Teria de passar em um cinema os 21 minutos intensos que viveu o centroavante Alemão no intervalo de uma semana. Primeiro, fez um gol, no último lance, no estádio lotado, que garantiu uma vitória fundamental. Depois, balançou as redes do Maracanã justamente em sua estreia no maior palco brasileiro. Deve ser confirmado como titular para mais um jogo decisivo do Inter, nesta terça-feira (26), às 21h30min, contra o Independiente Medellín, pela Copa Sul-Americana. Para completar o conto de fadas, tudo isso está passando em seu time do coração. Pensando bem, se fosse filme, a vida de Alexandre Zurawski pecaria por falta de verossimilhança.
Teve muito, muito trabalho e muito, muito sacrifício para que Alemão vestisse a camisa 35 do Inter. A começar pela geografia. Mais novo de três irmãos, o autor dos gols que deram as duas vitórias no Brasileirão nasceu e viveu seus primeiros anos no campo. É filho de trabalhadores rurais, que precisaram abandonar a terra em Anchieta, no interior catarinense, em busca de oportunidades na cidade. Foram para Gaspar, também no estado vizinho. Nenhum dos dois locais é, propriamente, um centro do futebol. Alemão, portanto, precisaria romper a barreira da distância.
— O início foi difícil. Porque ele vivia para cima e para baixo com uma bola, correndo. Então viemos para cá, tivemos de colocar o Alemão em uma creche. Nos primeiros dias, chorava, eu ficava com o coração partido. Mas precisava trabalhar, né? Sou diarista. Ainda bem que em seguida ele se adaptou, participou daqueles teatrinhos e tudo. E seguiu jogando bola. Meus patrões pediam que ele jogasse nos times dos filhos, porque ele era bom — contra Edvirge Zurawski, mãe do jogador.
De fato, para os padrões locais, ele era bem acima da média. Portanto, era até um desperdício, na visão dos parentes, que Alemão não jogasse. Ainda mais depois de tudo o que fez. Na infância, jogava na escolinha do Tupi, em Gaspar. Tentou a sorte em uma autorizada do Red Bull. Mas os gastos da família para abastecer o Fusca e levá-lo aos treinos causavam um incômodo no futuro atleta. Para que colocar dinheiro em algo que não avança? Decidiu, então, abandonar o futebol. Foi quando a prima Claudia Carpeggiani (sem qualquer relação com o ídolo colorado) reapareceu em sua vida. Ao vê-lo jogar na várzea, pediu a Edvirge e Sergio (o pai) que lhe autorizassem a cuidar da carreira.
Com o sim, ela e o marido, Neimar Bussolaro, conduziriam o enteado, Guilherme, para fazer teste em uma escolinha conveniada do Grêmio. Resolveram levar junto Alemão, que estava jogando na várzea. Os dois foram aprovados e deveriam se apresentar em Porto Alegre alguns meses depois. O teste foi antecipado e, sem conseguirem se preparar, acabaram reprovados na Capital.
Mas a essa altura ele não desistiria. Jogou a Copa Maravilha, um tradicional torneio de base catarinense, e chamou a atenção da Chapecoense. A concorrência, porém, de meninos mais rodados pesou na hora da sequência. Claudia ouviu a sugestão de levá-lo para times menores. Passou a garimpar vagas pelo estado. No Metropolitano, até de volante jogou em busca de oportunidade. Quando foi escalado como atacante, encantou o técnico.
Para isso, porém, pegava três conduções para ir e mais três para voltar de Blumenau todas as manhãs. À tarde, pedalava uma dezena de quilômetros para ir ao campo treinar sozinho. Voltava de bicicleta no início da noite para ir à aula. Depois disso, teve poucas oportunidades no Criciúma, viveu uma aventura na segunda divisão japonesa (onde garante ter aprendido bastante e despertou atenção por chegar falando inglês) e andou no Fluminense de Joinville, que jogava a Série B catarinense. A estrutura era mínima, com campo ruim e quartos coletivos para meia dúzia de jogadores.
— E ele nunca disse um "ai". Não reclamou de nada — orgulha-se Claudia, a prima que virou agente e fez disso sua profissão.
Assim, o problema de deslocamento que teve o Inter para chegar em Pereira é quase nada. Ele e os familiares riem de orelha a orelha desde a ligação de Paulo Bracks falando do interesse do ex-técnico Alexander Medina até a assinatura do contrato, sob supervisão de Deive Bandeira, gerente de mercado.
— Eu sou gremista, né? Queria que ele estivesse no meu time. Mas ele é colorado, os pais também. Ficaram tão felizes quando souberam do interesse que nunca nem me perguntaram sobre salário — completa Claudia.
Alemão assinou contrato até dezembro de 2023. Ele chegou do Avaí sem custos. A ideia era envolver jogadores por empréstimo, mas até agora não houve acerto dos catarinenses com atletas colorados. Enquanto isso, o camisa 35 segue vivendo o clímax de seu filme. A missão, agora, é na Colômbia.