Luiz Antônio Venker Menezes, o Mano, iniciará neste sábado (21), às 19h, o seu oitavo Gauchão da carreira. Será o primeiro no comando do Inter, que busca acabar com o jejum que já dura seis edições da competição.
Mano Menezes foi campeão nos dois últimos Campeonato Gaúchos que disputou, em 2006 e 2007, pelo Grêmio. Ele tentará agora se tornar o sétimo treinador a conquistar o Estadual pelos dois gigantes gaúchos. Antes da estreia, o técnico colorado conversou com o Grupo RBS.
Em um bate-papo de cerca de 40 minutos, Mano Menezes projetou não apenas o Gauchão que se inicia neste sábado, mas a temporada que neste ano terá para o Inter a volta da Libertadores ao calendário. Também falou sobre a busca por reforços, a preparação do time, as expectativas criadas após o vice-campeonato brasileiro e deixou claro que, aos 60 anos, mantém viva a motivação de iniciante para buscar mais uma taça. Confira.
Expectativa para a temporada após o bom final de 2022
"A expectativa do treinador é proporcional a do torcedor. É justo externamente também ter essa expectativa sobre o time. O futebol sempre tem as suas etapas. Quando começa a construir um ciclo, e ele é virtuoso, passa a ser mais longo. Eu não acredito muito em resultado e conquista se não tivermos alguma coisa que sustente isso. Você pode ganhar um torneio, mas ele passa a ser muito isolado. Penso que um clube do porte do Inter precisa ter algo mais sustentável porque aí você passa a ter um investimento maior, o resultado vai sustentando essa evolução. Fizemos isso bem na primeira parte, e isso leva o torcedor a sonhar. Nós sonhamos juntos, a diferença é que eles sonham lá fora e nós aqui dentro buscamos dar o passo para sustentar esse sonho, mas com os pés no chão sabendo da dificuldade para realizá-lo."
O peso do Gauchão na relação com a torcida
"Antes de pensar em título é preciso olhar para a primeira etapa do Gauchão. Não adianta você olhar para o maior rival sem fazer a primeira parte, que é da classificação. Junto com ela deve se fazer a afirmação de que o time irá repetir o rendimento que fazia e a partir disso evoluir. Já vimos equipes terminarem bem, mesmo com manutenção de treinador e jogador, e não repetir isso. Sabemos e já vimos outros passarem por isso, então trabalhamos para não acontecer conosco. Vamos ver a demonstração se fizemos bem nos primeiros jogos do Gauchão. Iniciar bem é importante para sintonizar com o torcedor aquilo que ele viu no passado e que espera ver."
A vantagem de ter mantido o time
"Um pecado que não podemos cometer é achar que temos muitas vantagens em cima dos nossos adversários, sentar em cima disso e achar que nada deve ser feito. O futebol te exige evoluir todos os dias. Se acomodar é sempre o primeiro perigo para as coisas não saírem bem. É aí que se tem valor a experiência adquirida nesse tempo. Mas o Inter tem muita gente experiente, não apenas o técnico. As coisas estão andando bem no departamento de futebol. Tudo foi construído para isso."
Um pecado que não podemos cometer é achar que temos muitas vantagens em cima dos nossos adversários, sentar em cima disso e achar que nada deve ser feito. O futebol te exige evoluir todos os dias.
MANO MENEZES
Preocupação com a demora para contratar
"Se contratou pouco nesse primeiro momento porque acreditamos que o que fizemos foi bem feito. Nós não precisamos sair desesperadamente contratando em quantidade. Podemos diminuir a quantidade e direcionar melhor esse valor que tínhamos que dividir por 15 (jogadores), agora por cinco. Então, temos que trabalhar com outra faixa de jogador para qualificar o elenco. Primeiro porque é necessário que ele tenha essa qualificação porque o time e o grupo melhoraram. A outra é que esses valores são maiores, esses atletas estão em outro universo. Precisamos direcionar essa busca, esperar que algumas coisas aconteçam, por exemplo, fechar a janela europeia em 31 de janeiro. A partir do momento que ela fecha, aumenta a chance de jogadores que não acertaram com um clube europeu ficarem à disposição da América Latina. O futebol brasileiro não oferece tantos jogadores porque eles já estão em clubes que não liberam, então precisamos buscar em outros mercados. Isso cria a ansiedade externa, mas dentro precisamos controlar isso."
