Um longo período sem títulos relevantes. Pressão tremenda por ter perdido o Gauchão em casa com dois empates. Vice-campeão brasileiro no ano anterior. O Nacional-URU e um time venezuelano no caminho. Um técnico identificado e em busca de consagração na casamata. Um time cheio de dúvidas, com desconfiança de uma torcida impaciente e carente de conquistas. Rentería. Fernandão. Isso é 2006 ou 2023?
Para os torcedores que acreditam em coincidências, tanto faz, desde que o cenário do ano glorioso lá por abril se repita na íntegra em dezembro. Começa às 21h desta terça-feira, dia do aniversário colorado, no Estádio Athanasio Girardot, a caminhada do Inter em busca do tri da Libertadores, diante do Independiente de Medellín.
Em 2006, começava o 14º ano desde a última conquista relevante. Havia uma frustração enorme pelo vice do Brasileirão anterior, que se transformou em desconfiança e até descrença quando ficou em segundo lugar no Gauchão, perdendo o título para o Grêmio. Abel Braga, então comandante, aumentava sua fama de "pé-frio". A coincidência é que Mano Menezes era o técnico tricolor. E agora é sua vez de tentar mudar o cenário atual vestindo vermelho.
Em 2023, está em curso do 12º ano desde a conquista da Recopa Sul-Americana. Para piorar, corre o sétimo Gauchão seguido sem título. A queda para o Caxias, após dois empates, aumentou a pressão no grupo (mesmo que praticamente ninguém faça parte do período de seca). O Beira-Rio pulsa. De nervosismo.
Em 2006, havia poucas unanimidades no time. Élder Granja ou Ceará? Jorge Wagner no meio ou na lateral? Michel titular e Iarley reserva? Onde encaixar Mossoró? Em 2023, as dúvidas são as mesmas desde o início do ano: Baralhas ou Johnny? Wanderson ou Pedro Henrique? Por que não os dois? E há até uma coincidência de nomes: nos dois anos, o início da temporada tinha Luiz Adriano como opção ofensiva.
Em 2006, o primeiro jogo foi fora de casa. Em um ambiente difícil, ficou no empate em 1 a 1. Agora a igualdade não seria ruim, mas a Libertadores atual dá US$ 300 mil para cada vitória na fase inicial. Na dificuldade financeira, qualquer dólar é fôlego.
Em 2006, era urgente esquecer a derrota do Gauchão e voltar as atenções para a Libertadores. Tentar canalizar a frustração em busca do sonho. Em 2023, o discurso é idêntico. Disse o zagueiro Mercado, um dos líderes da equipe:
— Sabemos da importância deste jogo contra o Independiente. Temos um sonho grande e sabemos a importância de começar vencendo. A expectativa se renova porque é uma competição nova. Eu voltei para a América do Sul para poder vivenciar isso e me gera muito expectativa.
Em 2006, o Nacional-URU estava no caminho. E também um venezuelano: na época o Maracaibo. Agora, está o compatriota Metropolitanos-VEN. E novamente o Nacional. Isso traz uma memória quase indissolúvel.
Em 2006, havia Rentería. O colombiano marcou um dos gols mais bonitos da história do Inter no Estádio Parque Central, contra o mesmo Nacional, dando um balãozinho no zagueiro e chutando por cobertura do goleiro. A seu lado, o capitão do time comemorou.
Em 2006, havia Fernandão. Era ele que ria enquanto o carismático camisa 19 fazia a dança ruque-raque (que culminaria em expulsão). Era ele que tranquilizava a equipe nas horas difíceis e que fazia os gols nos momentos decisivos, como a virada sobre o Chivas, a semifinal contra o Libertad e a decisão com o São Paulo.
Em 2023, Rentería foi à concentração colorada em Medellín. Não perdeu 1% do carisma que o consagrou há quase 20 anos. Inclusive, posou para foto vestido de saci, com touca e cachimbo. E, em 2023, há um Fernandão tatuado no braço de Enzo da Costa, o filho do eterno capitão.
Em um período tão difícil, qualquer coincidência pode ser um bom sinal. Como começar o campeonato no dia do aniversário.