
Na década de 1960, a maioria das minhas manhãs de domingo eram passadas sempre no mesmo lugar. Às margens do Guaíba, nas obras do "Gigante da Beira-Rio". Meu pai nos levava, a mim e a meus irmãos até o lugar onde estava sendo construído o novo estádio do Inter. Lembro-me de ter acompanhado a construção desde quando havia apenas um monte de areia formando um grande círculo. Me impressionava a quantidade de colorados que também iam acompanhar a construção. Não sei se em algum outro lugar aconteceu algo parecido, mas é de emocionar lembrar o que era aquela área e que ali surgiu um estádio de futebol cuja construção se deveu a paixão de uma torcida pelo seu time!
Aos poucos, domingo a domingo, o estádio foi tomando forma. Desde o primeiro lance de arquibancadas, aquele que ficava para o lado da Avenida Padre Cacique e que tinha a marquise, "a aba do boné".
Enfim chegou o grande dia, 6 de abril de 1969, a inauguração. Começou com a alvorada colorada. Um foguetório para acordar a cidade. Chega a hora de ir ao estádio. Meu lugar: aqueles bancos de madeira que ficavam embaixo das cabines de rádio destinados aos sócios paraninfos. Durante a campanha de arrecadação de fundos para a construção do estádio foram colocados à venda esses títulos. Meu pai adquiriu um para cada filho. Lá em casa tínhamos opção: ou seríamos colorados ou SERÍAMOS COLORADOS!
Cheguei cedo. Não lembro muito bem de tudo o que aconteceu, mas uma coisa ficou marcada na minha memória. Em certo momento uma faixa começou a ser desenrolada e iam aparecendo os números 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7..., bem assim, nessa sequência. Indignação! Afinal era abril de 1969, e o Grêmio era o heptacampeão gaúcho. Não acreditávamos que eles pudessem estar nos jogando na cara isso e que ninguém estava impedindo! Mas os números continuaram "... 8, 9, 10." E a faixa terminava: "Sete em cada dez gaúchos são colorados!" Ufa! Não era o que parecia! Incrível como esse episódio ficou marcado na minha memória.
Do jogo, a memória é menor. Claro que me lembro do primeiro gol, de Claudiomiro, do empate do Benfica e do desempate do Gilson Porto. Fui a todos os jogos daquele festival de jogos da inauguração. Mas o que mais me interessava era o Gre-Nal. O que eu mais ouvia era que o Grêmio iria tentar se vingar do clássico da inauguração do Olímpico, o qual perderam por 6 a 2, o goleiro deles até chorou! À medida que o tempo passava aumentava a tensão. Só podia dar no que deu. Perto do fim do jogo um lance mais duro gerou uma briga generalizada. Até hoje poucos foram os jogos no Beira-Rio que eu deixei de assistir. Acho que por ter visto surgir o estádio praticamente do nada me senti quase na obrigação de estar presente. Afina de contas, se é Inter, é paixão!