O que se pode fazer diferente com o mesmo grupo
"Manter a maior parte do grupo nos faz iniciar a temporada em um nível mais alto. A medida que os jogadores se conhecem bem determinadas coisas da equipe são feitas automaticamente, essa é a maior vantagem de ter a manutenção de ideias com o treinador e de jogadores. Assim você parte de uma ideia de jogar que foi afirmada e executada no passado."
Legado da Copa do Mundo em termos táticos
"A Copa não apresentou novidades táticas. É bem difícil que isso aconteça no sistema que temos agora. Hoje temos acesso aos principais campeonatos europeus com os principais jogadores na nossa frente. A Copa é um fechamento disso. O que ela trouxe foi um apontamento para a realidade que tem muito a ver com o que a gente pensa aqui. Os times precisam competir muito, ser objetivos. Não tem espaço para ficar trabalhando a posse muito tempo porque a medida que faz isso o adversário se organiza taticamente e aí fica difícil encontrar o espaço para fazer o principal, que é o gol. Os times estão mais objetivos na construção das jogadas. Todos estão construindo melhor desde a bola que sai de trás no tiro de meta ou no goleiro. Então também é necessário que o time tenha doação na retomada da posse de bola. É preciso ter isso para ser vencedor em um futebol cada vez mais objetivo."
Os times precisam competir muito, ser objetivos. Não tem espaço para ficar trabalhando a posse muito tempo porque a medida que faz isso o adversário se organiza taticamente e aí fica difícil encontrar o espaço para fazer o principal, que é o gol
MANO MENEZES
Saídas de lideranças como Edenilson e Taison
"É preciso diferenciar as situações de jogadores, elencos e equipes para que não haja nenhuma confusão. A medida que se fica muito tempo em um lugar e não vence, não por culpa sua, mas mais de adversários em ciclos melhores, se cria isso de dizer que são atletas perdedores. Essa diferença precisamos tratar. Certamente vamos vê-los vencendo em outros lugares. Isso é feito porque você precisa fazer mudanças. Para trazer alguém precisa tirar alguém, isso é algo que deixo claro na relação com os jogadores, e eles mesmo entendem que devem seguir as carreiras em outros lugares. Pensamos em encontrar soluções para trazer resultados diferentes. As lideranças vão surgindo naturalmente, temos vários líderes, quase sempre um usa a braçadeira, mas temos a necessidade de termos mais líderes. Estou satisfeito com as atitudes que tiveram no ano passado. O time mostrou na reta final do Brasileirão um comportamento forte."
Distribuição dos gols e meta de atingir 100 gols no ano
"Quanto mais for distribuído os gols, mais segurança eu tenho. Na medida que você centraliza muito, fica preocupado com perder esse jogador. Cem não é um número assombroso, o Inter fez 88 gols temporada passada. Quando se usa uma referência de 100, tem equipes que marcam 100 e não conquistam o título. Mas é um número que te aproxima de estar entre os primeiros. Se olhar em volta para as equipes que estão nos primeiros lugares, elas estão muito próximas disso."
Evolução desde a Sul-Americana para estar pronto para ser campeão
"Imaginamos que sim (Inter está pronto). Quando falei a frase, não estava me referindo apenas a questão técnica de dentro do campo. Falei me referindo a uma questão geral. Passou batido naquele dia um erro grave de arbitragem. A expulsão do Gabriel não é para vermelho em nenhum lugar, mas um árbitro renomado (Roberto Tobar), que apitou final de Copa América e Libertadores, entendeu que deveria expulsar. Falo de um lance desses para dizer que estar preparado para ser campeão de Libertadores e Sul-Americana exige participar dela, saber lidar com todos os fatores importantes para que isso não aconteça na sua casa. A parte mais importante é dentro de campo, mas todos nós estamos nos preparando melhor para que dentro do campo seja resolvido corretamente tudo aquilo que a gente imagina ter a capacidade para conquistar."
