A Organização Sionista do Rio Grande do Sul irá notificou a Federação Gaúcha de Futebol (FGF) e o Ministério Público Estadual (MP-RS), exigindo que o Palestino retire de seu uniforme, antes de entrar em campo nesta terça-feira contra o Inter, o mapa no qual aparece a antiga região da Palestina.
Para o grupo, ao ostentar o desenho, o time chileno estaria fazendo uma manifestação política de negação à existência do Estado de Israel. No mapa, aparece o território anterior à criação do país, em 1948.
— Estamos tentando evitar que se importe o ódio, os problemas do Oriente Médio para cá. Futebol é esporte, é confraternização, é amizade. A gente está tentando previamente evitar todo e qualquer problema. Em Porto Alegre, nos damos extremamente bem com praticamente toda a comunidade palestina — afirma o presidente da entidade, Ghedale Saitovich.
Outro membro da Organização Sionista, o advogado Deivi Trombka, explica que a ideia é evitar que o Beira-Rio se torne palco de manifestações antissemitas.
— É ofensivo. Essa atitude risca Israel do mapa — disse.
No documento entregue à FGF e ao MP-RS, a entidade afirma que "o uniforme do Club Deportivo Palestino faz manifesta provocação política tendente à usurpação do território de um Estado Soberano que mantém relações diplomáticas com o Brasil, o reconhecido Estado de Israel". E acrescenta que o mapa "dá vazão à infeliz retórica de 'jogar os judeus no mar', reconhecida por correntes totalmente filiadas ao nazismo".
Na página da organização no Facebook, o grupo destaca "as graves violações à lei brasileira que ocorrerão na próxima terça-feira em Porto Alegre, caso seja permitido ao Club Deportivo Palestino entrar em campo com um mapa fraudulento estampado no uniforme, com evidente e notória conotação de provocação política e afronta ao Estado de Israel". Junto, aparece uma foto na qual o presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas, segura a camisa 11 da equipe chilena. O número 1 simula o mesmo mapa questionado pelos judeus e que, atualmente, estampa a manga esquerda do uniforme e as meias dos jogadores.
O desenho ignora a partilha da Palestina aprovada em sessão das Nações Unidas em 1947. Pela decisão, a região foi dividida em dois Estados — um israelense e outro palestino. Israel foi fundada em 1948. Os palestinos até hoje não construíram seu Estado. Grupos extremistas como o Hamas não reconhecem a existência de Israel e consideram o território israelense como "palestina ocupada".
Márcio Bressani responsável pela Promotoria de Justiça Especializada do Torcedor, órgão do MP-RS, informa que vai analisar a notificação, mas se diz surpreso com o pedido, uma vez que o ambiente que se desenha para a partida é de "pacificação":
— A dinâmica era inversa. Inclusive, estávamos articulando um espaço para torcida mista entre torcedores do Inter e do Palestino, a exemplo do que já temos no Gre-Nal.
O presidente da FGF, Francisco Noveletto, explica que a entidade não tem ingerência sobre o jogo:
— Repassamos para a Conmebol, que é quem organiza o torneio.
O presidente do Inter, Marcelo Medeiros, afirma que, até agora, não recebeu nenhuma notificação. Ele destaca que o clube é apartidário. Alessandro Barcelos, vice-diretor de Administração do Beira-Rio, também informou não ter recebido manifestações desse tipo.
Em carta aberta publicada no Facebook e dirigida a Medeiros, o conselheiro do Inter Fábio Lavinsky pede que sejam tomados cuidados necessários para que a torcida do Palestino não faça manifestações políticas ofensivas aos judeus colorados durante o jogo: "O próprio uniforme do time deles é ofensivo e extremista. Nega a solução de dois Estados", diz trecho do texto.
— Assim como conselheiros de outras minorias e pautas de responsabilidade social se manifestam, o fiz em nome de evitar que se ofenda a comunidade judaica dentro do Beira-Rio. A mensagem é de paz. O que a gente tem de importar para o Brasil é a resolução do conflito. E não importar o conflito — afirmou.
Em 2014, a Federação Chilena de Futebol multou o Palestino pelo uso do uniforme com os números em formato do mapa na parte de trás da camisa. A punição, em US$ 1,3 mil, ocorreu depois que organizações judaicas reclamaram da postura do time.
O presidente da Federação Israelita do Rio Grande do Sul, Sebastian Watenberg, explica que os posicionamentos de Lavinsky e da Organização Sionista do Rio Grande do Sul não representam o sentimento de toda a comunidade judaica do Estado.
— Temos muito respeito e cuidamos muito de nossa imagem e da relação harmoniosa que a gente tem com a comunidade palestina local e com a qual temos um diálogo bastante avançado e pacífico. Queria frisar esse ponto: a Organização Sionista atua como representante da direita israelense, mais precisamente o Likud (partido do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu), e não tem legitimidade para falar em nome da comunidade judaica. Temos severas divergências com eles — afirmou.
O jogo no Beira-Rio pela Libertadores ocorre no mesmo dia das eleições em Israel, nas quais Netanyahu tenta a reeleição como primeiro-ministro. GaúchaZH procurou a Conmebol e, até o início da tarde desta segunda-feira, não obteve resposta.
Em entrevista ao colunista Leonardo Oliveira, o presidente da comissão de Futebol do Palestino, Henry Abuawad, afirmou:
— Nós usamos o mapa faz muito tempo, 20, 30 anos. Não vou me referir a nada político porque não me corresponde, sou o diretor esportivo, não me agrada falar de política. Vamos tratar dela em outro lugar. O que dizem não nos interessa. Estamos autorizados a ocupar nosso uniforme com nossos logos e insígnias pela Associação Nacional de Futebol Profissional do Chile, é ela que nos regula.
A Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal), por meio de nota, afirmou que o jogo será um momento de confraternização, porque a maior parte da comunidade palestino-brasileira que ocupará os lugares destinados à torcida do clube chileno é também torcedora do Inter. Sobre o mapa, a entidade ressaltou que ele foi adotado pelo Palestino nos anos 1930, quando de sua fundação, antes da resolução de partilha adotada pelas Nações Unidas: "A comunidade palestino-brasileira dispensa todas as manifestações de extremismo e ódio", destacou ainda a nota.