Rodrigo Dourado estava no trabalho de aquecimento, dentro de campo, quando seu nome foi anunciado nos alto-falantes do Beira-Rio: "Rodriiiiiigo Douraaaaaado". A seguir, vaias tão ferozes que fizeram a locutora apressar o próximo nome: "Edeniiiiilsoooon".
Por mais que jogadores absorvam e tentem ignorar os barulhos das arquibancadas, era impossível não ouvir a insatisfação da torcida com a escalação do volante, que serve ao Inter desde quando tinha 13 anos e trocou o futsal em Pelotas pela concentração da base ainda em Porto Alegre. Quem diria que a noite que começou desse jeito terminaria em aplausos de pé de um Beira-Rio inteiro.
Ao lado de Cuesta, Boschilia e Patrick, ele estava no famigerado "áudio do Paixão", quando o ex-coordenador de preparação física Paulo Paixão comentou, a um amigo, sobre peças que o Inter deveria se desfazer para a temporada atual. A mensagem vazou, bem como Patrick e Cuesta. Boschilia está se recuperando de uma nova cirurgia no joelho, e Dourado foi para o banco.
Involuntariamente, virou (com outros jogadores) símbolo de uma geração que não conseguiu ainda ser campeã — mesmo que ele tenha sido, dos Campeonatos Gaúchos de 2014, 2015 e 2016. O rebaixamento colou em sua imagem. Os vices da Copa do Brasil e do Brasileirão, também.
Todos os jogadores citados, em algum momento, apresentaram suas versões. Menos o volante. Mesmo quando amigos sugeriram que ele se manifestasse, que convocasse alguma entrevista coletiva para "se defender", preferiu a discrição. Segundo um desses amigos, a frase foi: "Vou trabalhar em silêncio, a resposta tem de ser no campo".
— O dia chegou. Terça-feira foi o prêmio — completou.
Dourado, de fato, foi honesto na entrevista. Primeiro, olhou para si. Fechou-se com seus familiares e com os colegas de time. Abandonou Instagram, Twitter e demais formas de contato externo. E intensificou a preparação. Ficou à disposição em 25 dos 26 jogos do Inter na temporada (não foi relacionado apenas em uma partida, diante do São Luiz, na qual ainda sob comando de Medina, um grupo de reservas viajou a Ijuí).
— Minha família me ajudou muito, meus amigos e, principalmente, o grupo. Fiquei em silêncio e trabalhei. Larguei as redes sociais e tudo que poderia me afetar. Estou feliz pelo meu momento e o momento do time — comentou o jogador.
Com Mano Menezes, recuperou o posto de titular. A explicação do treinador foi além de lhe dar nova chance, renovar as esperanças. Teve um quesito técnico. Na comparação com seus concorrentes diretos pela vaga, Dourado é mais alto, tem um jogo aéreo bastante superior (o goleiro do 9 de Octubre que o diga). Gabriel pode ser mais combativo e até mais rápido, Johnny é mais técnico, um meia que virou volante. Mas Dourado é quem ganha a bola disputada por cima. E aparece na área para fazer gols importantes.
Esteve perto de deixar o Inter. No início do ano, recebeu uma proposta dos Emirados Árabes, mas o clube rejeitou a investida. Menos mal para Mano Menezes, que chegou a dizer que se estivesse em qualquer time do Brasil e tivesse a possibilidade de contratar Dourado, faria sem titubear.
E também menos mal para a família. Que, inclusive, vai aumentar. O volante e a mulher, Luciana, que já são pais de Bernardo (de três anos), esperam para os próximos meses uma menina. O nome? Bárbara. Como a noite de 24 de maio para Rodrigo.