Se um dia for dirigente, sentarei com os dois mandatários dos grandes clubes (Inter e Grêmio) e iria comprar um avião
MANO MENEZES
Dificuldades das viagens
"A primeira vez que fui organizar uma viagem em São Paulo estanhei que demorava só uma hora e meia porque as nossas no Rio Grande do Sul sempre demoravam seis. Se um dia for dirigente, sentarei com os dois mandatários dos grandes clubes (Inter e Grêmio) e iria comprar um avião. Desde que San Siro, em Milão, é usado por dois clubes, a gente descobriu que isso é possível. Com a evolução da gente poderia ter se chegado a isso, tal a importância do deslocamento. Entre as coisas que discutimos é dar condição para quem é contratado de render o máximo, e esse é um dos motivos. Temos parte do orçamento destinado para jogos onde se precisará usar voos privados.
Perfil do centroavante buscado pelo Inter
"Não acredito mais no centroavante enfiado no meio de dois zagueiros como uma peça que você tem de acertar a cabeça dele e achar a todo momento livre para fazer um gol. A maioria dos grandes centroavantes é de jogadores com capacidade de se movimentar, de contribuir com a construção da jogada, não ser só de finalização. Futebol ficou assim, os espaços são mais apertados e você precisa usar todos para desmanchar a estrutura defensiva do adversário para aí sim encontrar um passe no espaço apertado. O atacante que procuramos obedece a essas características."
Gerenciamento do elenco
"Ter um elenco melhor não quer dizer maior. Isso não é comparar com quem saiu, mas ter um elenco com todos os jogadores tendo capacidade para jogar. Mudar um time inteiro torna muito difícil ter uma boa equipe. O Brasil mudou o time inteiro na Copa e perdeu para Camarões, mesmo que os que entraram fossem bons jogadores. Isso acontece porque é um outro time inteiro. Quando se tem um elenco homogêneo vai fazendo as trocas durante os jogos, economizando 30 minutos de um jogador porque fica seguro de colocar outro atleta para os 30 minutos finais. Isso vai dando minutagem e controle do jogador para aquilo que pode ser feito para gerir um grupo. Mexer o time inteiro é a exceção da exceção."
Potencial do atual time sem reforços
"Temos uma equipe pronta para disputar a primeira fase da Libertadores e brigar pela classificação. Queremos ter uma equipe melhor porque sempre trabalhamos para isso. Temos uma equipe pronta para iniciar e quanto antes chegarem melhor. Sempre tem um período de adaptação. A vantagem de oferecer uma estrutura de equipe faz com que eles cheguem e venham para executar funções que estão acostumados."
Voltar a disputar o Gauchão
"Se contar o Guarani-VA, são três (ganhou o título de 2002 da parte do Gauchão disputada apenas por equipes do Interior). A gente precisa respeitar a competição como ela é. Um dia fomos jogar a Série B e os caras estavam emburrados. Eu falei: começamos errado, assim será pior. Caiu? Encara como é e joga como tem de jogar. O Gauchão tem suas peculiaridades, há momentos que os campos não são bons, mas o campeonato é assim. Quem quer ganhar tem que jogar como se deve jogar. É isso que pensamos e como vamos defender internamente. O Gauchão é um campeonato difícil na primeira fase, tem jogos difíceis de jogar na forma que você está acostumado, algo que tem na Copa do Brasil também. Não se desrespeita ninguém, se joga como se deve jogar e assim será aqui."
Ambições na carreira
"Penso que a obrigação de qualquer profissional é desempenhar a função dele enquanto tem ambições. Caso contrário deve deixar o lugar para outro profissional. Quando fui contratado para o Inter, a expectativa era essa. Eu não posso não estar capaz ou empenhado ao máximo para atender isso. O dia que perder isso irei comer pipoca domingo de tarde e assistir televisão, o que é muito mais tranquilo. Ainda me sinto capaz e estou muito contente com o que vem acontecendo aqui. Ao longo da minha carreira, construí equipes, o que acho ser uma das coisas mais gratificantes para um treinador. Quero continuar fazendo isso para que o Inter volte a conquistar títulos porque o treinador também vive disso, e é a coisa mais importante no final. Vão buscar a conta lá no finalzinho e falar: montou bom time, mas também foi campeão”.
*Colaborou Bruno Flores