Primeiro ginasta brasileiro a subir ao topo do pódio olímpico, Arthur Zanetti já planeja fazer história outra vez. Recuperado de uma cirurgia para corrigir o rompimento de um tendão no ombro esquerdo, procedimento ao qual foi submetido pouco dias depois de ter conquistado a prata no Rio 2016, já treina de olho em Tóquio 2020.
Nos Jogos do Japão, o paulista de 26 anos sonha em conquistar sua terceira medalha olímpica, feito ainda inédito nas argolas, um dos aparelhos mais desafiadores da ginástica artística.
Nesta segunda-feira, o campeão olímpico em Londres 2012 esteve em Porto Alegre para participar da reinauguração do ginásio de ginástica da Sogipa, que foi reformado e recebeu equipamentos fabricados na Alemanha, com investimento de R$ 2 milhões.
Ao subir a rampa do prédio, Zanetti lembrou de sua primeira e até então única visita ao clube. Em 2006, então com 16 anos, o atleta disputou um campeonato infanto-juvenil na Capital. Por apenas 0.016, não levou o ouro no individual geral. Tudo por causa de uma queda no último aparelho, o salto. O título ficou com Sérgio Sasaki, atual colega de seleção brasileira.
– Até hoje ele faz gozações comigo por causa daquela prova – diverte-se Zanetti, cercado por ginastas mirins do clube.
Em meia hora de conversa com ZH, o atleta só fechou o semblante ao comentar a falta de aproveitamento da estrutura dos Jogos do Rio. Leia os principais trechos.
Como foi a sua recuperação da cirurgia no ombro esquerdo? Você já está pronto para as competições?
Foram quatro meses difíceis. Você não treina, algo que eu gosto e faz parte da minha rotina. Fiquei afastado dos ginásios. Depois, acabei indo aos ginásios para fazer fisioterapia, uma parte bem delicada do tratamento, de muita repetição. Mas segui todas as orientações, e agora o ombro está zerado. Já voltei a treinar, a fazer todos os aparelhos. O primeiro dia já foi porrada.
Você ficou com alguma sequela da cirurgia, algo que o incomoda ainda?
Nada, pelo contrário. A recuperação foi até um pouco melhor do que a mesma cirurgia que havia feito no ombro direito (após Londres 2012). No ombro direito, ainda sentia dores após a cirurgia. Agora, não. Acordei da cirurgia e não senti dor. O tempo de recuperação foi o mesmo, mas um pouco menos dolorida.
O problema no ombro afetou seu desempenho na Olimpíada?
Tive de tomar anti-inflamatório, foi aplicado no local da lesão. Era uma dor que estava me limitando nos treinos. Mas depois consegui treinar normalmente, e o resultado (prata nos Jogos do Rio) tinha de ser esse mesmo. Dei o meu máximo, fiz toda a preparação perfeita, mas o grego (Eleftherios Petrounias, ouro na Olimpíada) mereceu mais. Ele provavelmente fez um preparação um pouco melhor e por isso ficou em primeiro lugar, bem merecido. Foi o momento dele.
Quanto peso você ganhou durante o seu tratamento?
Quando saí de férias e voltei aos treinos, engordei oito quilos. Saí com 61kg da Olimpíada e voltei aos treinos com 69kg. Dei um engordada legal... Mas praticamente já voltei ao peso normal de treinamento, na faixa de 63kg.
Você deve ter comido muita coisa que estava proibido...
Tudo o que eu tinha vontade. Doces, pizza, churrasco, refrigerante. Tem uma esfiha? Quero uma esfiha também. Tudo o que não podia aproveitei esse período para comer. Parecia que estava carregando uma geladeira nas costas. Quando passou todas aquele estresse de competição, senti um alívio que acabou, já estava bem desgastado. Até mesmo na Vila Olímpica, tinha doces maravilhosos, brigadeiros, beijinhos, bicho de pé, e a gente passava pelas geladeiras e não podia pegar. No último dia, quando acabou, ainda pensei: "Só falta voltar para a vila e não ter aqueles doces". Pelo contrário, tinha os três. Peguei duas colheradas de cada, botei no pote e mandei uma foto para a nutricionista.
Você está iniciando o seu terceiro ciclo olímpico. No primeiro deles, para os Jogos de Londres 2012, você era um ginasta emergente. No segundo, encerrado no Rio 2016, já era um atleta consagrado. E, agora, em que condição você entra nesse novo ciclo?
O início desse ciclo é um pouco mais delicado pelas várias mudanças na ginástica (nova regras do código de pontuação, com a redução do número de grupos de exercícios na série e das notas em meio ponto). O mundo todo está se adequando, então acredito que ninguém vai apresentar alguma novidade (nas séries) nesse primeiro ano. Vários atletas também estão se recuperando de cirurgia ou então fazendo cirurgia em 2017, que é um ano um pouco mais tranquilo, pós-olímpico. É um ano em que vou tentar me adaptar ao novo código e ver como o corpo vai reagir à cirurgia. Porque no treinamento está tudo certo, mas na competição pode reagir diferente.
Neste ano você vai fazer uma mudança importante na série?
Não, por enquanto serão feitos apenas ajustes. Mas o meu objetivo nesse ciclo é mudar a minha série, com um grau de dificuldade um pouco maior.
Qual é sua meta para 2017?
Volto a competir em maio, na Copa do Mundo, mas a prioridade é o Mundial do Canadá, em agosto. Vou traçar a meta para o Mundial depois dessas duas etapas, na Croácia e na Eslovênia.
O que se pode esperar da ginástica brasileira daqui para frente, depois do resultado histórico no Rio?
O resultado no Rio foi excelente. Um país conseguir três medalhas olímpicas (além da medalha de Zanetti, Diego Hypolito e Arthur Nory ganharam prata e bronze no solo, respectivamente) não é fácil. Os atletas que já estavam antigamente (na seleção) ainda são novos. Então provavelmente são atletas que vão continuar nesse ciclo. E a nova geração, atletas que acabaram de sair do juvenil e já estão no adulto, estão com nível de ginástica muito bom. A gente já vê dois, três atletas que podem representar o Brasil em 2020.
Como você avalia o legado da Olimpíada do Rio?
É triste, né? Na ginástica, não teve nenhum legado. O legado que poderia ter é do aparelhos que foram utilizados, aparelhos praticamente novos. Esses aparelhos estavam com 70% de desconto, e ninguém comprou. Então a gente perdeu uma oportunidade de equipar outros ginásios dentro do Brasil. E havia promessa de que esses aparelhos iriam ficar. A gente vê a situação do Parque Olímpico, em algumas reportagens, as piscinas estão com a água de chuva. É bem triste. Olha o tanto de dinheiro que foi gasto para ficar abandonado. São aparelhos de primeira linha, são estruturas fantásticas, que têm de ser aproveitadas.
*ZHESPORTES