redenção.
No último domingo, o gaúcho de Sapiranga conquistou o ouro no Campeonato Mundial de Maratona do Comitê Paraolímpico Internacional. A vitória em Londres na prova que reuniu atletas das classes T45/46 (com encurtamento ou amputação dos braços) foi o "dia do alívio" para o gaúcho de Sapiranga, que sete meses antes havia experimentado o que classificou como o "pior dia" de seus 26 anos de vida.
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Em 18 de setembro de 2016, Alex alinhava entre os favoritos da maratona dos Jogos do Rio 2016. Prata na prova no Mundial do ano anterior, disputada também na capital britânica, o atleta da Sogipa era uma das grandes apostas de medalha do Comitê Paraolímpico Brasileiro.
Depois de superar uma lesão no calcanhar de Aquiles do pé esquerdo e uma virose que derrubou sua imunidade semanas antes do início da Paraolimpíada, o gaúcho estava em segundo lugar na maratona, próximo do líder, um fundista chinês, quando começou a sofrer com o calor carioca – os termômetros marcavam 38ºC.
– Passei a não sentir mais as pernas. Por duas vezes, parei para alongar. Só pensava: "Não posso desistir, não posso desistir". Mas chegou ao ponto em que não sabia mais o que estava fazendo, não conseguia nem caminhar – lembra Alex.
A frustração de deixar a disputa no km 24 foi ainda maior porque, pela primeira vez, o atleta conseguira levar a família para acompanhar de perto seu desempenho em uma prova tão importante – estavam na torcida a mulher, o pai, irmão, tios e sobrinhos.
Nada melhor do que o primeiro ouro em Mundial para superar a decepção. O curioso é que a prova londrina foi apenas a quinta maratona disputada por Alex desde que ele participou de sua primeira competição, em 2007, uma rústica de 2.400m em Sapiranga para corredores até 18 anos. Até recentemente, a especialidade dele eram os 800, os 1.500 e os 5.000, provas que já haviam lhe rendido outras quatro medalhas em Mundiais (três pratas e um bronze).
Com encurtamento no braço esquerdo, uma deficiência só descoberta pelos pais aos oito anos – consequência de uma trauma no ombro, possivelmente durante o parto, que impediu o desenvolvimento normal do membro –, Alex tem limitações de movimentos que afetam a coordenação e o equilíbrio ao correr.
Apesar dessa desvantagem, o atleta já superou corredores sem deficiência. No ano passado, em Barcelona, foi o primeiro colocado em sua classe e o 20º na classificação geral, o melhor brasileiro na maratona.
Prestes a renovar o Bolsa-Pódio, benefício do Ministério do Esporte que lhe rende R$ 15 mil mensais, Alex Pires já traça planos para 2020. A ambição do atleta é conquistar a primeira medalha paraolímpica. Só então o gaúcho irá em busca de outra meta: competir em uma edição dos Jogos Olímpicos. Para tanto, calcula em baixar pelo menos oito minutos sua melhor marca para entrar na briga pela concorrida vaga.
– A medalha em uma Olimpíada para mim será participar dela – sonha.
*ZHESPORTES