Que fiquem claras três ressalvas antes de eu discorrer a respeito do tema controverso sobre o qual vou tratar: sou (muito) gremista, sei que me oporei a um avassalador senso comum e não me perfilo entre aqueles jornalistas que adotam a polêmica como a essência do seu trabalho. O que direi será por pura convicção.
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Pois então, aqui vai: sou contra o rebaixamento de clubes tradicionais ou, pelo menos, o descenso conforme as regras atuais. Sei que 99% dos leitores torceram o nariz para mim neste momento. Por que minha primeira ressalva foi de que sou gremista? Porque são os colorados que vivem o risco de cair.
Mas, evidentemente, não falo do Inter. Falo de todos, incluindo do Vasco, cuja ausência empobrece a Série A. O modelo brasileiro de rebaixamento é tosco e quase tão hipócrita quanto a Lei Pelé, aquele cipoal de normas daninhas aos clubes. Talvez tão hipócrita quanto os torneios que premiam perdedores, como a Copa Sul-Americana, aberração capaz de dar acesso a um título continental para o 10º colocado do Brasileirão.
Mas ok. Vamos aos argumentos. Primeiro, nossos clubes não são empresas. Dizer isso é tão profundo quanto a música do Luan Santana. Devem ser administrados com gestão profissional? Claro. Mas isso é diferente. O dono dessas grandes instituições culturais e de alto apelo público não é o presidente de turno, por vezes um aventureiro. São seus milhões de apaixonados. Outra: dizem que o rebaixamento evita a mediocrização. Será? Para mim, nada é mais medíocre do que começar o ano pensando na meta de não cair.
Exemplo prático é o do time campeão brasileiro que, no ano seguinte, em razão de natural fadiga, entra em decadência. Deve ser punido? Não seria mais justo ter um respiro? Esse quadro já andou se dando por aí. Lembro dos tempos em que clubes podiam burilar apostas da base sabendo que viviam uma transição. Era legítimo. Íamos para o estádio olhar jogadores com paciência, vendo o potencial de cada um, vibrando com sinais de talento. Agora, isso é quase letal para quem vê na luta contra o rebaixamento uma urgência, quase um pânico.
Falemos em mérito e democracia para o acesso. É importante! Mas por que não um sistema como o argentino? Cai quem não atingir certa média de pontuação em três anos. Isso protege clubes enfronhados no nosso imaginário cultural. E é disso que trato: evoluamos, mas cuidando com as armadilhas da hipocrisia.
*ZH ESPORTES