Vem da Argentina a inspiração para o Inter retomar o caminho dos grandes títulos em 2020. Com a escolha de Eduardo Coudet para o comando da equipe na próxima temporada, a direção colorada busca uma mudança de filosofia. Dois anos após a volta à Série A, a ideia é abandonar o chamado "futebol reativo" e implementar no Beira-Rio um estilo ofensivo, veloz e vertical. Uma das referências para essa reformulação também está no país vizinho: o multicampeão River Plate. Caberá ao novo treinador colorado liderar um processo semelhante ao conduzido por Marcelo Gallardo no clube de Monumental de Nuñez.
— O River passou pelo mesmo momento que o Inter (rebaixamento) e demorou para ganhar títulos. Futebol é planejamento. Temos que ter consciência de que não se conquista campeonatos de um dia para o outro. A gente tem que se reestruturar, planejar e saber o que se fez de errado para não repetir. O Inter está no caminho. Depois daquele episódio na nossa história (queda para a Série B), já jogamos finais e fizemos boas campanhas no Brasileirão e na Libertadores. É só ter paciência. Em algum momento, (o sucesso) vai cair do nosso lado, e o Inter vai estar novamente no primeiro plano do futebol nacional e internacional — confia o meia D’Alessandro, ídolo do Inter e também do River Plate.
Rebaixado em 2011, o clube argentino abandonou o inferno da Segunda Divisão no dia 23 de junho de 2012. A primeira conquista ocorreu apenas dois anos e meio depois, quando o time portenho levantou o caneco da Copa Sul-Americana, no dia 10 de dezembro de 2014. Dois anos após voltar à Série A, em 2017 o Inter tenta repetir algumas êxitos do time de Buenos Aires. Um deles é o estilo do treinador. Ex-jogadores do River Plate e técnicos seguidores da mesma escola, Marcelo Gallardo e Eduardo Coudet possuem semelhanças importantes na maneira de trabalhar.
— Os dois são técnicos discípulos de Marcelo Bielsa, que gostam de propor o jogo e adotar uma forma de jogar ofensiva e intensa. Os times de ambos fazem uma pressão muito alta nas defesas adversárias — avalia o repórter Lucas Morales, setorista do Racing da Rádio AM 1050, da Argentina.
O esquema tático preferencial de Gallardo e Coudet também é o mesmo: o 4-1-3-2. A ideia é ter um primeiro volante com boa qualidade no passe e no lançamento, um trio de meias que possibilite a velocidade no avanço pelos lados do campo e uma dupla de ataque com bom poder de finalização. Além disso, os dois são considerados "workaholics", pelo tempo que se dedicam ao trabalho fora do horário dos treinos, seja analisando os números dos analistas de desempenho, seja assistindo a vídeos das suas equipes e dos adversários.
No entanto, os dois treinadores não são idênticos. A imprensa argentina aponta algumas diferenças significativas nos métodos de trabalho de cada um dos profissionais, características que devem ser percebidas a partir do próximo ano, quando Coudet estiver no comando colorado.
— O Gallardo costuma mudar a forma de jogar da equipe de acordo com os adversários e com os momentos distintos da partida. Já o Coudet gosta de fixar um sistema e uma maneira de jogar — pondera Morales.
As diferenças são notadas também no temperamento dos técnicos à beira do gramado.
— O Gallardo é mais tranquilo no campo. Já o Coudet gesticula demais, e às vezes parece nervoso durante o jogo — opina o jornalista Gustavo Yarroch, da rádio argentina La Red.
Mas, independentemente das semelhanças e das diferenças no estilo, é consenso entre os analistas argentinos que o tempo de trabalho e a tranquilidade para implementar as suas ideias sem o risco de cair após o primeiro revés foram decisivos para o sucesso de Gallardo no River Plate.
— Quando assumiu o cargo, em 2014, o presidente do River, Rodolfo D’Onofrio enxergou no Gallardo um projeto, uma ideia e uma filosofia. E deu toda a tranquilidade do mundo para ele trabalhar. Até hoje, por exemplo, o Gallardo não ganhou um Campeonato Argentino e isso nunca foi um impedimento para ele seguir o seu trabalho. O treinador foi também muito questionado em 2017, quando foi eliminado da Libertadores pelo Lanús, na semifinal. Mesmo assim, o presidente afirmou que de maneira alguma o demitiria — relembra o jornalista Luciano Silveira, jornalista da plataforma DAZN e especialista em futebol argentino.
A imprensa portenha também acredita que, para um clube repetir o sucesso do River de Gallardo, precisa apostar na ideia do técnico e não abandonar o projeto logo após eventuais resultados negativos.
— Dois anos depois de voltar à Primeira Divisão, o River confiou no projeto do Gallardo com muita convicção. Me parece que a chave do sucesso passa por confiar no trabalho do técnico e não ficar mudando de comandante toda hora, pois isso não te permite armar equipes confiáveis — complementa Yarroch.
A partir de 2020, Coudet terá a missão de trilhar no Inter pelo menos parte da trajetória de sucesso que Gallardo teve no River Plate. E o desafio de lidar com a impaciência da torcida com a falta de títulos nos últimos anos.